quinta-feira, 16 de junho de 2016

CGD: e ainda se riem do Brasil


A "revelação" das contas da Caixa Geral de Depósitos está a provocar um terramoto silencioso.

Não, não é pela iminência da prisão de alguns notáveis, da esquerda ou da direita, pois o regime está minado por políticos corruptos, assente numa Justiça incapaz e sustentado por uma comunicação social que não é livre.

A questão é outra: cheira a fim de festa, pá!

As declarações que se sucedem, à direita e à esquerda – sobre a oportunidade de se saber a verdade sobre as contas da CGD e, pour cause, passar a conhecer os nomes dos ladrões e cúmplices responsáveis por este verdadeiro assalto –, chegam a roçar o grotesco.

E lá vem o problema sistémico...

E lá vem o desfile de promoções e condecorações para premiar bandidos que, por acção e/ou omissão, contribuíram para a presente situação.

E lá vem o coro dos pactos e consensos que, até agora, factualmente, apenas serviram para branquear.

E ainda se riem do Brasil...

Perante os factos conhecidos, não é possível confundir quem denunciou este regabofe e pagou o preço com quem participou no festim e multiplicou vantagens.

Muitos daqueles que discursam na praça pública, quais virgens ofendidas, fizeram e fazem parte deste rolo compressor que tem atirado o país para a miséria.

Entre estes donos da coisa pública e os arautos do discurso político expurgado de qualquer moralidade – como se a imoralidade fosse passível de confusão com a amoralidade – lá estão os pobres coitados que obedecem a ordens e apenas são escolhidos por "não causarem problemas".

Pois é, entre eles, verdadeiros capachos de mandantes sem escrúpulos, lá estão tantos e tantos que têm de pagar as suas contas... 

domingo, 8 de maio de 2016

Estado chroma


Sob a capa de um discurso vistoso e diabolizando quem ainda nos permite ter pão na mesa, literalmente, é caso para dizer que a António Costa está apostado em alimentar um Estado chroma, cavalgando uma sucessão de imagens que ele, e todos nós, sabemos que são apenas e tão-só virtuais, com ou sem túnel à mistura.

O leitor só descobre o chroma quando lhe é permitido ver os bastidores pobres e desinteressantes de uma produção cinematográfica, de um programa de televisão ou de uma sessão fotográfica.

A parede verde no fundo é de estranhar, ao permitir uma diversidade fantástica e uma celeridade inimaginável, mas depois entranha, entranha e até confunde, pois permite a criação da aparência de um mundo perfeito.

Filme a filme, programa a programa, imagem a imagem, take a take, frame a frame, hora a hora, minuto a minuto, segundo a segundo, tudo parece mudar, numa explosão de cores e formas, mas afinal continua tudo na mesma, com a parede verde, sempre verde, no mesmo sítio.

Um par de meses após o regresso da esquerda ao poder, agora sim, de toda a esquerda, o sonho (ingénuo?) de haver alguma diferença em relação à direita que nos tem governado está à beira de virar pesadelo.

O Estado já nem esconde a falência, a corrupção que o mina e, agora, até faz gala em ameaçar não assumir os contratos que assina.

Só faltava o discurso arrogante e típico de quem anda sempre com o povo na boca mas ignora e espezinha os direitos dos cidadãos.

Em nome de uma legitimidade ilimitada da representação política, logo abusiva e falsa, a megalomania parece não ter limites para quem, fazendo de conta que tudo está bem, mantém o discurso de quem tem os cofres cheios, embora saiba muito bem que eles estão, outra vez, cada vez mais vazios.

É a manipulação mais grosseira, quiçá desprezível, ao serviço da táctica política e partidária, ignorando que o iminente falhanço, mais um, pode ter um preço e impacte devastadores sobre a vida das pessoas e das famílias.

Estamos a assistir, novamente, a momentos surrealistas da vida colectiva do país, emparedado entre o passado, marcado por atitudes delirantes e messiânicas (José Sócrates e Pedro Passos Coelho), e o presente sublinhado pela atitude irresponsável (António Costa).

