Portugal continua a ser o que
sempre foi: os poderosos esmagam os mais fracos, os negócios de Estado continuam
a parecer negociatas privadas e os abusos confundem-se com a justiça e a segurança.
No essencial, pouco mudou: o país continua a fraquejar
face aos grandes interesses, sejam eles quais forem, corporativos, nacionais ou
estrangeiros.
Com a coligação governamental paralisada
e com a oposição afundada no populismo, os últimos desenvolvimentos sobre as
relações entre Portugal com Angola revelam como a classe governante continua saloia
e venal; e como uma opinião pública esclarecida continua a ser uma miragem.
O país continua a viver de farsa
em farsa. O processo de lavagem de dinheiro sujo em curso, uma espécie de PREC da
globalização, é apresentado, subliminarmente, como se fosse a última tábua de salvação.
A realidade é bem diferente. No
caso angolano, seja o dinheiro sujo ou não – matéria que está sob escrutínio da justiça em Portugal e
noutros países da União Europeia, bem como nos Estados Unidos da América –, há muito tempo que os investidores
angolanos aderiram à fórmula de comprar com o pelo do cão, um expediente que faz
as delícias do capitalismo selvagem e das teias da corrupção.
A partir dos primeiros investimentos,
sobretudo na banca, este tipo de "salvadores" mais não fazem do que
usar os recursos das instituições que controlam, ou que estão em vias de
controlar, para garantir financiamentos para novas aquisições, sem gastar um
tostão das suas próprias carteiras recheadas, sabe-se lá como e quando.
Numa época em que o país necessita
de uma grande lavagem, é caso para dizer que os branqueadores continuam a
mandar; num momento em que o país precisa de credibilidade externa, é caso para
dizer que continua a valer tudo; por último, quando o país precisa de afirmar a
sua respeitabilidade, os órgãos de soberania cedem a interesses difusos e
opacos, obviamente em nome de um interesse nacional que só eles conseguem
descortinar.
De facto, não há mal-entendido
nenhum entre Portugal e Angola. Nem tão-pouco desinformação. Há é falta de dignidade
de Estado, de transparência institucional e de respeito pela separação de
poderes.
Quando estão em causa os
poderosos, sejam angolanos ou não, o mais grave é que a justiça não se dá ao
respeito, optando por genuflectir, com mais ou menos suavidade, ora promovendo investigações
que não têm fim – ainda que bem
intencionadas, mais parecem vulgares simulações –, ora mandando, agora, calar os procuradores do Ministério
Público, num gesto cedência e de humilhação pública ímpares.
Talvez, agora, seja mais fácil perceber
por que razão Rui Machete, Paula Teixeira da Cruz e Joana Marques Vidal foram
nomeados para os altos cargos que (ainda) exercem. Porventura, têm a extraordinária
capacidade de paliar, seguindo o exemplo do presidente da República, Aníbal
Cavaco Silva, e do primeiro-ministro, Pedro Passos Coelho.
Depois de tudo o que aconteceu, à
vista de todos, continuam em funções, olimpicamente, perante uma comunicação
social que, desgraçadamente, trata o assunto como mais um fait divers.
Não é por acaso que, felizmente,
há uma maioria cada vez mais indiferente em relação a esta democracia formal, a
um Estado tentacular que é mais percepcionado como um poço de corrupção sem
fundo do que como um garante da ordem e da protecção dos mais fracos.
No actual cenário de crise, em
que Pedro Passos Coelho tem feito tábua rasa dos compromissos assumidos pelo
Estado, o seu maior contributo é eclodir com esta espécie de Estado.
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