domingo, 21 de fevereiro de 2010

Os aspirantes

A última edição do semanário "Sol" deve ter deixado qualquer democrata estupefacto.

Não, não é por causa das novas revelações sobre a face oculta do primeiro-ministro, que qualquer cidadão de boa-fé já conseguiu perceber e assimilar.

A revelação importante é outra, designadamente a que nos permite ter uma ideia mais cristalina da qualidade e calibre dos aspirantes a governantes.

Obviamente, falo de Paulo Penedos e Marcos Perestrello; e se isto é o futuro do PS, então estamos conversados.

Mais grave ainda do que esta nuvem negra que se abateu sobre o futuro do PS, é o facto de Marcos Perestrello ser o actual secretário de Estado da Defesa.

Sem que se perceba o que o habilitou para ascender ao cargo, tal como ninguém tinha percebido por que razão Rui Pedro Soares aterrou na administração da PT, a verdade é que ambos chegaram onde chegaram, com os resultados agora conhecidos.

Porém, estranhamente, todos pediram a cabeça do "amigo" de José Sócrates, mas ainda ninguém pediu a cabeça do "amigo" de António Costa.

Por que será?

Ainda que se conceda, em tese, a possibilidade dos diálogos transcritos terem sido descontextualizados – o que seria gravíssimo –, a verdade é que o secretário de Estado, aparentemente, nada fez para contrariar ou evitar a negociata do pequeno-almoço de Luís Figo com o primeiro-ministro na véspera das eleições.

Ou será que avisou, imediatamente, o "chefe"?

Mais do que a personalização deste ou de qualquer outro caso, o mais importante é perceber como estão a ser formados os aspirantes a políticos que podem ser chamados a governar Portugal.

O mais aterrador é que tudo indica que, actualmente, os jovens quadros políticos lêem pela mesma cartilha que formou José Sócrates, entre tantos e tantos outros militantes partidários, da esquerda à direita.

O resultado está à vista.

terça-feira, 16 de fevereiro de 2010

Ponto de ordem

Depois de magistrados de Aveiro terem descoberto uma manobra de assalto à comunicação social, há-de ficar como o cúmulo do anedotário político as tentativas desesperadas para comprovar que existe liberdade de expressão, opinião e imprensa em Portugal.

No actual clima pantanoso, os 'boys' do regime abraçaram a missão de tentar convencer os portugueses que existe liberdade de expressão, opinião e imprensa porque ouvem, vêem e lêem notícias com críticas contundentes ao governo.

Quanto cinismo...

Os que se atrevem a fazer este paralogismo já se esqueceram do passado e, por exemplo, de todos aqueles que não se cansaram de afirmar o Estado de Direito durante a ditadura pelo simples facto de existirem tribunais.

Quanta má-fé...

Os que ensaiam justificar o injustificável, fazendo de conta que não leram o "Sol" e não conhecem os bastidores do poder, usam todos os malabarismos para tentar disfarçar uma realidade para a qual, aliás, só acordarão quando mais lhes convier.

Quanto atrevimento...

O esforço para branquear o que se está a passar, há demasiado tempo, há-de ficar, seguramente, como o cúmulo do anedotário político, mas também como mais uma das páginas vergonhosas da história deste PS e da democracia.

E é preciso não esquecer que, hoje, entre os que se mostram surpreendidos e indignados também estão muitos que rejubilaram e apoiaram o estilo de José Sócrates e a sua forma de exercer o poder.

Quanto mais subtil for a mordaça dos novos tempos, maior terá de ser o empenho em denunciar as diferentes formas de censura.

quinta-feira, 11 de fevereiro de 2010

Não ao jornalismo cobarde

A divulgação de matéria informativa de inegável interesse público é um direito constitucional.

A notícia da semana passada do semanário "Sol" é um serviço público de inestimável valor e seriedade, merecendo ser acompanhado por todos os que pretendem um regime mais transparente.

E quem decreta que a publicação de uma qualquer escuta é crime não é o primeiro-ministro, seja ele José Sócrates ou outro qualquer.

O semanário de José António Saraiva tem estado quase sozinho na tentativa de aprofundar a investigação sobre o mais recente plano de assalto à comunicação social.

Não é digno de uma democracia madura e de uma comunicação social livre que o escrutínio de algo tão grave seja assumido, activamente, por um ou dois meios de comunicação social.

O "Sol" não pode ficar isolado, como tantas outras vezes aconteceu a quem assumiu o dever de informar.

É preciso enfrentar o cinismo de alguns media que criticam a revelação de escutas e de outros documentos judiciais, mas depois aproveitam as mesmas informações para 'surfar' a onda mediática, protagonizando o jornalismo mais cobarde que existe.

