sábado, 16 de maio de 2009

Alegre: mais do mesmo

Depois de alimentar meses a fio a especulação sobre a criação de um novo partido político, Manuel Alegre veio a terreiro, finalmente, anunciar o seu futuro político.

Sem qualquer surpresa, o 'barão' socialista anunciou que não integrará as listas do PS para as próximas eleições legislativas. E, também sem qualquer surpresa, confirmou que se mantém no partido em que sempre militou.

A opção de Manuel Alegre é digna. Até pode ser encarada como um exemplo para os que continuam agarrados aos 'cadeirões' partidários e do poder, seja por não saberem fazer mais nada, seja para garantir uma qualquer imunidade preventiva.

Assim, por que razão a decisão de Manuel Alegre é uma fraude política?

Em primeiro lugar, por ser mais do mesmo.
Manuel Alegre há anos que promete uma ruptura com os PS, que fica sempre na gaveta depois de umas conversas com o líder, seja ele qual for.

Em segundo lugar, por colocar os interesses do PS à frente dos interesses do país.
Manuel Alegre sempre o fez, por esta ou aquela razão, por esta ou aquela fidelidade, deixando transparecer que está disponível para engolir um qualquer 'Sócrates' quando o partido está confortavelmente instalado no poder, em nome de uma fidelidade cega.

Ora, um homem livre não se pode dar ao luxo de confundir carreirismo e desprendimento, lealdade e probidade, táctica e estratégia.

Para quem criou tanta expectativa em relação a uma abertura do espectro partidário, ancilosado num Bloco Central de interesses asfixiante e a roçar o criminoso, Manuel Alegre esgotou qualquer capital de credibilidade política na reedificação do regime democrático.

De igual modo, a expectativa de ganhar espaço e apoio político para uma candidatura presidencial deixou de fazer qualquer sentido.

Haverá algum português, de esquerda ou de direita, que vote num candidato presidencial que seja capaz de sacrificar os interesses do país a um qualquer interesse partidário?

domingo, 19 de abril de 2009

O truque (im)possível

A aproximação dos três actos eleitorais – europeias, legislativas e autárquicas –, está a fazer renascer o 'fantasma' da Democracia: o conflito entre São Bento e Belém.

Em vez de aceitar uma tensão institucional, consagrada constitucionalmente, os governos fracos, e em dificuldades pré-eleitorais, recorrem ao argumento da instabilidade quando se abeiram do veredicto popular.

Hoje, em 2009, o 'filme' encaminha-se para o epílogo conhecido, como se de um déjà vu se tratasse.

Cada vez mais alarmado com o veredicto popular, o primeiro-ministro (ainda) em exercício tem feito tudo para fazer deflagrar um conflito com o Presidente da República.

Os pretextos são variados, desde o estatuto dos Açores, aos vetos políticos, acabando, agora, num remoque público inqualificável a um discurso importante de Aníbal Cavaco Silva.

A coabitação entre o chefe do governo e a presidência da República deveria merecer mais respeito político.

De facto, a introdução de uma crise institucional não serve os propósitos do país, apenas pode servir a quem está desesperado, inseguro de uma governação marcada por erros grosseiros cometidos nos últimos quatro anos.

Não é por acaso que, aqui e ali, se começa a falar em eleições antecipadas. Pasme-se! Eleições antecipadas num ano em que os portugueses são chamados a votar por três vezes...

Os estrategas, conselheiros e consultores do governo – aqueles que permanecem fiéis e ainda restam à volta do líder –, não ignoram que a hipótese é um truque impossível.

Então, por que razão insistem no braço-de-ferro?

Por acreditarem que a basta a ideia se consolidar para se tornar num truque possível.

O objectivo é levantar a dúvida em relação aos entraves à governação para justificar os falhanços clamorosos que se advinham nas reformas estruturais e nos objectivos macroeconómicos que se 'venderam' aos portugueses de uma forma obscena.

José Sócrates tem os dias contados. Já nem pode antecipar, nem adiar as dificuldades que vai ter de enfrentar.

Com mais ou menos orgulho, não há truque (im)possível que lhe valha.



sábado, 28 de março de 2009

Teste à Democracia

Os casos Freeport e BPN estão a abalar o normal funcionamento do regime.

Enquanto a corte do costume vai esperneando à medida que a investigação jornalística avança, todos os olhares se viram para o que anda a fazer a Justiça em relação a estes dois processos e para o que vai fazer o Presidente da República.

Apesar de estar fragilizada por uma legislação manhosa e insuficiente, por um caos organizacional e por insucessos estrondosos, há uma crescente expectativa em relação às respectivas investigações criminais em curso.

