segunda-feira, 13 de maio de 2024

O CHARCO E A GUERRA


A corrupção tem servido como lubrificante para intensificar a máquina da globalização – Estados nacionais, empresas, ONG’s, organismos supranacionais e mercado financeiro.

As duas guerras em curso, russa na Ucrânia e israelita em Gaza/Rafah, estão a comprová-lo a cada dia que passa.

A sobrevivência da economia e das finanças russas, apesar das sanções dos Estados Unidos da América e da União Europeia, incluindo o afastamento do sistema “SWIFT" desde Junho de 2022, não deixa dúvidas.

No caso de Israel, o isolamento diplomático também não compromete o que quer que seja, nem o dedo no gatilho.

Com sistemas financeiros alternativos, como por exemplo o russo “SFPS” (System for the Transfer of Financial Messages), e o chinês “CIPS” (Cross-Border Inter-Banking Payment System), o modelo de globalização ocidental continua a rolar as usual.

Nada, nem as ligações do Deutsche Bank a Putin bastaram para quebrar o ciclo vicioso, em que os Estados, a banca internacional, as grandes multinacionais, as máfias e os terroristas convivem e partilham os lucros nos bastidores.

A globalização de mais humanidade e justiça rapidamente se transformou num charco de democracias, ditaduras, assassinos e demais tubarões de todas as raças, credos e cores, em que democratas-cristãos, liberais, social-democratas e socialistas se confundem.

O resultado esta à vista: mais guerra, mais fome, mais e mais milhares de mortos e mais destruição impunes, realidades que não afectaram a equação milagreira do século XXI.

Nem o medo, nem o crescente risco de confrontação nuclear, nem mesmo o espectáculo degradante que resulta das migrações descontroladas são suficientes para a travar a globalização selvagem.

Longe vão os tempos da ingenuidade do movimento que ganhou expressão nos anos 80 do século passado, em que se destacaram Ngozi Okonjo-Iweala (entusiasta) e Milton Santos (céptico).

Na miríade global, em que parte da população mundial ficou à margem, a maioria dos cidadãos dos países ricos continuam inebriados com o consumismo, indiferentes à desigualdade e agora até complacentes com as matanças ao vivo e em directo.

segunda-feira, 6 de maio de 2024

POLÍCIA BOM E POLÍCIA MAU NA JUSTIÇA


O Manifesto da Justiça, divulgado no passado dia 3 de Maio, depois de uma análise mais fina, corre o risco de poder ser classificado como um enorme embuste político.

Intitulado "Por uma reforma da Justiça - Em defesa do Estado de Direito Democrático", de registar, entre os signatários, que 28% são do Partido Socialista, dos quais 75% foram membros de governos da República.

Mais curioso do que a admissão de incompetência é que entre estes até marca presença um ex-ministro da Justiça socialista, porventura um dos piores de sempre.

Não admira, portanto, que o manifesto tenha sido colado à defesa de governantes e ex-governantes  a contas com a Justiça, mas o certo é que António Costa, Miguel Albuquerque e José Sócrates não fazem parte da lista de signatários.

As críticas são tão assertivas quanto velhas: morosidade, violação do segredo de justiça, abusos, escutas, buscas, prisão preventiva, etc.

Sobre a falta de meios e a autonomia financeira nem uma única palavra, pois o mais importante parece ser o apelar a uma intervenção legislativa para melhor capsular a autonomia do Ministério Público.

O documento não deixa quaisquer dúvidas ao que vem, quando sustenta termos atingido o «penoso limite de ver a acção do Ministério Público gerar a queda de duas maiorias parlamentares resultantes de eleições recentes».

E mais, pasme-se: «O Ministério Público nem sequer se dignou informá-lo [António Costa] sobre o objeto do inquérito nem o convocou para qualquer diligência processual».

Além de comparar o incomparável, e ainda a falsidade formal, já que os magistrados não derrubam governos, uma curiosa olímpica cautela: nem uma palavra explícita sobre a polémica pública das operações serem levadas a cabo pela Autoridade Tributária, PJ e PSP.

Afirmações tão pouco fundamentadas contrastam com a atitude de quem, a contas com as magistraturas, já manifestou a determinação em se defender em sede própria, deixando a nu um mero jogo de polícia bom e polícia mau.

A cereja em cima do cinismo político surge na primeira alínea daquilo que os signatários entendem como prioritário: «Garantir uma efectiva separação entre o poder político e a justiça».

Face a este arrazoado avulso não admira uma proeza de monta: conseguir juntar Daniel Oliveira a Daniel Proença de Carvalho, entre outros.