sábado, 1 de fevereiro de 2014

António José Seguro mais perto


O líder do PS tem dados sinais, nos últimos tempos, de distanciamento de uma certa forma de fazer política – tão cara a governos e governantes de esquerda e de direita – que tem comprometido o desenvolvimento do país e o futuro de sucessivas gerações.

Actualmente, é claro que a política de terra queimada, que marcou o início do mandato do actual secretário-geral dos socialistas, muito pela pressão desenfreada de uma certa facção minoritária do PS, chegou ao fim.

Finalmente, o líder do PS compreendeu que há opções que não trazem qualquer vantagem a médio e longo prazo.

Seguro está a abandonar, progressivamente, o caminho da gritaria, deixando a tarefa espalhafatosa a alguns rostos socialistas, comprovando que não mete a cabeça na areia face aos diferentes indicadores que têm desmentido as teses mais catastrofistas.

O líder do PS já percebeu que a vozearia inconsequente, sem consistência nem alternativas credíveis, pode vir a ser uma arma de arremesso fatal lá para 2015, pelo que tem deixado cair alguns órfãos do partido que, de semana para semana, perdem credibilidade pelo radicalismo estéril.

A evolução do pensamento do líder do maior partido da oposição, que traduz a preparação do PS para ser alternativa, tem passado pela afirmação de uma vontade de maior transparência, rompendo com o pântano em que a política se transformou.

António José Seguro compreendeu que chegou a hora da acção. E por isso está mais perto do seu objectivo.

A aprovação da reforma do IRC, as críticas directas aos quatro anteriores governos, do PS e do PSD, por manifesta falta de cumprimento das promessas eleitorais e a fleuma em relação à intriga partidária têm permitido a António José Seguro consolidar a sua candidatura a primeiro-ministro.

O PS tem de agir e pensar em Portugal, em vez de estar infantilmente obcecado em tentar reescrever a história. Quanto mais serena e construtiva for a oposição socialista, sem abdicar da frontalidade do seu pensamento e opções políticas, mas hipóteses o PS tem de chegar ao poder.

A pesada herança do resgate internacional, mais um, não desaparece com sound bytes avulsos ou com um discurso marketeiro mais ou menos colorido e agressivo.

O aventureirismo de mais e mais dívida, a confusão entre a Europa que temos e aquela que gostaríamos de ter e a fantasia de colher os benefícios da globalização sem estar preparado para pagar os seus paradoxos já custaram demasiado para ser possível equacionar, novamente, o regresso a atitudes imaturas e diletantes.

 Os socialistas precisam de trilhar um caminho com os pés bem assentes na terra para voltarem a ter a confiança dos portugueses. E antes dos interesses do PS têm de  estar os interesses daqueles que estão a pagar na carne, todos os dias, os erros dos socialistas no passado.

A oposição ancorada numa estratégia competente, firme e serena não é incompatível com acordos pontuais com a maioria que sustenta o governo de Pedro Passos Coelho, desde que esses compromissos sirvam um quadro de estabilidade que potencie a atracção de investimentos e a rápida criação de mais emprego.

O espírito de compromisso, as propostas realistas e a renovação dos rostos que dão visibilidade à alternativa socialista obrigam o governo a governar melhor. E mais: fazem parte do dever de construir um país mais justo e próspero.


Os próximos meses, com mais ou menos folclore com a saída da troika, vão ser decisivos para atestar se António José Seguro está preparado, finalmente, para o encontro que tem marcado com a história. 

sábado, 21 de dezembro de 2013

Passos Coelho já não manda



O clima de euforia que foi criado nas últimas semanas, artificialmente, não conseguiu abafar o estrondoso chumbo do Tribunal Constitucional ao regime de convergência das pensões.

Por maior que seja a evidência, é preciso tentar compreendê-la, desde logo colocando a questão principal: por que razão Pedro Passos Coelho insiste num caminho que o povo não quer seguir e que o Tribunal Constitucional não vai permitir que seja percorrido?

A resposta é simples: O primeiro-ministro já não manda.

Só assim é possível interpretar, racionalmente, a estratégia de perdedor que o chefe do governo teima, teima, teima em tentar levar por diante, por mais tombo em cima de tombo, qual líder esgotado e sem soluções que insiste em bater com a cabeça contra a parede.

A tentativa de ganhar tempo é evidente. Porém, há uma outra razão a montante deste comportamento politicamente suicida que não deve ser escamoteada: Pedro Passos Coelho já percebeu que não vai conseguir reformar o país pelo ataque aos privilégios de uma corte demasiado poderosa e habituada a estar sentada à mesa do orçamento.

