terça-feira, 18 de julho de 2017

GENTIL MARTINS NÃO É UM EXEMPLO


O país foi sacudido por um par de declarações avulsas de Gentil Martins sobre a "anomalia" homossexual e a "imoralidade" de um homem solteiro recorrer a uma barriga de aluguer para ter filhos.

O professor Gentil Martins proferiu uma opinião pessoal, não fez uma afirmação como médico, nem o poderia ter feito, desde logo porque nem tem competência, nem argumentação científica.

Urge desconstruir tais boutades, ao nível da conversa de café, sem cair no logro do politicamente correcto ou da intolerância bacoca, sublinhando que as declarações de gentil Martins são tão infundadas como tantas outras que ocupam o debate público, por exemplo, como aquela proferida pelo Presidente iraniano, Mohammed Ahmadinejad, em 2005, quando considerou o Holocausto um mito.

O assunto só assume alguma relevância por causa dos eventuais efeitos colaterais que tais afirmações, gratuitas e falsas, podem ter num jovem adolescente que, hoje, ainda não sente a confiança suficiente para poder viver (sem ter que exibir!) a sua orientação sexual.

Felizmente, o debate já permitiu repor a verdade dos factos.

Aliás, depois de glosada a qualidade de católico de Gentil Martins, seria de esperar uma declaração da Conferência Episcopal da Igreja católica portuguesa para manter a devida distância.

Quanto a Cristiano Ronaldo e ao recurso a barrigas de aluguer, Gentil Martins, sempre ávido pelos holofotes, hoje como ontem, confirmou o seu preconceito e ignorância, acabando por denunciar ao que veio: o insulto vulgar e rasteiro.

Ainda assim continuo a defender a liberdade de expressão e opinião, sem qualquer tipo de censura, mas nunca abdicando do exigível enquadramento jornalístico e editorial em nome do rigor factual.

Era exigível, obviamente, um contraponto da parte de quem o entrevistou e/ou uma edição mais competente que sublinhasse a alarvidade das afirmações de tão ilustre entrevistado, mas isso são contas de outro rosário, muito mais oportuno, sobre o mau serviço público prestado pelo semanário "Expresso", apesar de poder ter vendido mais uns exemplares.

Não sei se Gentil Martins, actualmente, é bissexual, gay ou hetero; também não sei se teve uma vida feliz ou se foi espancado, abusado ou vítima de bullying quando era criança; e também não sei se a sua idade terá avivado algum desvio típico do estereótipo do "macho latino".

Apenas posso opinar que não é um exemplo, nem para mim, nem para um católico, seguramente para ninguém com o mínimo de honestidade intelectual.

quarta-feira, 10 de maio de 2017

Secretas: retrocesso confirmado


Os serviços de informações vão ter um novo secretário-geral: José Júlio Pereira Gomes.

É o fim de um  ciclo desastroso de 12 anos, iniciado a 19 de Abril de 2015, um mês e sete dias depois de José Sócrates ter tomado posse como primeiro-ministro, estigmatizado por escândalos, abusos e demais ataques aos direitos, liberdade e garantias dos cidadãos, como é, aliás, graças ao jornalismo livre, do inteiro conhecimento público.

Mas é mais: é o fim da ficção hipócrita, para não lhe chamar falsidade grosseira, que as secretas operam na mais estrita legalidade se forem lideradas por magistrados.

A indicação de José Júlio Pereira Gomes também tem outro significado de monta: acabou o "sonho" dos serviços serem conduzidos por profissionais da casa, do SIS ou do SIED, com experiência, competência e credibilidade, de forma a dar mais garantias de independência face aos partidos, maiorias e governos.

Com a escolha do embaixador de Portugal na Suécia, abençoada pelos dois maiores partidos portugueses, PS e PSD, as secretas retomam, assim, o seu percurso de comunhão e promiscuidade entre as informações e o aparelho do Estado, com os resultados negativos que já conhecemos no passado.

A conclusão é óbvia: estão garantidas as condições, aparentemente, para que cada partido, cada barão, cada maioria, cada governo, continuem a ter no Sistema de Informações da República Portuguesa alguns dos seus homens, sempre atentos, quiçá, prestáveis.

O retrocesso está confirmado.

Resta a José Júlio Pereira Gomes contrariar a marcha da descredibilização dos serviços de informações.

É que dos cobardes e mentirosos não reza a história.

quarta-feira, 22 de fevereiro de 2017

ANGOLA E PORTUGAL: ESTADISTAS DE PACOTILHA


Portugal continua a viver assim.

Num pântano político que é sempre pautado por dois momentos: o primeiro, em que os políticos e governantes não olham a meios para defender os seus interesses e de facção, hipotecando o futuro do país; o segundo, em que os mesmos revelam o auto-proclamado sentido de Estado para consertar a situação, qual pragmatismo que tem vendido o país aos pedaços e aberto as portas ao dinheiro sujo da corrupção e das ditaduras sanguinárias.

Da esquerda à direita, de Costa a Marcelo, nada de novo no horizonte, pois o que interessa é captar investimento e vender a qualquer custo a Angola, China, Guiné Equatorial, Venezuela, etc, e, se possível, tentar tapar o buraco na banca, da responsabilidade de bancários incompetentes, com dinheiro venha ele donde vier.

Não há limites para esta triste realidade em que o país se tem afundado, mais e mais, para depois se tentar levantar chafurdando no pior do pior.

A mais recente cena desta novela de má qualidade é o adiamento da visita de Francisca Van Dunem a Angola.

Imposto pelas autoridades angolanas, num curto comunicado, emitido à última hora.

Sem apelo nem agravo. Humilhando a ministra da Justiça e o governo de Portugal.

Já todos tinham percebido que António Costa tinha angariado Francisca Van Dunem essencialmente por causa da sua origem, visando acalmar qualquer irritação do ocupante do Palácio do Futungo, e não para fazer obra na Justiça.

Para já, o trunfo de Costa saiu furado, pois os problemas de Manuel Vicente com a Justiça portuguesa vão arrastar, inevitavelmente, as relações entre Angola e Portugal para um período sombrio.

Mas com estes estadistas de pacotilha tudo se pode arranjar. Quem sabe com mais um investimento angolano ou um par de malas de dólares bem lavadinhos, quiçá com o carimbo da família de José Eduardo dos Santos, tudo se pode compor.

Como serve a Angola e a Portugal, dizem eles, o que lá vai lá vai, até ao dia em que o povo angolano se livrar de uma ditadura corrupta e implacável.

terça-feira, 10 de janeiro de 2017

Mário Soares: um par de segundos


Não fui um dos 785355 cidadãos portugueses que votaram Mário Soares em 2006.

Foi no comício de encerramento da campanha presidencial, na FIL, em Lisboa, que me despedi da lenda.

Mário Soares, no palco, derrotado, ficou frente-a-frente com os milhares de socialistas depois das principais figuras do PS terem dado uns passos atrás, já certos que o fundador do PS seria estrondosamente batido por Manuel Alegre, permitindo a eleição de Aníbal Cavaco Silva à primeira volta.

Durante um breve momento, um par de segundos, cruzámos o olhar.

Eu fascinado por assistir ao momento histórico da queda de uma referência da Democracia; ele curioso por causa do meu insistente olhar para quem, sem precisar de provar nada, arriscou, perdeu mas condicionou a História.

Olhos nos olhos, naquele preciso momento, percebi claramente que nem o desaire monumental diminui a Liberdade.

Os erros e as venalidades de Mário Soares nunca diminuíram o Homem que escolheu, lutou e caminhou até ao fim.