O
primeiro-ministro está a cavar um fosso cada vez mais fundo entre o Governo e a
sociedade civil. Por isso, sentiu-se obrigado, no último debate quinzenal na
Assembleia da República, a fazer mais uma declaração extraordinária: «Este
Governo só não concluirá o seu mandato para quatro anos se os partidos que
apoiam o próprio governo não quiserem. Isso não há dúvida, senhor deputado. Não
há dúvida!»
A afirmação
de Pedro Passos Coelho só pode ser entendida como uma fuga em frente, típica de
um líder fragilizado. Mas é mais: é uma atitude de desafio e de
tentativa de menorização institucional do presidente da República, reveladora
de uma cegueira e de um autoritarismo que remetem para outros tempos vividos em
1995 e 2011.
Tal como
aconteceu com os seus antecessores, Pedro Passos Coelho terá a resposta que
merece quando os portugueses o entenderem. Aliás, cada um tem a ponte que
merece!
Mais do que
uma enorme ausência de bom senso político, Pedro Passos Coelho está acantonado
num extremismo, a roçar a atitude de mais um qualquer messias, que o tem
isolado a cada dia que passa.
A questão
não é explicada por um súbito acometimento de delírio ou de autismo político. O país está
perante uma estratégia calculada, que tem muito mais de instrumental do que de
ideológico. Incapaz de manter a imagem de liderança de uma equipa competente, coesa
e limpa, o primeiro-ministro está a apostado no extremar posições que possam
conduzir a uma demissão forçada que lhe abra a porta à vitimização.
À medida
que vão crescendo as especulações sobre a inevitabilidade de constituição de um
governo de iniciativa presidencial ou da possibilidade de eleições legislativas
antecipadas em simultâneo com as próximas autárquicas de Outubro, Pedro Passos Coelho está cada vez mais acossado,
pois sabe que já perdeu qualquer margem de recuperação em relação às trapalhadas
que minaram a governação.
O
primeiro-ministro é visto, actualmente, como parte do problema, depois de
alguns erros clamorosos que conduziram o país para o terreno da instabilidade
política e social. E até pode insistir em proteger Miguel Relvas, em manter políticas
injustas, sacrificando os mais fracos em detrimento dos mais fortes, e em aguentar
mais um chumbo do Tribunal Constitucional. Mas há um limite que não pode ultrapassar:
o tecto de 17% de desemprego que estabeleceu já enquanto primeiro-ministro.
A fasquia que
entendeu afirmar, publicamente, em mais uma declaração politicamente imprudente,
está à beira de ruir, a acreditar no previsível aumento do desemprego em dois
pontos percentuais, em 2013, de acordo com a última previsão do Banco de
Portugal.
A crispação
do ambiente político, o recrudescer da violência verbal no debate público, a
tensão social galopante e a desvalorização do crescimento escandaloso do número
de desempregados, do ritmo excepcional de falências e de várias situações humanas
dramáticas, que ultrapassaram todos os limites, são apenas sinais exteriores do
estado de pré-desagregação do Governo.
A esperança num primeiro-ministro com capacidade para restaurar a credibilidade da governação esfumou-se a um ritmo vertiginoso. E o país está, novamente, em estado de pré-revolta, confrontado com a generalizada perda de confiança no Governo. Nada fazer para mudar esta percepção, não o perceber, ou melhor, não ter a humildade pessoal e política de o reconhecer, é um crime político que os portugueses jamais serão capazes de esquecer, porque vai provocar prejuízos incalculáveis.
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