Por isso, arrepiou caminho e optou por rapar o mais possível nos mais pobres e reformados, criando a ficção que os sacrifícios são para todos.

É verdade que o primeiro-ministro já afrontou alguns poderes instalados, mas quedou-se pelos cortes de algumas migalhas nas despesas que alimentam um enorme bando de sanguessugas que ora clamam por menos despesa, ora reivindicam mais e mais apoios e subsídios nos corredores do poder.

Obviamente, o povo não é parvo. E sabe que as cócegas aos mais ricos e poderosos não são suficientes, desde logo por não respeitarem a mais elementar regra de equidade.

De facto, por melhor que seja a intenção do primeiro-ministro – e por que não presumir que ela é verdadeira? –, ele ainda não conseguiu estar ao nível da emergência que herdou.

O país já não se contenta com um líder político que insiste numa política de remendos para deixar tudo mais ou menos na mesma, em disfarçar os benefícios atribuídos a uns quantos para massacrar os mesmos do costume.

Não chega, senhor primeiro-ministro. E já nem lá vai com mais truques de comunicação, portas abertas ao dinheiro sujo dos criminosos e controlo da imprensa. Aliás, para este tipo de embuste, do presente e do passado, não faltam outros políticos.

O limite da tolerância está no fim. O país está no limiar de manter a confiança na actual maioria. Não basta prometer, é preciso agir; não basta propalar a equidade, é fundamental começar por cima, demonstrar que os mais fortes e ricos estão a contribuir mais do que os mais fracos e pobres para ajudar a sair da crise.

A mudança não pode ser cosmética. Nem pode seguir, mutatis mutandis, o exemplo desastroso do último governo, com mais ou menos fuga em frente e pé no acelerador, que acabou em negociatas diversas e na condenação à miséria de várias gerações.

Não há dinheiro para continuar a sustentar a corrupção, o favorecimento, a incompetência e a falta de estratégia de futuro. E, já agora, a transparência não se decreta com formalismos.

Ou se tem vontade para levar por diante as reformas estruturais, ou se não tem. A questão não é de tempo, mas sim de substância; não importa se leva mais ou menos ano, o fundamental é que ataque os problemas diagnosticados há décadas.

E se o primeiro-ministro de Portugal não tem a força e a capacidade para as levar por diante, então o melhor serviço que pode prestar ao país é devolver a voz ao povo, enquanto guarda o mínimo de dignidade que lhe assiste. 

terça-feira, 26 de novembro de 2013

A esquerda sem vergonha e a triste direita


Seja qual for o tema, a circunstância e o status social, as conversas acabam, invariavelmente, numa espécie de declaração de estado de sítio: caímos num impasse.

Portugal é assim: continuamos a viver entre a resignação e o fatalismo, com mais ou menos verniz de aparente modernidade.

A realidade extravasa a própria dimensão da actual crise. Se retrocedermos aos tempos idos do antes do 25 de Abril, da Primeira República e até ao tempo dos outros ventos do liberalismo e ao fim da monarquia, é possível constatar que, mutatis mutandi, a mediocridade dos protagonistas e o ambiente geral não eram assim tão diferentes.

Será uma doença? Uma questão genética? Não creio. Prefiro considerar que se trata da consequência natural de uma determinada estrutura instalada, há muitas e muitas décadas, que continua a ser alimentada por uma organização constitucional, política, económica, social e religiosa que se especializou em acolher a mudança, de tempos a tempos, para garantir que tudo fica mais ou menos na mesma.

Não faltam exemplos para comprovar esta inércia que, entre a violência obscurantista e os picos de lirismo patrioteiro, aviva o nosso tradicional e terrível atavismo endógeno.

O país continua esmagado por uma ordem constitucional eloquente que na realidade vale pouco; continua politicamente esborrachado entre uma esquerda sem vergonha e uma triste direita; continua vergado por uma desigualdade desumana e uma ostentação parola; continua a viver sob a capa de uma fé que continua a servir o poder e a quedar-se pelo consolo dos mais fracos.

Os portugueses assistem ao descaramento e ao populismo dos principais responsáveis pelo estado a que o país chegou; o mesmo país é confrontado por uma direita que ganhou o poder e governa com um olho na salvação nacional e o outro nos negócios, não vá o diabo tecê-las, com mais ou menos ameaças de serem corridos por quem já nem tem respeito pelos valores democráticos.

Os portugueses já não sabem para onde se virar. E o impasse continua. Lá continua, ano após ano, governo após governo, gerando a insuportável percepção, ainda que infundada, que não há diferença entre a ditadura criminosa e a democracia imperfeita.

