sábado, 1 de dezembro de 2012

Portugal: o país sem cultura democrática




Os portugueses já estão habituados à determinação de Pedro Passos Coelho. O que não lhe perdoam é a sua falta de legitimidade eleitoral para prosseguir o rumo traçado.

O líder do XIX governo constitucional continua a desvalorizar o seu pecado original: as falsas promessas eleitorais.

Na última entrevista à TVI, a José Alberto Carvalho e a Judite de Sousa, Pedro Passos Coelho não deu um único sinal de arrependimento.

Decorrido um período de governação de um pouco mais de 17 meses, o primeiro-ministro carrega este peso com crescente desfaçatez política, qual Sísifo que, não obstante ser o mais astuto dos mortais, acabou condenado para sempre a empurrar uma pedra até ao lugar mais alto da montanha.

Começa a ser fatigante assistir ao espectáculo de um primeiro-ministro a tentar camuflar que recorreu aos velhos truques ― quiçá, os mesmos que, noutros tempos, o afastaram da política activa ― através de uma atitude politicamente arrogante, como se fosse possível apostar no tempo para tudo fazer esquecer, como se até o enxovalho público fosse passível de ser ignorado.

Pedro Passos Coelho não é mais nem menos do que o produto do sistema, mesmo que, numa determinada fase, tenha chegado a vestir o uniforme do enfant terrible da política portuguesa.

Mais de 37 anos depois do 25 de Abril, Portugal continua a ser um país atulhado de políticos imbuídos de uma clarividência tal que chegam a considerar normal enganar os portugueses durante uma campanha eleitoral para depois fazerem o que lhes apetece.

As sucessivas gerações de políticos iluminados já se habituaram de tal forma a prescindir de consultar o Povo, sobre questões da maior relevância para o futuro colectivo, que já nem são capazes da mais elementar autocrítica pessoal e partidária.

Os partidos do arco da governação, que afinam pelo mesmo diapasão há mais de 30 anos, sabem que os eleitores não têm alternativas credíveis, contando que tudo continue na mesma com mais ou menos voto nas setas, sejam para cima ou ao centro, e na rosa mais ou menos avermelhada.

Não há nada pior para a saúde da Democracia do que esta simples constatação. Nem a corte do costume, fortuitamente instalada a favor ou contra o poder vigente, consegue disfarçar o incómodo.

Enquanto os cidadãos não romperem com esta armadilha, qualquer líder político pode mentir impunemente, porque sabe que tem uma forte probabilidade de ficar no poder pelo menos quatro anos, contando com a conivência dos seus pares e a passividade colectiva.

Para o bem ou para o mal, o sistema político tem fabricado, acolhido e promovido este tipo de governantes. O que é incompreensível, para não lhe chamar um colossal embuste, é a crítica organizada por senadores que incorreram, sistematicamente, no mesmo erro, pretendendo agora passar por aquilo que nunca foram.

Pedro Passos Coelho pode afirmar a sua coragem. E até pode estar convicto de estar a seguir o caminho inevitável. Mas não pode ter o atrevimento de assumir uma atitude aristocrática, porque não tem estatuto, nem tão-pouco deu quaisquer provas de estadista.

A maioria no poder e o maior partido da oposição parlamentar deviam reflectir, profundamente, sobre os últimos anos de governação. Há limites que já foram largamente ultrapassados.

Não há boys, girls, spin, agências de comunicação a soldo de quem paga mais ou comunicação social mainstream capazes de disfarçar o equívoco que está na origem de todos os males.

Portugal continua a ser um país sem cultura democrática, incapaz de aprender com os erros do passado que nos atiraram para o abismo.

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