A revelação da transcrição de escutas, realizadas no âmbito de processuais judiciais, deve ser feita com a maior parcimónia.
Porém, a questão de princípio não impede o uso da informação como background.
Cabe a qualquer cidadão, ou jornalista, fazer a avaliação do que é a excepção em cada momento.
Esta reflexão surge na sequência da divulgação de escutas envolvendo Armando Vara, entre outros arguidos do processo "Face Oculta", cuja leitura não surpreende.
Muito mais importante do que transcrever uma ou outra escuta é ter uma visão global do que Vara representa, aparentemente, no funcionamento do regime.
Só assim é possível chegar ao pântano em que está transformado o fim do consulado de José Sócrates.
De recordar que, no dia a seguir às eleições de Fevereiro de 2005, qualquer um apostaria que Armando Vara viria a ser um dos membros mais influentes do XVII governo constitucional.
Enganaram-se os que então julgaram que o ex-ministro de António Guterres, envolvido no escândalo da Fundação para a Prevenção e Segurança, que levou à sua demissão, voltaria às lides governamentais.
O caminho destinado a Armando Vara, como de tantos outros, foi diferente. De um momento para o outro, passou a administrador da Caixa Geral de Depósitos e depois a administrador do "novo" BCP.
Afinal, o verdadeiro poder não está exclusivamente confinado à governação, como demonstra, aliás, o acesso inexplicável que Vara teve a cartas confidenciais que deram entrada no gabinete do primeiro-ministro, entre outros documentos.
Desde então, e sempre com estrondo, o socialista tem sido notícia pelo seu envolvimento em casos, cujo denominador comum político é o primeiro-ministro.
No caso "Face Oculta", e apesar de todas as tentativas de branqueamento, oficiais ou oficiosas, Armando Vara surgiu em toda a sua refulgência, mais sucata menos sucata, representando o papel de uma espécie de pivot do regime.
Não basta transcrever escutas.
Mais importante do que transcrever as escutas que envolvem Armando Vara é ter a capacidade de as descodificar, revelando o que está na origem do descalabro do país, quiçá responder a uma pergunta de inegável interesse público: Armando Vara é um caso isolado ou representa apenas a ponta do iceberg?
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