terça-feira, 10 de maio de 2011

Por portas travessas

O debate entre Paulo Portas e José Sócrates foi esclarecedor. Muito mais esclarecedor do que a evidência da responsabilidade de Sócrates no estado de bancarrota em que atolou o país.

O líder do CDS/PP estava preparado para a cassete de Sócrates, mas não estava devidamente preparado para prestação de Judite Sousa, designadamente para uma pergunta incisiva.

E qual foi a pergunta a que o líder do CDS/PP não respondeu, taxativamente, como é seu timbre, sobretudo quando não tem nada na manga?

Num cenário de vitória eleitoral do PS, com maioria simples, o líder do CDS/PP está disponível para governar com o líder do PS?

A resposta foi hábil: sem nunca dizer "Não", taxativamente, Portas deu a entender, com argumentos verdadeiros e factuais, que nunca fará governo com José Sócrates.

Mas, por incrível que possa parecer, ou não, nunca disse a palavra "Não".

Quem conhece Paulo Portas, sabe que se ele recusa dizer, taxativamente, que "Não" formará governo com José Sócrates, então é caso para tentar saber o que está a acontecer nos bastidores, quiçá, por portas travessas.

E das duas uma: Ou Portas esclarece qual vai ser a sua posição sobre uma eventual aliança com Sócrates, ou Sócrates esclarece o que eventualmente sabe (insinuou, mas não disse!), durante o debate, sobre os submarinos.

Tempo e campanha não faltam.

quarta-feira, 4 de maio de 2011

Carta aberta a Pedro Passos Coelho

Exmo. Senhor
Pedro Passos Coelho,
Face à tragédia em que o país vive, e no âmbito da candidatura que protagoniza a primeiro-ministro de Portugal, eis algumas questões de um cidadão que está farto de assistir a uma sui generis e impune governação/campanha/propaganda.
Assim, e ainda mais importante do que apresentação do programa de governo do PSD, pode V. Ex.ª garantir aos portugueses que, sob a S. liderança, o futuro governo:
1. Não perseguirá cidadãos/jornalistas no exercício do direito constitucional de escrutínio, crítica e/ou opinião?
2. Não pressionará as empresas de comunicação social, entre outras, para afastar este ou aquele cidadão/jornalista incómodo?
3. Assume o compromisso de propor nomes credíveis e profissionalmente reconhecidos, sujeitas a posterior validação em sede parlamentar, para liderar os órgãos de comunicação social públicos?
4. Está disposto a indicar, desde já, um nome para a liderança do Ministério Público capaz de, inequivocamente, garantir o princípio da legalidade?
5. Assume o compromisso de não tentar condicionar, directa e/ou indirectamente, juízes, procuradores e investigadores criminais mesmo que estejam em causa investigações sobre actos, políticos e/ou pessoais, de membros do governo ou outros com notória e pública relevância e influência nacionais?
6. Não enxameará a Administração de boys, apenas por terem um determinado cartão partidário?
7. Não se servirá dos mais sensíveis departamentos de Estado para vigiar, condicionar e/ou perseguir críticos e adversários políticos?
8. Prescindirá da capacidade de nomeação de altos dirigentes, para organismos de escrutínio e de controlo, para acautelar interesses diversos e insondáveis, em detrimento da legalidade e do interesse colectivo?
9. Procederá a uma reestruturação dos organismos de controlo e de escrutínio de forma a garantir que estão ao serviço da comunidade e não ao serviço das estatísticas favoráveis ao governo?
10. Procederá a uma revisão das nomeações para as comissões parlamentares, evitando que estas mais pareçam associações de defesa de sectores e/ou de interesses destas ou daquelas empresas privadas?
11. Procederá a uma avaliação da legislação, em sectores vitais da Economia e das Finanças, entre outros, promovendo uma transparência que permita eliminar todos os alçapões legais que favorecem e/ou rendem fortunas a privados?
12. Eliminará qualquer suspeita de que a legislação em vigor, que confere ao Estado um poder de discricionariedade na aprovação de negócios/empreendimentos, tenha como objectivo, entre outros, o financiamento partidário ilícito?
13. Denunciará as grandes transacções de armamento, em que Portugal intervém como país terceiro e /ou de trânsito?
14. Procederá à avaliação de todas as operações contabilísticas do Estado, criativas e/ou virtuais, que permitiram que o país tenha chegado ao actual Estado de desastre?
15. Determinará uma política externa assente no respeito pela soberania nacional e pelo Direito Internacional, em detrimento de um falso pragmatismo e de operações negras, clandestinas e/ou criminosas com a cumplicidade, por acção e/ou omissão, de entidades públicas nacionais?
16. Respeitará a fiscalização da Assembleia da República, cumprindo o dever de informação e de resposta às questões de todos os Deputados?
17. Não usará os dinheiros públicos como se fossem recursos partidários para atingir fins pessoais e eleitoralistas ?
18. Determinará uma ampla reforma em sectores vitais como a Justiça, a Fiscalidade, a Saúde e a Segurança Social de forma a garantir o Estado Social e evitar os actuais estrangulamentos estruturais?
19. Não condicionará empresas/empresários por manifestarem divergências políticas?
20. Está disponível para revelar os rendimentos e património pessoal antes e depois de ocupar o poder?

