quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Erros com perdão

Mário Soares, num artigo de opinião, no Diário de Notícias, aponta baterias a Manuela Ferreira Leite, a propósito da polémica sobre as listas de deputados que vai levar a votos.

O raciocínio do ex-presidente da República é irrepreensível, mas peca por duas leviandades: a primeira, e mais óbvia, é a duplicidade de critérios; a segunda, é a de considerar um erro como irreparável.

Mário Soares não deveria apontar o dedo assim tão facilmente. O seu estatuto de Senador da República não nos apagou a memória.

Se há período da Democracia em que se consolidaram algumas das piores práticas ditas 'democráticas', sem qualquer dúvida que temos de regressar aos períodos em que liderou o governo e se instalou vigilante no Palácio de Belém.

De igual forma, e ainda que sem mácula apontada pela Justiça, o que dizer do seu erro chamado Rui Mateus, cujo livro «Contos Proibidos – Memórias de um PS desconhecido» está agora à beira de um clique na Internet?

Mário Soares ao escrever deve ter confundido o desejo com a realidade.

É verdade que numa democracia consolidada Manuela Ferreira Leite teria perdido as eleições no momento em que apresentou as listas do PSD. Tal e qual como José Sócrates não teria ganho as de 2005 e, com toda a certeza, não se atreveria a ir a votos em 2009.

Em Portugal, não há erros irreparáveis. Ainda não chegamos a tal apuro democrático e civilizacional de que, aliás, o fundador do PS é um exemplo vivo.

Hoje, o estado a que chegou a Justiça, a Educação e a Saúde, a falta de renovação na política e os casos de corrupção de "colarinho branco" são a melhor prova de que há erros que compensaram, e continuam a compensar.

quinta-feira, 30 de julho de 2009

Fuga em frente

O primeiro-ministro de Portugal está de cabeça completamente perdida.

Depois da derrota eleitoral nas eleições europeias, o chefe do governo desatou a disparar em todos os sentidos e a prometer tudo a todos, tentando esquecer um passado de quatro anos em que foi incapaz de cumprir as promessas eleitorais feitas em 2005.

Incapaz de digerir a derrota, e até de se remeter a um silêncio que lhe permitisse uma reflexão sobre os falhanços do governo, José Sócrates, na pele de chefe do governo e de secretário-geral do PS, entrou numa vertigem de iniciativas públicas dignas de uma verdadeira campanha eleitoral.

Sem tempo para pensar, os socialistas estão cada vez mais agarrados a um líder que quer garantir o poder a qualquer custo, dando uma imagem de pânico em relação a uma eventual nova derrota em 27 de Setembro.

Nesta deriva, imposta por uma enorme falta de sentido de Estado e por assessores e consultores incapazes de o aconselharem, quiçá mais interessados em garantir o futuro, José Sócrates foi novamente envolvido num caso, mais um caso – convite a Joana Amaral Dias para entrar nas lista dos PS a troco de lugares de Estado.

Depois do ataque certeiro de Francisco Louçã, que o acusou de tráfico de influências, José Sócrates e os seus ajudantes vieram a terreno desmentir, desmentir e desmentir.

Hoje, Paulo Campos, secretário de Estado adjunto das Obras Públicas e Comunicações, veio confirmar o convite, mas garantindo que «não deu conhecimento destes contactos pessoais e privados à direcção do PS, ao secretário-geral ou à federação distrital do PS de Coimbra, nem estava mandatado por eles para formalizar qualquer convite».

Já ninguém se admira com este tipo de fuga em frente, com este tipo de gente que governa o país.

O espanto, o que mais impressiona, é que ainda julgam que é possível voltar a enganar politicamente os portugueses.




terça-feira, 7 de julho de 2009

Responsabilizar

Em Novembro de 2008, antecipei o arquivamento do processo aberto para investigar os voos da CIA e o transporte de sequestrados por território português.

Fi-lo em plena consciência, na página 117 do livro «Voos 'Secretos' CIA – Nos Bastidores da Vergonha», decorridos mais de vinte meses após a abertura do Inquérito criminal.

Foi a minha maneira de alertar para a falta de rigor de um inquérito que se limitava ao ritual habitual com fim anunciado, sem mesmo garantir o respeito de atempadamente cumprir as exigências formais de uma investigação.

Não me enganei, como demonstrou o despacho de arquivamento, com data de 29 de Maio de 2009. E depois remeti-me ao silêncio, seguro que o tempo se encarregará de apurar a mentira e a ignominia.

Depois da tentativa de recolha acéfala de reacções ao conteúdo de 27 volumes, dos quais 24 relativos a apensos, o silêncio abateu-se sobre o processo.

A única pedrada no charco ocorreu ontem, durante a declaração da Eurodeputada Ana Gomes, que tomou posição sobre o despacho de arquivamento.

Ao optar por reclamar a reabertura do inquérito, apontando erros grosseiros e omissões inimagináveis, a Eurodeputada decidiu responsabilizar o Ministério Público. E, como referiu, das duas uma: ou houve incompetência na investigação do Ministério Público ou vontade política de enterrar o caso.

Certamente, muitos ficaram desiludidos por Ana Gomes não ter pedido a abertura de Instrução, pois ficaram impedidos de glosarem a partida para a 'guerra' em nome de mais uma causa, ao jeito de uma cruzada moderna.

Ana Gomes tomou a atitude certa e honrou um trabalho notável de dedicação e competência.

O Estado de Direito e os valores da Democracia não dependem só do empenho deste ou daquele cidadão. Por vezes, a melhor maneira de os defender é confrontar as instituições e os seus principais responsáveis com as suas decisões, por acção ou omissão, por mais toscas e descaradas que possam ter sido.

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Portugal merecia mais

Conhecidos os resultados eleitorais de 7 de Junho passado, defendi que o primeiro-ministro deveria apresentar a sua demissão ao Presidente da República.

Ainda que a legitimidade formal para governar não tenha sido beliscada, a derrota nas urnas diminuiu a legitimidade política do governo para assumir em toda a plenitude a recta final do mandato que lhe foi conferido em 2005.

Além dos argumentos constitucionais e políticos, a devolução da palavra ao povo é sempre a melhor forma de clarificação em Democracia.

Manuela Ferreira Leite e Aníbal Cavaco Silva são cúmplices e responsáveis pela actual situação de impasse. Nem a líder do maior partido da Oposição, nem o presidente da República, quiçá por razões estratégicas, levantaram a voz contra mais um adiamento de Portugal.

Afastado o cenário da antecipação das eleições, o que se está a passar?

O país já caiu numa campanha eleitoral que vai durar mais de três meses.

Num momento em que são necessárias medidas de excepção para responder a uma crise interna e global também de excepção, a crescente paralisia governamental é evidente.

Os sucessivos anúncios de adiamentos das obras públicas e de reformas consideradas estruturantes são a prova cabal que o governo já está em gestão corrente.

E a infantilidade política de quem julga que a melhor forma de ultrapassar o desaire eleitoral é aliviar aqui e ali alguns traços de estilo e imagem revela que estamos á beira do pântano.

Pouco importa se a estratégia do primeiro-ministro lhe é política e pessoalmente favorável ou desfavorável. O que realmente importa é a forma desesperada como se está a agarrar ao poder, o que prejudica a governação e o futuro do país.