sábado, 2 de fevereiro de 2013

Portugal: o país das omissões



A nomeação de Franquelim Alves é mais uma prova da vulnerabilidade do regime democrático. A escolha de um gestor que esteve envolvido no escândalo SLN/BPN ultrapassa o admissível em qualquer país moderno e civilizado. Aliás, o embaraço na maioria é tal que até Nuno Melo, do CDS-PP, já o admitiu publicamente.

A opção do primeiro-ministro já não surpreende, tendo em conta a sua reiterada falta de cultura democrática, amplamente demonstrada por diversos casos e pela permanência de Miguel Relvas no Governo; de igual forma, também ninguém ousaria esperar que o presidente da República pusesse um travão a este escândalo, pelas razões que são públicas e notórias.

A crise que está a montante da bancarrota chegou a um tal ponto que os líderes de dois órgãos de soberania já nem demonstram prudência em evitar pisar o risco do descaramento político e institucional; de igual modo, alguns socialistas responsáveis pelo descalabro até já se sentem suficientemente confiantes para tentarem influenciar a disputa pelo controlo do PS.

O país não pode ficar indiferente à tentativa politicamente desprezível de branqueamento, seja ele qual for, como se fosse possível separar o trigo do joio no seio de um qualquer lamaçal de fraudes, vigaristas e oportunistas.

Enquanto os portugueses continuam a pagar os desvarios de uma certa casta, com ligações ao mais alto nível do Estado, habituada a ser protegida pelos mais diversos poderes, os últimos sinais apenas confirmam que a impunidade continua a reinar.

Se o Governo já estava moribundo, a partir de agora deixou de ter qualquer hipótese de sobrevivência, com a agravante de colocar alguns dos seus elementos, com um passado profissional a defender, perante uma situação profundamente desconfortável.

Portugal continua a ser o país de todas as omissões. O fechar os olhos e o fazer de conta são atitudes que atravessam transversalmente o poder e a sociedade. E estão de tal forma arraigados que já ninguém se dá ao trabalho de enxergar o atoleiro em que o país está transformado.

Pedro Passos Coelho continua a rasgar as promessas que fez aos portugueses. E está a contribuir para reforçar o quadro dantesco que herdou: um político só tem futuro no partido se fizer de conta que não vê a corrupção e o tráfico de influências; um deputado só pode manter o seu lugar se obedecer cegamente à disciplina partidária; um magistrado tem de estar atento às ordens subliminares do poder político para não ir parar a uma qualquer comarca do interior; um empresário tem de se adaptar à maioria no poder para aspirar a beneficiar de apoios, subsídios e créditos; e até um jornalista tem de ter atenção, pois há dúvidas sobre quem são os verdadeiros patrões da comunicação social.

A solução não passa por heróis. Nem por respostas extremistas, violentas ou demagógicas. Nem tão-pouco pelo regresso ao passado ou a mais e mais maladas de dinheiro sujo para acorrer às dificuldades de curto prazo.

O país tem de mudar de atitude e revelar disponibilidade para poder enfrentar um Governo que não é respeitado e que já nem se dá ao respeito.

Enquanto os portugueses não se indignarem, o país continuará a estar entregue aos que calam e comem; aos que nunca meteram um tostão ao bolso, mas fecham sempre os olhos em relação ao que se passa ao seu lado; em suma, aos que continuam a invocar o formalismo para manter as aparências e garantir os privilégios.

Os que nunca se calaram e continuam a resistir têm de redobrar esforços para romper com este círculo vicioso infernal.



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