quinta-feira, 21 de abril de 2011

O português chico-esperto

Depois do primeiro embate provocado por medidas de austeridade avulsas, os portugueses ainda não assimilaram a verdadeira amplitude da crise económica e financeira, aliás, de dimensões ainda não totalmente conhecidas.

A falta de verdade no discurso político pode servir como justificação para esta atitude pautada pela indiferença, até cegueira nalguns casos, que tem levado à crescente e manipuladora tentativa de desvalorizar a responsabilidade de José Sócrates no buraco em que meteu o país, de mentira em mentira, de truque em truque.

Não é por acaso que as negociações do governo com o FMI continuam mansamente, deixando ainda muito espaço para o debate político em clima de pré-campanha eleitoral.

A explicação para o ambiente surrealista que o país atravessa é bem mais prosaica do que muitos têm tentado propalar, pois está sustentada num caldo explosivo que está aí à vista de todos:
1.    O Estado omnipresente que, apesar de todo o esbanjamento criminoso, ainda é visto como a última tábua de salvação;
2.     O primeiro-ministro que já deu provas de que é capaz de tudo, inclusive comprometer o futuro do país, para manter o poder;
3.     A máquina de propaganda do poder que continua a convencer a sociedade que não há limites para uma assistência eterna;
4.    A falta de exigência da opinião pública em relação a uma comunicação social cada vez mais refém;
5.    A atitude colectiva, ao jeito do chico-esperto, de que somos capazes de dar a volta aos nossos credores num piscar de olhos.


A simbiose entre estes cinco elementos é bem mais perigosa do que a eventual incapacidade colectiva para enfrentar com realismo e determinação o actual estado de pré-falência.

As eleições legislativas antecipadas de 5 de Junho são a última oportunidade para provar que somos capazes de quebrar esta lógica infernal, de assumir uma atitude responsável e de encontrar uma solução governativa capaz de liderar o país com verdade, competência, e rigor.

terça-feira, 5 de abril de 2011

O fim de Sócrates

A entrevista do primeiro-ministro à RTP marca um ponto de viragem na actual crise.

Num par de minutos, ficou bem patente o perigoso fosso que separa a realidade do chefe do governo.

De facto, Portugal continua nas mãos de um primeiro-ministro barricado nas suas próprias mentiras, contradições e ilusões.

Por melhor que seja o estilo e o calibre da capacidade de negação, não há dúvida: estamos onde estamos porque o governo não conseguiu criar o consenso necessário para salvar o país do risco da bancarrota.

A evolução das taxas de juro do dinheiro que temos de pedir emprestado ao estrangeiro para sobreviver é de tal forma alucinante que só não vê quem não quer ver.

Enquanto o presidente do BCP, Santos Ferreira, em entrevista na TVI, fazia um apelo lancinante a um rápido pedido de ajuda internacional, o primeiro-ministro assegurava do alto da sua leviandade e irresponsabilidade políticas que Portugal não precisa da intervenção do Fundo Europeu de Estabilização Financeira (FEEF).

Será que o país pode continuar a ser arrastado, diariamente, para um abismo por causa da táctica politiqueira do primeiro-ministro limitado a funções de gestão?

Não.

Se é inquestionável que o voto é a única forma de ultrapassar uma crise em Democracia, também é verdade que as instituições têm de funcionar de forma a colocar um ponto final nesta vertigem.

O presidente da República não pode ficar parado a assistir a um primeiro-ministro que fala de prestígio do país às segundas e passa o resto da semana de mão estendida para obter financiamento externo a qualquer preço.

Aníbal Cavaco Silva tem de agir rapidamente, garantindo que o futuro não está a ser definitivamente hipotecado por quem já perdeu toda a credibilidade e sentido de Estado.

Portugal não pode continuar a ser arrastado para uma espécie de roleta russa por causa do aventureirismo de um líder político que recusa aceitar que chegou ao fim da linha.