quarta-feira, 17 de março de 2010

Velhas elites

A extraordinária tentativa de amordaçar os críticos do PSD, parcial e temporalmente, deu origem a uma vaga de protestos.

Ainda que sem cuidar de explicar o que se passa nos outros partidos políticos, a jactância palavrosa permitiu aliviar o cheiro a podre que invadiu a actualidade.

Curiosamente, aqueles que mais se indignaram com a alteração estatutária aprovada no congresso de Mafra foram precisamente os que mais desvalorizaram o assalto do governo socialista aos mais elementares direitos de expressão, opinião e imprensa.

Eis uma boa oportunidade para verificar o estado a que chegou o 'critério' da defesa de valores fundamentais: quando dá jeito, carrega-se a eito; quando não dá, vira-se a cara para o lado.

A constatação é triste, mas é de facto.

E permite chegar a outra conclusão: as velhas elites estão cada vez mais velhas e amarradas às benesses concedidas, directa ou indirectamente, pelo poder.

Mas será que todas as elites estão compradas?

Claro que não.

O silêncio envergonhado de alguns tem outras explicações mais prosaicas e medíocres: conquistado o pico do status social, quiçá a qualquer preço, o pavor de o perder a qualquer momento leva a uma desonestidade intelectual e política gritantes.

Passados mais de cinco anos de José Sócrates na liderança do governo, o lema passou a ser: A única ideologia é a dos tachos e dos dólares depositados em offshores.

Não foi o último discurso de Manuela Ferreira Leite no congresso do PSD que permitiu constatar que basta seguir o dinheiro para perceber o actual estado do país e das suas velhas elites cada vez mais velhas.

As ameaças, as mentiras, os truques, os discursos pomposos, a imagem e mais uns trocados, em espécie ou em género, têm sido suficientes para calar quem tem a obrigação de estar na primeira fila da contestação ao embuste, que transformou esta democracia num pântano cheio de gente cada vez mais pobre.

segunda-feira, 8 de março de 2010

Humilhação e piedade

A apresentação do Programa de Estabilidade e Crescimento é uma oportunidade de ouro para obrigar José Sócrates a assumir as suas promessas eleitorais.

Além do magnífico trabalho dos deputados da Comissão de Ética – a propósito da tentativa de assalto à comunicação social –, da oportuna constituição de uma comissão de Inquérito – que vai investigar se o primeiro-ministro mentiu ao Parlamento – e do congresso do PSD, que, felizmente, conta com vários candidatos, é consensual que José Sócrates não pode retomar a governação com um novo truque: o recurso ao aumento da carga fiscal, sem o aumento dos impostos.

A questão do momento é outra: José Sócrates, a nível interno e externo, é o primeiro-ministro certo para tirar o país do buraco que ele próprio ajudou a cavar, com ou sem comunicação ao país, depois de cinco anos de mentiras, truques e ilusões políticas?

Obviamente, não.

Os sinais de desgaste são tão evidentes como as manobras desesperadas da corte do costume, que tenta desvalorizar a actual situação e arranjar uma espécie de tábua de salvação, chame-se o expediente Manuela Moura Guedes, Freeport ou outra coisa qualquer.

A realidade está à vista: No momento em que o país precisa de um líder credível e empenhado, o governo continua a ser liderado por um homem acossado e desacreditado.

Aliás, a tentativa obstinada de manter o poder até já chegou ao ponto de encenar a vitimização suprema.

Não foi por acaso que José Sócrates chegou ao cúmulo de pedir aos jornalistas – anteriormente eleitos 'alvos' – para «terem piedade», para não colocarem mais questões sobre o seu envolvimento no caso "Face Oculta".

Certamente, todos os portugueses, de esquerda e de direita, estão de acordo com as palavras de Manuel Alegre ao DN, em 23 de Outubro de 2002: «Eu também sinto em mim a humilhação a que outras pessoas se sujeitam».