Fiz e assinei entrevistas a cidadãos presos porque sempre acreditei que os jornalistas têm de ter a porta aberta para ouvir, sem qualquer juízo prévio, condição essencial para poder informar.
José Sócrates tem advogados. E tem facilidade em chegar à comunicação social, por mais juridicamente irrelevantes que possam ser os seus comunicados.
Para já, ninguém pode diminuir o direito à presunção
de inocência e até a possibilidade de, em caso de ser absolvido, recuperar a
sua carreira política.
O excesso de prisão preventiva não se coloca apenas
em relação a José Sócrates. É uma questão importante, merecedora da maior
atenção da parte do legislador, mas deve ser resolvida independentemente da
prisão deste ou daquele político.
A excepcional condição de Sócrates estar preso,
ainda sem ter sido feito prova de culpa, se não lhe confere qualquer direito
a uma estratégia de vitimização espúria, também não justifica seguramente que
alguns dos seus inimigos se sintam à vontade para o achincalhar.
Se é desejável que os amigos estejam com ele nesta
hora difícil, e é humanamente compreensível que a emoção ultrapasse a razão, é
preciso afirmar que o insulto grosseiro e sem fundamentação de condenação do
mensageiro não colhe e não pode condicionar a investigação.
É infame tentar confundir o Estado de Direito
democrático, ainda que imperfeito, com uma qualquer perseguição política que faz
lembrar os tribunais plenários do regime fascista.
É fundamental ter a serenidade suficiente para
distinguir entre a legitimidade de actuação dos magistrados e a bastardia de
pactuar com uma qualquer campanha orquestrada, venha ela de senadores, comentadores
ou anónimos, com ou sem Évora no epicentro, ad
hominem ou para tentar salvar eventuais interesses difusos.
O linchamento cruel e o branqueamento insidioso
estão vocacionados ao insucesso.
Os casos Carlos Melancia e Leonor Beleza, entre
outros, cujos desenvolvimentos ainda hoje ensombram a nossa memória colectiva,
não se podem repetir.
Os magistrados e os polícias têm mais e melhores
meios. Os jornalistas estão melhor preparados. E os portugueses estão cada vez
mais atentos aos crimes de colarinho branco.
Quem se apressa a condenar ou a inocentar José
Sócrates revela ignorância ou má-fé, por
isso, ao menos, poupem-nos a histeria ruidosa da verborreia de cada um dos
lados da barricada.
É preciso reafirmar, as vezes que forem necessárias,
que a investigação jornalística não é suficiente para absolver ou condenar. E a
violação do segredo de justiça é um prato muito mais complexo do que aquele que
alguns insistem em servir quando estão em causa os poderosos.
A comunicação social não pode sucumbir ao escrutínio
à la carte e à tentativa patética de substituir os tribunais.
A avaliação dos indícios e a ponderação da prisão
preventiva têm de ser feitas no local próprio: os tribunais. E a legalidade da
prisão de José Sócrates, já apreciada pelo Supremo Tribunal de Justiça, na
sequência de um dos pedidos de Habeas Corpus, é apenas uma etapa para prevenir
qualquer eventual erro ou abuso.
A Justiça está condicionada pelo princípio do
contraditório processual e sujeita à critica da opinião pública, mas não está à
venda, como se fosse um jornal ou uma televisão, por mais pressões cobardes e
silenciamentos repugnantes, com ou sem dinheiro dos contribuintes e a ajuda de
um par de amanuenses dedicados.
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