A passagem da época natalícia está cumprida.
O país gastou o que tem e o que não tem numa aparente indiferença a todos os alertas para os tempos difíceis de 2011.
Para bem e para o mal, é cada vez mais evidente que os portugueses deixaram de ouvir governantes, políticos e afins.
Em boa verdade, há muito tempo que já os tinham deixado de escutar, mas agora nem sequer lhes dedicam o suficiente benefício da dúvida.
Será que os portugueses ensandeceram?
Claro que não.
A atitude de novos e velhos está ao nível do discurso oficial da governação e da falta de credibilidade das instituições de regulação e controlo.
É possível ter outra disposição quando o governo aumenta brutalmente a carga fiscal e ao mesmo tempo insiste em projectos faraónicos?
Há outra forma de agir quando o governo desbarata milhões em cimeiras, consultadorias e cerimónias de propaganda enquanto os magistrados têm de poupar nas fotocópias?
Será que esta indiferença em relação ao futuro sombrio mais não é do que a reacção aos sucessivos anúncios governamentais de pazadas de dinheiro do Estado para o BPN, cuja actividade criminosa resultou de anos de falta de efectiva e consequente supervisão do Banco de Portugal e de atenção do Ministério Público?
No limiar de um novo ano, em que o horizonte é repartido entre mais sacrifícios e o mais que provável regresso do FMI, o povo português parece já não ter medo do abismo, aproveitando para viver da melhor forma possível um dia de cada vez.
Nesta espécie de gestão colectiva suave do caos, em que o alheamento é reconfirmado pelas audiências medíocres dos debates entre candidatos presidenciais, até a elite dá sinais de rendição.
Entretanto, passo a passo, medida a medida, declaração a declaração, designadamente a última mensagem de Natal, José Sócrates passa a imagem de perfeita adaptação aos novos tempos, beneficiando da apatia quase generalizada.
Será que José Sócrates vai nascer duas vezes?
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