A política de Estado portuguesa em relação aos assuntos e negócios angolanos está acima da Lei?
Esta é a grande questão depois do momento actual das relações luso-angolanas estar a ser marcado pela acção da Justiça angolana em relação a Isabel dos Santos.
Enquanto começa a ser evidente que os angolanos estão determinados em tratar dos seus, em Portugal continua o silêncio sobre os cúmplices de Isabel dos Santos, desde empresários a advogados famosos.
Até quando?
O presidente da República ou o primeiro-ministro bem podem determinar, nas costas do povo, que as relações entre Portugal e Angola estão acima de tudo e de todos, mas tal só é possível se o escrutínio não for levado a cabo por quem tem o direito e o dever de o fazer.
Não bastam palavras vãs e as tardias promessas de escrutínio do Banco de Portugal e da CMVM.
De momento, o silêncio do Ministério Público até pode ser compreensível, pois as investigações não podem andar na praça pública, mas o precedente criado com o caso de Manuel Vicente também não deixa ninguém descansado quanto à determinação e independência do titular da acção penal.
E o episódio do afastamento de Joana Marques Vidal é um exemplo que também não abona nada a República.
O silêncio dos partidos políticos portugueses, da esquerda à direita, é um triste pronúncio de mais uma tentativa de varrer o lixo para debaixo do tapete.
Por sua vez, as reacções da filha de José Eduardo dos Santos, bem como os caldos de galinha prontamente afirmados por Manuel Vicente, apenas dão um tom mais colorido ao embaraço pesado e crescente sobre a abertura da porta aos dinheiros angolanos.
Aliás, as ameaças públicas de personalidades acossadas é uma constante de países de Terceiro Mundo, como se fosse possível do alto da impunidade condicionar a descoberta da verdade.
E não se julgue que é apenas Isabel dos Santos a fazê-lo.
Por estas bandas não faltam outros exemplos, desde Vítor Constâncio a José Sócrates, só para recordar dois mais recentes.
No início de 2020, as instituições democráticas voltam a dar provas de enorme fraqueza, colocando-se numa posição de dependência da acção e determinação de uma cidadania forte para um esclarecimento cabal da questão de fundo: qual é a origem dos capitais provenientes de Angola?