Já sabemos que a Justiça é capaz de perseguir os cidadãos anónimos, os presidentes de Câmara e até os dirigentes de futebol. Agora vamos ficar a saber, pela primeira vez, se a Justiça é capaz de enfrentar um primeiro-ministro e um Conselheiro de Estado, ambos em exercício de funções.

O Presidente Richard Nixon, nos Estados Unidos, e o primeiro-ministro Ehud Olmert, em Israel, entre muitos outros exemplos, foram investigados e tiveram que abandonar as suas funções por força da acção da Justiça.

Na verdade, tal só aconteceu também por força da acção da Comunicação Social e da opinião pública, que se colocaram ao lado dos agentes da Justiça.

Em Portugal, os sinais de desconforto da sociedade civil são evidentes. A imprensa está a fazer o que lhe compete. Só falta a Justiça fazer o seu trabalho.

Apesar dos deputados da Assembleia da República estarem a desenvolver um trabalho meritório em relação ao caso BPN, enquanto optaram por um silêncio envergonhado em relação ao caso Freeport, sejamos claros: José Sócrates e Manuel Dias Loureiro têm o direito à presunção de inocência, mas já deveriam ter tido a dignidade política de se demitirem há muito tempo.

José Sócrates e Manuel Dias Loureiro passaram a ser um fardo demasiado pesado para um país que já tem às costas uma das crises mais graves de sempre.

O Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva, não pode fugir às suas responsabilidades constitucionais.

domingo, 1 de março de 2009

Os 'negócios' socialistas

O XVI congresso do Partido Socialista fica para a história.

A reunião que elegeu, novamente, José Sócrates, decorreu com toda a normalidade no meio da maior anormalidade de que há memória desde o 25 de Abril.

Nunca como hoje, o líder e o partido do poder estiveram sob os holofotes de tanta suspeição de corrupção, tráfico de influências e nepotismo.

A lista de negociatas, que atingiu directa ou indirectamente José Sócrates, o partido e o governo, não pára de crescer.

A sucessão de casos impressiona os portugueses e a comunicação social que (ainda) se espantam com as novidades sobre os processos da Cova da Beira, Heron Castilho, Freeport, BCP, BPN, BPP, aviões Airbus, compra de acções a Manuel Fino, entre outras 'operações' cujos contornos estão longe de estar esclarecidos.

Face a este interminável manto que cobre o regime e alguns dos seus principais actores, e face a uma Justiça atolada na falta de credibilidade, o XVI congresso do PS permitiu uma clarificação.

Por um lado, José Sócrates, cada vez mais ferido e acossado, limitou-se a gerir a distribuição de lugares e a responsabilizar os poderes ocultos e a comunicação social por uma eventual campanha negra em curso; por outro, Ana Gomes pediu legislação para punir, clara e inequivocamente, o enriquecimento ilícito.

Face a um ambiente podre, a eurodeputada socialista ainda deixou uma frase certeira: «Os portugueses sabem que as pessoas sérias não têm dificuldade em fazer prova de onde vem o seu dinheiro».

O apelo à transparência pode ter sido isolado, mas ficou registado que ainda há um entendimento limpo da política e da governação.

Os governantes têm de estar acima de qualquer suspeita. É a disponibilidade para prestar contas e para aceitar o escrutínio dos cidadãos e dos jornalistas que lhes confere uma respeitabilidade ímpar.

O XVI congresso do PS fica para a história pela consagração da inversão do principal paradigma democrático, sem qualquer sinal de sobressalto cívico da generalidade dos seus militantes.

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Isso não interessa nada?

Aníbal Cavaco Silva anda preocupado com os escândalos que marcaram a agenda mediática no último mês.

Mais que uma vez, o presidente da República exortou os portugueses a concentrarem-se no essencial, leia-se a crise e o desemprego.

O presidente tem razão?

Não.

O estado a que chegou o regime deve-se, precisamente, a este tipo de discursos, que apenas servem para esconder a podridão dos fundamentos do regime e a impunidade dos poderosos e influentes.

Em relação ao período em que liderou o Executivo, Aníbal Cavaco Silva revela coerência ao fazer, hoje, tais afirmações, mas o país sai beneficiado?

Não.

O discurso do tipo 'isso não interessa nada' apenas tem servido para abafar escândalos incomensuráveis, entre os quais se destaca o processo de privatizações da banca nacionalizada.

Não é por isso de estranhar que os casos Champalimaud e Totta tenham sido seguidos dez anos depois pelos escândalos do BCP, BPN e BPP.

Não é por acaso que o caos na Justiça chegou ao absurdo, para não dizer mais, de começar a ouvir suspeitos (que não eram suspeitos há um par de semanas) sete anos depois do licenciamento do Freeport.

