A razão venceu a demagogia na
última entrevista do primeiro-ministro à RTP.
Com uma serenidade
impressionante, Passos Coelho explicou as medidas anunciadas, desmontando as
críticas que têm atingido um volume tal que, rapidamente, se estão a virar
contra quem as tem proferido.
No entanto, o brilhantismo com
que o primeiro-ministro enfrentou as perguntas dos dois jornalistas, que demonstraram
uma intranquilidade desnecessária, foi suficiente?
Não.
O mal já estava feito. E o erro persistiu,
ao não dar a mão à palmatória, quando não teve coragem de
assumir, claramente, que o anúncio do aumento da Taxa Social Única foi precipitado
pela necessidade de apresentar uma solução de último recurso para evitar qualquer
risco de um eventual chumbo da troika.
Certamente, ao assumir o risco
do falhanço, as críticas teriam chovido de todo o lado, mas teria usufruído dos
benefícios de ter conseguido chamar os portugueses para o lado da emergência
nacional, para o posterior sucesso da quinta avaliação positiva da troika e
para a necessidade de travar o aumento do desemprego a curto prazo.
O resultado de não falar toda a
verdade aos portugueses está aí à vista de todos. Os principais responsáveis
pela crise desabriram em palpites sobre uma medida que, pasme-se, ainda ninguém
sabe como vai ser aplicada, chegando ao delírio de contabilizar quantos
salários os portugueses vão perder por ano.
O disparate repetido à exaustão,
por uma comunicação social que não quis ou não conseguiu escrutinar a
verdadeira motivação do timing do anúncio da medida, resultou numa instabilidade com
repercussões ainda desconhecidas.
Ainda que mantenha a preocupação
em informar os portugueses da gravidade da situação, Pedro Passos Colho ficou,
mais uma vez, a meio caminho do seu indeclinável dever.
A hesitação em assumir as
responsabilidades no falhanço das metas anunciadas, que o deixaria debaixo de
fogo político, abriu as portas aos seus inimigos, a quem ainda não deixou de
sonhar com voos mais altos e, sobretudo, a todos aqueles que estão a ver em
perigo todo o tipo de mordomias que atiraram o país para a dependência de
credores estrangeiros, sejam eles trabalhadores ou patrões, parceiros políticos
ou adversários partidários.
É sempre reconfortante ouvir um
primeiro-ministro reafirmar que ouve as partes, mas que é ele o último
responsável e decisor. Todavia, para governar pela própria cabeça, sem obter
previamente os améns dos senadores, banqueiros, empresários, sindicatos, lobbistas
e intermediários dos grandes interesses, Pedro Passos Coelho não pode dar o
flanco. Tem de apresentar resultados e não pode colocar o governo refém de um
ministro que já devia ter sido demitido há muito tempo, e que, ainda por cima, insiste
em falar do além.
Num momento decisivo para
Portugal, Passos Coelho não tem que se preocupar com as quezílias com
Cavaco Silva, ou com as tentações políticas de Paulo Portas, ou com a
sofreguidão que alguns demonstram em regressar ao poder, ou mesmo com as crises
políticas mais ou menos encenadas.
O maior inimigo do
primeiro-ministro é ele próprio, quando teme ser o que prometeu ser, quando treme no momento de fazer
os mais ricos pagar a crise, quando vacila em enfrentar os lóbis e os grandes
interesses, quando coloca o interesse nacional refém das suas amizades e
clientelas.
A margem de manobra do governo só
estreita quando o primeiro-ministro se distrai do essencial: falar toda a
verdade aos portugueses.