sexta-feira, 8 de junho de 2012

Os esqueletos no armário


Os discursos positivos surgirm no preciso momento em que o país está a ser varrido por críticas pessimistas sobre a execução orçamental e avassalado por informações que decorrem de progressos nas investigações de casos de polícia que envolvem ex--governantes e os mais poderosos.

Os portugueses têm razão para estarem estarrecidos com os últimos exemplos do estado a que o país chegou: Isaltino Morais, de recurso em recurso, vai escapando à prisão decretada pelos tribunais; a teimosia da indicação de Conde Rodrigues para o Tribunal Constitucional, por parte do PS, choca com a descoberta de que o juiz tem pouco mais de um ano de experiência como magistrado; os testemunhos em audiências de julgamento de dois dos processos judiciais que envolvem o nome de José Sócrates (licenciatura na Universidade Independente e Freeport) têm reforçado a percepção de que o ex-primeiro-ministro foi protegido pelas cúpulas da justiça; as espectaculares buscas policiais a departamentos do governo regional da Madeira, por suspeita de encobrimento de dívidas, antecipam as marcas da confusão na administração; os progressos das investigações relativas à actividade das secretas, que apontam para indícios de corrupção entre o mundo dos espiões e dos empresários, corroboram a falta de liderança e fiscalização naqueles serviços de informações; por último, e como corolário deste estado infame a que chegámos, fica a notícia da disponibilidade para a constituição da X comissão parlamentar de inquérito a Camarate, após ter sido divulgada a extraordinária declaração escrita de Francisco Farinha Simões em que assume a autoria do atentado que vitimou Francisco Sá Carneiro, Adelino Amaro da Costa e mais cinco passageiros do avião que caiu no dia 4 de Dezembro de 1980 e envolve explicitamente os serviços secretos norte-americanos e diversos nomes de personalidades, entre as quais se destacam Francisco Pinto Balsemão, ex-primeiro-ministro do VII e VIII governos constitucionais, e Frank Carlucci, ex-embaixador dos EUA em Portugal, entre outros.

Na sequência destas notícias que têm sacudido o país e de alguns temores mais ou menos expressos em relação ao risco de desagregação do Estado em tempos de crise económica e social, os titulares de dois órgãos de soberania sentiram a obrigação de vir a terreiro para tentar salvar o que resta da credibilidade do país, da classe política e do Estado de direito.

Afinal, em política não há coincidências. O Presidente da República e o primeiro-ministro visaram acalmar a indignação crescente dos portugueses em relação à impunidade. Mas os apelos pomposos, as reformas anunciadas e as promessas de um amanhã melhor não disfarçam a realidade subterrânea que tem escapado ao escrutínio das entidades competentes.

A imagem do país não muda com a propaganda voluntariosa, mas sim com a cara lavada de que falava Miguel Portas, com a disponibilidade colectiva para enfrentar, de uma vez por todas, os esqueletos que o Estado tem mantido escondidos nos armários.

Portugal está a mexer, mas ainda estamos a meio caminho de poder garantir que tudo não vai ficar na mesma.

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