Também não é por acaso que Manuel Dias Loureiro mente numa Comissão Parlamentar de Inquérito e nada acontece, a não ser uma série de lamúrias que insultam a inteligência de cada um dos portugueses.

O presidente da República é soberano para fazer os apelos que entender.

Os portugueses também são soberanos para responsabilizar Aníbal Cavaco Silva pelo estado a que chegámos.

Seguramente, não é o único responsável, pois muitos dos outros governantes, desde o 25 de Abril, alguns deles até condecorados pela República, merecem partilhar este (triste) pódio.

Pior do que esconder a realidade, só mesmo contribuir, por acção ou omissão, para que a corrupção, o tráfico de influências e o nepotismo floresçam, condenando os portugueses ao subdesenvolvimento crónico.

A História fará Justiça.

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Freeport: os erros da imprensa

A investigação jornalística não está liquidada, mas está cada vez mais à mercê de incompetentes receosos de incomodar o poder.

Foi preciso sentir a crise, que enfraqueceu o primeiro-ministro, pelo menos nas ruas, para as páginas dos jornais se encherem, subitamente, de notícias e artigos de opinião sobre um caso típico de corrupção que envolve o nome de José Sócrates.

Uns explicam a coincidência com a acção dos «poderes ocultos», – esses lá sabem do que falam» .

Outros explicam o sucedido com os desenvolvimentos da entrevista de Júlio Monteiro, ao semanário «Sol», e com os dados da carta rogatória das autoridades inglesas.

A última explicação é verdadeira, mas é tíbia e pouco rigorosa.

Céleres a acusar os poderes político e judicial a propósito do arrastamento das investigações, a generalidade da Imprensa ainda não fez o seu mea culpa: nos últimos anos, o que fizeram os principais órgãos de comunicação social para apurar o que se passou no 'Caso Freeport'?

Nada ou quase nada.

À excepção de investigações que foram barradas à partida, a generalidade das chefias editoriais não tiveram capacidade para mobilizar esforços para escrutinar um primeiro-ministro com uma maioria absoluta.

O calculismo até pode recompensar, mas não serve o jornalismo.

As direcções editoriais, as administrações e os 'patrões' da comunicação social, entre os quais se encontram os 'boys' do costume, têm de assumir as suas responsabilidades em relação ao tratamento noticioso do 'Caso Freeport'.

E têm a obrigação de explicar por que razão, aparentemente, geriram o timing de investigações do mais relevante interesse público.

Nestes momentos, mais do que a qualidade do jornalismo, fica a amarga sensação de que a imprensa não cumpriu, cabalmente, o papel de escrutínio que lhe compete e que sempre foi premiado pelos leitores quando é frontal, sério e limpo.

Face a este silêncio envergonhado de quem já perdeu a noção da autocrítica, ganham força as estratégias de vitimização e as teses oportunistas, entre outras manobras e idiotices.

Eis um exemplo, mais um, que deveria fazer pensar quem trabalha e está com uma comunicação social livre e responsável.

sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Freeport: a declaração que falta

O primeiro-ministro de Portugal pode não ser suspeito para a Justiça portuguesa, mas já não escapa à suspeição da opinião pública.

Desde o momento em que o Freeport regressou aos jornais, rádios e televisões – em que se encontram alguns que o tentaram abafar noutros momentos –, José Sócrates desatou a reagir precipitadamente, valorizando mediaticamente o que ele próprio veio agora afirmar como uma obra de «poderes ocultos».

Os principais 'patrões' da Comunicação Social agradecem, com as vendas a subir. Mas tal estratégia, que mais parece um pingue-pongue entre indícios e factos suspeitos e declarações de fé, beneficia José Sócrates?

Creio que não.

O direito inalienável à indignação e à presunção de inocência não se compaginam com múltiplas declarações emocionadas que relevam, inevitavelmente, omissões e contradições que reforçam todas as suspeições.

O primeiro-ministro de Portugal está refém de formalismos processuais. O mais grave é que tem usado o seu poder institucional para tentar minimizar os estragos, o que lhe valeu uma severa repreensão pública da parte de António Cluny, que chamou à atenção para as subtis interferências sobre a investigação.

Aos olhos da opinião pública, a estratégia de defesa escolhida é mais a de um culpado do que a de um inocente.

Bastaria uma singela declaração para esvaziar todas as suspeitas: permitir a investigação das suas contas bancárias e apelar à família para disponibilizar a informação sobre o património amealhado nos últimos anos.

Assim, sim. Estaríamos perante a defesa de um inocente que age em consequência.

José Sócrates estaria a fazer uma favor a si próprio, à Democracia e, sobretudo, à Justiça, que se está a afundar no pântano, no tal pântano que António Guterres invocou há sete anos para se demitir.