Em termos gerais, apesar de dignas e honrosas excepções, nem mesmo a academia, a justiça e o jornalismo parecem ter capacidade para dignificarem os seus valores mais sagrados, limitando-se a fazer a encenação de sempre, o jogo do poder, incapazes de se livrarem do jugo de quem lhes paga mais, alimentando a esperança que tudo pode mudar, mas escondendo que, afinal, são eles que garantem que tudo ficará, mais ou menos, na mesma.

O impasse tem uma origem: os homens de esquerda e de direita de Portugal, os tais que ocupam o poder há décadas, abriram uma guerra fratricida por causa dos seus pequeninos interesses pessoais e partidários, sem o mínimo pejo em sacrificar os seus concidadãos. O mais grave é que,  numa vertigem de sobrevivência, ainda há quem lhes estenda a passadeira vermelha.


Vai ser necessário uma nova geração de políticos e governantes e uma opinião pública mais exigente e menos desinformada para varrer esta gente que mantém o país refém. Aliás, já nem escondem, na sua imensa mesquinhez e venalidade, a falta de convicções, ideias e projectos para o país, limitando-se a fermentar um alegado inimigo e a adoptar uma atitude que não leva, nem a eles nem a nós, a lado nenhum.

sábado, 19 de outubro de 2013

Portugal é assim: fraqueja no momento crucial



Portugal continua a ser o que sempre foi: os poderosos esmagam os mais fracos, os negócios de Estado continuam a parecer negociatas privadas e os abusos confundem-se com a justiça e a segurança.

 No essencial, pouco mudou: o país continua a fraquejar face aos grandes interesses, sejam eles quais forem, corporativos, nacionais ou estrangeiros.

Com a coligação governamental paralisada e com a oposição afundada no populismo, os últimos desenvolvimentos sobre as relações entre Portugal com Angola revelam como a classe governante continua saloia e venal; e como uma opinião pública esclarecida continua a ser uma miragem.

O país continua a viver de farsa em farsa. O processo de lavagem de dinheiro sujo em curso, uma espécie de PREC da globalização, é apresentado, subliminarmente, como se fosse a última tábua de salvação.

A realidade é bem diferente. No caso angolano, seja o dinheiro sujo ou não – matéria que está sob escrutínio da justiça em Portugal e noutros países da União Europeia, bem como nos Estados Unidos da América –, há muito tempo que os investidores angolanos aderiram à fórmula de comprar com o pelo do cão, um expediente que faz as delícias do capitalismo selvagem e das teias da corrupção.

A partir dos primeiros investimentos, sobretudo na banca, este tipo de "salvadores" mais não fazem do que usar os recursos das instituições que controlam, ou que estão em vias de controlar, para garantir financiamentos para novas aquisições, sem gastar um tostão das suas próprias carteiras recheadas, sabe-se lá como e quando.

Numa época em que o país necessita de uma grande lavagem, é caso para dizer que os branqueadores continuam a mandar; num momento em que o país precisa de credibilidade externa, é caso para dizer que continua a valer tudo; por último, quando o país precisa de afirmar a sua respeitabilidade, os órgãos de soberania cedem a interesses difusos e opacos, obviamente em nome de um interesse nacional que só eles conseguem descortinar.

De facto, não há mal-entendido nenhum entre Portugal e Angola. Nem tão-pouco desinformação. Há é falta de dignidade de Estado, de transparência institucional e de respeito pela separação de poderes.

Quando estão em causa os poderosos, sejam angolanos ou não, o mais grave é que a justiça não se dá ao respeito, optando por genuflectir, com mais ou menos suavidade, ora promovendo investigações que não têm fim – ainda que bem intencionadas, mais parecem vulgares simulações –, ora mandando, agora, calar os procuradores do Ministério Público, num gesto cedência e de humilhação pública ímpares.

Talvez, agora, seja mais fácil perceber por que razão Rui Machete, Paula Teixeira da Cruz e Joana Marques Vidal foram nomeados para os altos cargos que (ainda) exercem. Porventura, têm a extraordinária capacidade de paliar, seguindo o exemplo do presidente da República, Aníbal Cavaco Silva, e do primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho.

Depois de tudo o que aconteceu, à vista de todos, continuam em funções, olimpicamente, perante uma comunicação social que, desgraçadamente, trata o assunto como mais um fait divers.

Não é por acaso que, felizmente, há uma maioria cada vez mais indiferente em relação a esta democracia formal, a um Estado tentacular que é mais percepcionado como um poço de corrupção sem fundo do que como um garante da ordem e da protecção dos mais fracos.


No actual cenário de crise, em que Pedro Passos Coelho tem feito tábua rasa dos compromissos assumidos pelo Estado, o seu maior contributo é eclodir com esta espécie de  Estado.