Só faltava ainda outro tipo de atitude: a felicidade dos afectos (Marcelo Rebelo de Sousa).

Tanta encenação!

Os portugueses merecem mais do que este Estado chroma.

A verdade é bem diferente: nos corredores do poder está em curso uma guerra de interesses para manter a sobrevivência de alguns lugares no Olimpo das facilidades.

Indiferentes à vida dos cidadãos, a realidade aí está, tal e qual como é: se o défice aumentar, então o Estado aumenta os impostos; se a dívida continuar a crescer, então o Estado corta nas pensões; se o emprego não florescer, então o Estado ameaça o sector privado e avança com negociatas que permitem comissões chorudas; se a banca abre falência, então o Estado obriga o contribuinte a pagar.

O Estado é apenas o que parece, porque acreditamos no querem que acreditemos, e permitimos que assim seja.

Será coma?

Será carma?


Até pode ser chroma, mas não o pode ser eternamente, porque até no mundo virtual também há limites.

terça-feira, 8 de março de 2016

Governação das esquerdas: 100 dias e um plano B



Começa a ser hora de perguntar: estamos pior 100 dias depois da tomada de posse do XXI governo constitucional?

Sim!

O discurso político mudou – e, em muitos aspectos, ainda bem que sim –, e também é verdade que algumas alterações foram adoptadas em nome de uma maior capacidade de entendimento do sofrimento imposto aos portugueses.

Então, vale a pena, novamente, perguntar: estamos pior?

Sim!

Seja qual for o ponto de vista político ou sócio-económico, o clima de medo em relação ao que vem por aí voltou a imperar em Portugal, minando qualquer confiança no investimento e no crescimento económico.

Não é por acaso, seguramente, que António Costa já começou a tentar, desesperadamente, passar uma mensagem de normalidade, sem conseguir esconder um semblante cada vez mais aflito e carregado.

Não adianta avançar com artifícios que têm a perna curta e um prazo de validade muito limitado.

A oratória parlamentar inflamada e o abrir os cordões à bolsa estão a colocar o país na rota do abismo. Todos o sabem. Quem governa e quem está na oposição. Ricos e pobres. E das duas, uma: ou se alimenta o delírio ou se desce à realidade.

Na política há sempre uma alternativa: ciente da crise económica internacional, do aumento da dívida pública e do atingir do limite do aumento de impostos, mais ou menos camuflado, António Costa poderá ser tentado a precipitar uma crise política, de forma a provocar eleições antecipadas.

Esta crise política anunciada deverá ser preparada com recurso aos melhores truques marketeiros, tudo para que a culpa morra solteira ou possa ser jogada na cara dos adversários políticos, em sentido lato, ou seja, à direita e à esquerda do PS.

É um facto que a governação de António Costa, a manter o actual rumo, não pode correr o risco de ser avaliada, orçamento a orçamento, pois seria um suicídio político para ele próprio e para o PS.

Entre cálculos e jogadas, o país está a passar ao lado de uma estratégia coerente, capaz de consolidar a recuperação e evitar novo resgate.

Marcelo Rebelo de Sousa, o presidente eleito, aparentemente, percebeu o risco. E, por isso, tem insistido em enviar recados a António Costa, alertando-o que ainda acaba a fritar (q. b.) na cadeira de primeiro-ministro.

Os grandes temas que preocupam os portugueses, desde a economia às finanças, da saúde à segurança social, da justiça à segurança, estão a passar à margem das reformas que estão por aprofundar.

Os portugueses sabem-no, porque têm aprendido que é melhor fazê-las com tempo, gradualismo e inteligência, do que ter de as suportar à pressa, com brutalidade e pouca sensibilidade. E também já não compram a tese da cabala internacional, seja ela atribuída a Bruxelas, aos mercados ou às agências de rating.

É tempo de arrepiar caminho, com toda a naturalidade, de acabar com o silêncio pesado, de por fim ao assalto à Administração, de interromper o revanchismo das reversões e de refrear a arrogância política do quem quero posso e mando.