O processo Freeport já 'matou' politicamente José Sócrates. A culpa não é da comunicação social. É do próprio José Sócrates que tudo está a fazer para consumar um suicídio político.

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

A primeira medida: Guantánamo




O quadragésimo quarto Presidente dos Estados Unidos da América tem o mundo a seus pés. Não pela força do medo e das armas, mas pela força das ideias e da esperança.

Barack Obama é mais do que uma realidade confirmada. É a prova que as Democracias continuam a ter a vitalidade para assumir os vectores da civilização e a capacidade para gerar movimentos capazes de combater a arrogância, a ganância e o arbítrio.

O discurso de tomada de posse não deixou quaisquer dúvidas, mesmo para quem, precipitadamente, começou a duvidar muito cedo de um político que já marcou o século XXI.

As palavras simples, sublinhadas por uma grande simbolismo histórico, que apelaram aos valores, à transparência e à responsabilidade, demonstraram a coerência de quem fez uma campanha eleitoral virada para o cidadão, o mundo e o futuro.

Nem as questões protocolares impediram as críticas subtis, mas veementes, em relação à anterior Administração, deixando a marca da diferença em relação a uma pseudo governação em que os interesses pessoais e empresariais muitas vezes se confundiram com pretensos desígnios nacionais.

Barack Obama é diferente.

A assunção da diferença ficou patente na primeira medida da sua Administração: a suspensão dos processos judiciais por terrorismo em Guantánamo.

O espírito da nova Administração não poderia ter sido honrado de melhor forma.

Quanto maior for a diferença entre a actual Administração e a anterior, que deixou o mundo à beira do caos, com oito anos de governação desastrosa, para não dizer criminosa, em alguns casos, mais Barack Obama merecerá o apoio dos seus concidadãos e o respeito dos povos de todo o mundo.

Quem se propõe vencer pela força das ideias, não pode vacilar. Pode errar, mas nunca pode ceder perante interesses difusos.

O primeiro sinal está dado. A prioridade assumida merece aplauso e respeito. Todavia, não se julgue que vai ser fácil vencer esta batalha pela dignidade humana e Direitos Humanos.

A empreitada ainda está longe de ser cumprida. Seguramente, só teremos a certeza de que Barack Obama está no bom caminho quando aqueles que deram cobertura e tentaram abafar os voos da CIA e as prisões de Guantánamo e Abu Ghraib começarem a acreditar que a América mudou.

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

As guerras não iludem

A pouco menos de um ano das eleições Legislativas, o governo de maioria socialista regressou à táctica do início do mandato.

Em pleno período recessivo, que não foi capaz de antecipar e prevenir, mas vai ter que assumir, José Sócrates regressou à derrapagem do défice, ao crescimento anormal da dívida pública e ao pretenso combate a sectores e classes profissionais.

Entretanto, os banqueiros e alguns grandes empresários receberam as garantias necessárias para disfarçar uma gestão ruinosa, e até, por vezes, criminosa.

Pacificada a super estrutura, o chefe do governo ganhou espaço para tentar consolidar uma imagem de credibilidade e autoridade.

A consagração de uma determinada estratégia de afrontamento, em que o interesse geral tem sucumbido a uma táctica marcada por insondáveis interesses partidários, recebeu uma lufada de ar fresco, a propósito do estatuto dos Açores.

Por muita habilidosa que ainda possa vir a ser a performance de José Sócrates, nomeadamente em relação ao conflito institucional com Cavaco Silva, a receita está comprovadamente gasta: o pretenso exercício de combate a determinadas corporações (juízes, procuradores, advogados, jornalistas, professores, médicos, associações e sindicatos) não resultou em nenhuma reforma ou melhoria substancial.

Os evidentes sinais de desgaste da maioria obrigaram a avançar com mais medidas, nomeadamente o esbanjamento de recursos e de apoios avulsos (dádivas folclóricas aos funcionários públicos), que, sinceramente, mais parecem medidas eleitoralistas desesperadas.

No próximo dia 11 de Outubro de 2009 (o meu palpite para a data das Legislativas), está em causa muito mais do que o futuro político de José Sócrates.

Um governo que confunde a maioria absoluta com o autoritarismo, que usa e abusa da propaganda, com um descaramento político nunca visto, para apregoar o crescimento ou para cavalgar a crise, só pode merecer uma forte sanção eleitoral.

A atribuição de responsabilidades ao Executivo no agravamento da situação económica, financeira e social já anda na rua, de boca em boca, tendo ultrapassado a própria opinião publicada.

Seja qual for a dimensão da 'máquina' que José Sócrates criou nos últimos anos, os portugueses não vão cair no logro político. Nem que a cabeça da Oposição lhes apareça, graciosa e repetidamente, servida numa qualquer bandeja de prata.