É um início sombrio, envolto em golpes de teatro e várias suspeitas, certamente frustrando as expectativas de uma parte dos eleitores que votaram no PS e da generalidade dos portugueses.
E é muito mais do que um Executivo numeroso, repleto de tachos para os amigos, militantes e simpatizantes de quem tem o poder.
Em suma: é um passo no sentido do regresso ao passado, ainda que sem maioria absoluta, em que os princípios de convivência democrática são vergados pela prepotência e impunidade políticas.
O mais grave é que o XXII governo constitucional mereceu um cheque em branco presidencial no momento de tomada de posse.
E os riscos, mais do que glosados na comunicação social e no que resta de opinião publicada independente, voltam a valer apenas o que valem, ou seja, nada nos tempos que correm.
As nomeações de João Galamba, Antero Luís e Nuno Artur Silva são exemplos paradigmáticos do actual processo de abastardamento democrático.
O secretário de Estado Adjunto do Ambiente é protagonista de um dos negócios de Estado com cambiantes caricatos de que não há memória.
Nem mesmo o eventual inquérito aberto pelo Ministério Público ao negócio do lítio foi suficiente.
Não!
Quem manda é Costa, com Marcelo a sorrir para as câmaras de televisão...
Por sua vez, a participação no Executivo de um magistrado que liderou o SIS e o organismo mais importante da Segurança Interna também não deixa quaisquer dúvidas.
Hoje, tal como ontem, de triste memória, é a confusão entre Política e Segurança, como se fosse necessário recriar uma espécie de cordão sanitário à volta do poder político.
Mas ainda faltava a pérola...
A nomeação de Nuno Artur Silva para a secretaria de Estado do Cinema, Audiovisual e Media traduz a teimosia e a arrogância políticas de António Costa, com Marcelo a continuar a sorrir para as câmaras de televisão.
E nunca é de mais recordar: as críticas decorrem da violação da mais elementar transparência política, e não de qualquer a priori de carácter de quem quer que seja.
De truque em truque, de formalismo em formalismo, os tiques autoritários bem podem servir para a alimentar os senhores do poder, mas tal mina a confiança dos cidadãos.
Who cares?, dizem alguns, contrapondo que o fundamental são os dados macro e estatísticos, as contas mais ou menos certas e a vertigem da modernidade com o lixo debaixo do tapete.
Para quem ainda tinha dúvidas, tudo ficou mais claro...
É o país das elites que temos e merecemos, é a consagração de um bailete ainda mais refinadamente cínico, com Marcelo sempre à espreita de uma qualquer câmara de televisão para continuar a sorrir.
A marca é inconfundível, chancelando a afronta ao bom senso e à ética republicana, a qual, aliás, já nos conduziram ao pântano e ao período mais negro da história da Democracia em que, aliás, António Costa assumiu o lugar de um dos protagonistas.
No arranque da 14ª Legislatura fica cristalino, mais uma vez, todo o descaramento político.
Em que volta a importar tão-só a ilusão de normalidade, em que não cabem os desafios adiados, o desrespeito pelos cidadãos e os esqueletos da República, sejam os cadáveres da Saúde ou as negociatas de Estado, sem esquecer Tancos, entre outros...
Desta vez, António Costa não poderá voltar a dizer candidamente que não sabia de nada, por mais que Marcelo continue a sorrir para as câmaras de televisão.
Vamos assistir aos mesmos erros, abusos e desmandos, outra vez?