O país não aguenta a incerteza instalada, acrescida da ameaça real de ter que implementar, a curto prazo, um plano B imposto por Bruxelas, que, aliás, ninguém conhece, porque o governo o esconde e guarda a sete chaves.

No momento em que o país se livra de Aníbal Cavaco Silva, felizmente, só nos faltava que o fundamentalismo racional de Pedro Passos Coelho seja substituído pelo fundamentalismo delirante de António Costa.

Da direita à esquerda paira no ar uma espécie de aviso sério a António Costa: cá se fazem, cá se pagam.


sexta-feira, 5 de fevereiro de 2016

António Costa: entre o folclore e o abafamento


Quando um génio desaparece apercebemo-nos ainda mais facilmente como a trivialidade impera nos tempos em que vivemos.

Não, não é só o elogio sincero a David Bowie. Nem tão pouco o evocar da memória daquele memorável dia de Junho de 1983 no seizième de Paris, no hipódromo de Auteuil, em pleno Bosque de Boulogne. É sobretudo a constatação que o filme continua a passar mesmo à nossa frente: dissimulado, manso e perigoso.

O guião agrada aos notáveis da República e aos seus criados de luxo, sempre disponíveis para atacar a forma em vez da substância para fugir às responsabilidades, sempre diligentes em apontar o dedo ao acessório para melhor justificar a ausência do escrutínio do fundamental.

Ao mesmo tempo, cresce a tristeza estampada na cara dos portugueses, cada vez mais alheados das instituições e do poder político, como comprova a indiferença em relação à campanha eleitoral para escolher o 20º presidente da República.

Os "tugas", ainda mais pobres, já não se manifestam, nem lêem jornais, cada vez mais condenados ao folclore governamental de uma espécie de tempo novo e a uma informação cada vez menos livre que os entretêm.

E o rei vai nu há demasiado tempo, mas os palacianos ameaçados continuam a apontar a quem resiste, criando uma banda sonora sinistra que acompanha o filme que continua a passar descaradamente mesmo à nossa frente.

Assim, actualmente, até parece verosímil que as revelações que ocorrem durante o julgamento de um ex-espião, que têm permitido atestar as maiores ilegalidades no funcionamento dos serviços de informações, sejam menosprezadas face a um qualquer fait divers, por exemplo a deliciosa dúvida do candidato presidencial sobre se está a trincar um pastel de nata ou de Belém.

E até parece normal que o chefe dos serviços de informações, Júlio Pereira, continue em funções depois de tudo o que tem sido confirmado sobre a barafunda no Sistema de Informações da República Portuguesa, apesar da avassaladora onda de terrorismo.

Face ao penoso silêncio de chumbo do primeiro-ministro, António Costa, será que os candidatos presidenciais nada têm (tinham) a dizer sobre este escândalo, cujos principais contornos continuam a ser atirados para debaixo do tapete?

Eis um assunto de Estado, mais um, que também deveria merecer (não mereceu!) a maior atenção de quem se considera apto para ocupar a Presidência da República e, já agora, um exame mais atento da parte dos deputados, designadamente os do Bloco e os do PCP que, agora, sustentam o governo de António Costa, mas que no passado nunca se furtaram a exigir explicações.

É que Júlio Pereira foi nomeado em Abril de 2005 pelo governo liderado por José Sócrates, em que António Costa, enquanto número dois, desempenhou as funções de ministro de Estado e da Administração Interna.

Só a dissimulação em que estamos constantemente afundados permite que continuemos a viver na mais delirante ilusão, seja ela financeira, económica ou até de respeito pelas mais sagradas liberdades individuais.

Mas ainda mais grave é que nem mesmo quando é confirmado e reconfirmado o inimaginável, em curtos momentos de águas agitadas, se aprende com os erros do passado, pois logo regressa o abafamento politicamente cobarde para melhor poder manipular, defender interesses inconfessáveis, acertar as contas e até matar o mensageiro que ousa enfrentar, aberta e frontalmente, o abuso de poder e a corrupção que têm condenado os portugueses a uma vida de miséria.

No dia 24 de Janeiro, há (houve) uma nova oportunidade para escolher.