Seja qual for o tema, a
circunstância e o status social, as
conversas acabam, invariavelmente, numa espécie de declaração de estado de
sítio: caímos num impasse.
Portugal é assim: continuamos a
viver entre a resignação e o fatalismo, com mais ou menos verniz de aparente modernidade.
A realidade extravasa a própria dimensão
da actual crise. Se retrocedermos aos tempos idos do antes do 25 de Abril, da
Primeira República e até ao tempo dos outros ventos do liberalismo e ao fim da
monarquia, é possível constatar que, mutatis
mutandi, a mediocridade dos protagonistas e o ambiente geral não eram assim
tão diferentes.
Será uma doença? Uma questão
genética? Não creio. Prefiro considerar que se trata da consequência natural de
uma determinada estrutura instalada, há muitas e muitas décadas, que continua a
ser alimentada por uma organização constitucional, política, económica, social
e religiosa que se especializou em acolher a mudança, de tempos a tempos, para
garantir que tudo fica mais ou menos na mesma.
Não faltam exemplos para
comprovar esta inércia que, entre a violência obscurantista e os picos de
lirismo patrioteiro, aviva o nosso tradicional e terrível atavismo endógeno.
O país continua esmagado por uma
ordem constitucional eloquente que na realidade vale pouco; continua
politicamente esborrachado entre uma esquerda sem vergonha e uma triste direita;
continua vergado por uma desigualdade desumana e uma ostentação parola;
continua a viver sob a capa de uma fé que continua a servir o poder e a
quedar-se pelo consolo dos mais fracos.
Os portugueses assistem ao
descaramento e ao populismo dos principais responsáveis pelo estado a que o país
chegou; o mesmo país é confrontado por uma direita que ganhou o poder e governa
com um olho na salvação nacional e o outro nos negócios, não vá o diabo
tecê-las, com mais ou menos ameaças de serem corridos por quem já nem tem
respeito pelos valores democráticos.
Os portugueses já não sabem para
onde se virar. E o impasse continua. Lá continua, ano após ano, governo após
governo, gerando a insuportável percepção, ainda que infundada, que não há
diferença entre a ditadura criminosa e a democracia imperfeita.
Em termos gerais, apesar de
dignas e honrosas excepções, nem mesmo a academia, a justiça e o jornalismo
parecem ter capacidade para dignificarem os seus valores mais sagrados,
limitando-se a fazer a encenação de sempre, o jogo do poder, incapazes de se
livrarem do jugo de quem lhes paga mais, alimentando a esperança que tudo pode
mudar, mas escondendo que, afinal, são eles que garantem que tudo ficará, mais
ou menos, na mesma.
O impasse tem uma origem: os
homens de esquerda e de direita de Portugal, os tais que ocupam o poder há
décadas, abriram uma guerra fratricida por causa dos seus pequeninos interesses
pessoais e partidários, sem o mínimo pejo em sacrificar os seus concidadãos. O
mais grave é que, numa vertigem de
sobrevivência, ainda há quem lhes estenda a passadeira vermelha.
Vai ser necessário uma nova geração
de políticos e governantes e uma opinião pública mais exigente e menos
desinformada para varrer esta gente que mantém o país refém. Aliás, já nem
escondem, na sua imensa mesquinhez e venalidade, a falta de convicções, ideias e
projectos para o país, limitando-se a fermentar um alegado inimigo e a adoptar
uma atitude que não leva, nem a eles nem a nós, a lado nenhum.