A situação política está a entrar numa nova e perigosa fase
precisamente no momento em que os portugueses começam a dar sinais que já não
suportam mais esta governação da maioria PSD/CDS-PP.
Depois do custe o que custar, o governo de Pedro Passos Coelho
parece ter abraçado a vertigem do vai ou racha.
A conclusão não decorre só do que se passou em frente da
Assembleia da República, no passado dia 14, mas também da radicalização do
discurso à direita e à esquerda, qual tornado imprevisível a varrer a lucidez de quem tem a
obrigação de ultrapassar o excepcional momento de crise.
É preciso dizer com clareza que isto não vai lá com violência, mas
sim com mobilização, pedagogia e transparência, pois os riscos de muscular
ainda mais o discurso e a governação podem ser contraproducentes.
A violência que está em cima da mesa não é só a bastonada sobre cidadãos
indefesos que se manifestaram na última greve geral. Não, essa carga policial é
apenas uma das vertentes da violência que se está a abater sobre os cidadãos, em
que os excessos de meia dúzia de arruaceiros servem de pretexto para uma
exibição indigna de força que só serve para incendiar ainda mais os ânimos.
A violência física pode ser arbitrária, injusta e dolorosa, mas há
outra violência muito mais perigosa. Hoje, é possível começar a entender melhor
o que se está a abater sobre o país, pois está a emergir um padrão de actuação
governamental que é muito mais do que a porrada indiscriminada e a prisão
ilegal de cidadãos.
Quando o poder exibe a força dos cassetetes e atropela a
legalidade, quando se fecha nos gabinetes sem dar explicações ao país, quando
toma decisões opacas para não ter que assumir a verdade, então estamos perante
um problema maior protagonizado por um governo estafado, desacreditado e sem
soluções.
A falta de cultura democrática começa a assumir laivos
aterradores. A arrogância no discurso, por vezes mascarada por ironias
insuportáveis para quem vive tempos de extrema dificuldade, está a raiar os
limites da indecência política.
É assim que se explica que Miguel Relvas continue no governo e a
viajar pelo mundo fora certamente em missões da mais de alta relevância, que
infelizmente ainda ninguém conseguiu explicar.
É assim que Miguel Macedo continua a governar, autorizando cargas
policiais que são elogiadas pelo sistema político e pela corte do costume, sempre
mais interessada em justificar o poder do que em o escrutinar.
É assim que Pedro Passos Coelho renova a confiança em Júlio
Pereira que continua a liderar os serviços de informações depois de varrido para debaixo do tapete o funcionamento das secretas em roda livre.
Há muitos mais exemplos, mas estes três são paradigmáticos. De
facto, quando não há argumentos que expliquem as decisões, as escolhas e as
opções, só resta o silêncio e a força.
Até Vítor Gaspar já percebeu que uma certa flexibilidade, desde
que não comprometa o fundamental, faz parte de uma governação responsável e equilibrada,
como atesta a diminuição da sobretaxa sobre o IRS.
A prepotência e a violência são os argumentos dos fracos, sejam
eles governantes ou manifestantes, que nos vai levar, inevitavelmente, a
eleições antecipadas.
O governo da maioria não tem legitimidade para tudo. E a confiança
dos portugueses não se manifesta apenas nas urnas, de quatro em quatro anos, como,
infelizmente, Pedro Passos Coelho vai ter de compreender, mais cedo do que
tarde, se não arrepiar caminho.