Na verdade, importa perguntar: O que aconteceu com as "cachas" do "Jornal de Sexta"?

A generalidade dos meios de comunicação social aproveitaram e usaram a seu belo prazer todas as revelações, independentemente das opiniões dos responsáveis editoriais sobre o estilo e os métodos de Manuela Moura Guedes.

Algumas das situações, que chegaram a roçar o grotesco, não devem ser o padrão de acção daqueles que têm o dever de informar com lisura e rigor.

É preciso que os profissionais da comunicação social assumam as suas responsabilidades, de forma a não ter que passar, mais uma vez, pela vergonha de ter de ser um qualquer deputado, cá dentro ou lá fora, a denunciar o que se diz à boca pequena nos corredores.

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2010

A debandada socrática

Há muito tempo que José Sócrates não tem condições para ser primeiro-ministro de Portugal.

Na biografia não-autorizada – "José Sócrates - O homem e o líder" – fiz várias referências documentadas sobre a sua estranha tendência para misturar a vida pessoal e o plano institucional no exercício do poder.

Fazer determinadas afirmações à revelia do status quo reinante pode ser penalizador, mas é reconfortante constatar que o tempo nos dá razão.

De facto, as revelações do semanário "Sol" confirmam uma actuação que obedece a um padrão aventureiro, mesquinho e perigoso, tantas são as tropelias (indícios de crimes?) escarrapachadas em documentos timbrados e assinados por investigadores da PJ, confirmados por um procurador do MP e ratificados por um juiz.

Ainda que muitos possam ter ficado surpreendidos com os sinais de abuso de poder, de cobardia e de mentira, há muito tempo que entre o "homem" e o "líder" não há fronteiras, valendo tudo para tentar consolidar um projecto político de poder pessoal.

José Sócrates passou à condição de CPP (Cadáver Político Potencial), à mercê de todos aqueles que o ajudaram a dar um dos maiores golpes na credibilidade da democracia dos últimos 30 anos.

Enquanto não surgir uma alternativa credível, porventura ainda vai governar durante mais algum tempo, com a corte do costume a fazer de conta que ainda o respeita.

O futuro político de José Sócrates passou a depender dos que estiveram ao seu lado e que, não tarda nada, vão começar a olhar para ele de soslaio, como se não tivessem feito parte do seu projecto e da sua incomensurável falta de cultura democrática.

Mais uma vez, e sem receio de voltar a ser penalizado por não considerar o status quo reinante, é preciso antecipar as consequências da previsível debandada socrática, cujos principais representantes, assumidos ou encapotados, já perceberam que quanto mais tarde se distanciarem do primeiro-ministro mais dificilmente poderão aspirar a ter uma réstia de credibilidade profissional e politica.

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Wake up

A instabilidade governamental é assacada aos partidos políticos, mas também ao Presidente da República.

Com o fim da monumental encenação da aprovação do Orçamento de Estado, Aníbal Cavaco Silva pode começar, com toda a tranquilidade, a preparar a recandidatura presidencial.

Com uma oposição incapaz, temerosa, quiçá também rendida aos grandes interesses, o resultado até seria idêntico mesmo que o défice de 2009 atingisse, ainda mais miraculosamente, valores superiores.

De facto, os 9,3% anunciados até podiam ter chegado aos 10,3% do PIB – uma percentagem igual à do desemprego –, pois esta espécie de direita seria impotente para obrigar o governo a assumir as manigâncias politicamente descaradas.

Agora, pasme-se, mesmo as promessas de mais investimentos públicos, designadamente os grandes projectos do novo aeroporto e do TGV, podem ser sacrificados por quem os prometeu desenfreadamente, obviamente com base no álibi da 'nova' realidade orçamental.

A política do vale tudo venceu, perante uma oposição de rastos e uma comunicação social limitada à espuma do dia-a-dia.

Para trás fica uma campanha eleitoral politicamente mentirosa – mais uma! –, em que o governo escondeu a verdadeira dimensão da crise financeira, económica e o buraco das contas públicas.

Mais uma vez, José Sócrates venceu uma batalha política, obrigando os adversários políticos a trabalhar para si e por si.

Tal só foi possível com Fernando Teixeira dos Santos, até ao dia em que José Sócrates se fartar do ministro das Finanças que se 'engana' muitas vezes.

Ainda atónitos com a 'nova' realidade orçamental, os portugueses preparam-se para começar a pagar a factura, sem instabilidade governamental nem responsabilização de quem atirou o país para o abismo, de anúncio em anúncio e de truque em truque.

É caso para perguntar: Quanto tempo ainda será preciso para acordar para a governação mais politicamente irresponsável e opaca dos últimos 30 anos?