sábado, 5 de dezembro de 2009

Comunicação terrorista

A informação tornou-se numa selva.

O tal "sistema", que impera nos bastidores, saltou para a ribalta de uma forma cristalina.

Ninguém ignora que os negócios com o Estado se transformaram num imenso mar condicionante da agenda mediática, arrastando na rede as empresas de comunicação, directores-gerais, directores de informação, chefias editoriais e jornalistas.

Hoje, ninguém tem dúvidas que existe uma mão (in)visível do governo que põe e dispõe nos media, castigando aqueles que publicam notícias desfavoráveis, como revelou à saciedade o affaire TVI e o afastamento de Manuela Moura Guedes, entre outros.

Mais grave ainda, e também na linha da intervenção estatal, é o novo padrão de comunicação governamental, em que a promoção da informação e contra-informação passou a um patamar tipicamente terrorista.

Depois do dossiê da vigilância à presidência da República, que marcou a última campanha eleitoral, eis que o caso "Face Oculta" deu origem a uma reacção governamental que passou pela acusação pública de «espionagem política».

Enquanto a vara vai e vem, minimizam-se os estragos, passando de algoz a vítima, sempre na esperança de que a vergonha caia rapidamente no esquecimento.

Tal como a propaganda, este tipo de estratégia de comunicação tem os dias contados, aliás, pela sua própria insustentabilidade racional.

O grande problema é que as suas consequências têm tendência a perdurar no tempo, minando a réstia de credibilidade que as instituições ainda têm junto dos cidadãos.



domingo, 15 de novembro de 2009

Fernando Pinto Monteiro a mais


No dia 28 de Outubro foi dado um passo no sentido da regeneração de um Estado associado à alta corrupção.

Dezoito dias depois das primeiras buscas da operação "Face Oculta", Fernando Pinto Monteiro passou a ser parte do problema.

Desde logo, começa a ser pouco compreensível que o procurador-geral da República tenha metido na gaveta – mais uma vez! – um caso de Estado da maior sensibilidade: as conversas de Armando Vara com José Sócrates.

Fernando Pinto Monteiro continua a revelar incapacidade para lidar com as investigações que envolvem governantes e poderosos.

Basta atentar que após as declarações politicamente destemperadas do chefe do governo – em relação a um caso em que o plano pessoal mais uma vez se confundiu com o plano de Estado – Fernando Pinto Monteiro só precisou de 24 horas para fazer o que não tinha conseguido fazer durante meses: um esclarecimento rigoroso.

Mais incómodo ainda é que o esclarecimento, participado minutos antes do jogo de Portugal com a Bósnia, só surgiu depois da manchete do "Correio da Manhã": «Sócrates suspeito de crime grave – Atentado contra o Estado de Direito – Conclusão do Ministério Público de Aveiro aponta para crime que prevê pena de prisão até oito anos de prisão. Em causa, segundo magistrados, está a manipulação da comunicação social».

Agora, ao prometer uma decisão «até ao fim da próxima semana», fica a sensação que o procurador-geral da República está a preparar a opinião pública para a eventual destruição das escutas, não conseguindo evitar a percepção de que anda a reboque das exigências do primeiro-ministro e das manchetes dos jornais, qual subordinado reverente e atormentado.

Como se não fosse suficiente, Fernando Pinto Monteiro ainda não reagiu ao ataque de um "aparatchik" de segunda linha do PS, que caracterizou uma investigação criminal da maior relevância para o país como «espionagem política».

Fernando Pinto Monteiro está a mais. E já deixou de ser uma parte da solução para o imbróglio que ajudou a alimentar na opinião pública.

domingo, 8 de novembro de 2009

Corrupção: moral ou justiça social?

Os indícios de corrupção alargada ao mais alto nível do Estado estão aí para quem os quiser ver e escrutinar.

Nos últimos trinta anos de Democracia, governos de esquerda e de direita estiveram sob a mira criminal e debaixo do escrutínio dos media.

Depois dos sucessivos casos que saltaram para a ribalta pública, bem como dos sinais de alarme escarrapachados nos relatórios de organizações internacionais, o poder político continua impune e indiferente, apesar das constantes palavras vãs e mansas.

A realidade é o que é, mas ninguém pode ficar indiferente à tentativa de desvalorização da investigação criminal que continua a fazer, lentamente, um caminho infame.

Em vez de responsabilizar os sucessivos governos que têm o poder de legislar e de exigir responsabilidades, aqui e ali, sobretudo quando os escândalos chegam à opinião pública, surgem imediatamente os ataques aos investigadores criminais e magistrados.

Normalmente, e apesar de existirem alguns fundamentos para esta avaliação, a verdade é que quem tão selectivamente aponta o dedo a quem combate a corrupção na primeira linha não tem o mesmo critério na exigência ao governo de leis claras e atribuição de meios adequados para responder à sofisticação do crime de 'colarinho branco'.

Com o desenvolvimento da operação "Face Oculta", a actualidade revelou um novo e surpreendente patamar de debate, que passa por reduzir o combate à corrupção a uma mera questão de moralização do sistema, supostamente levada a cabo por heróis imbuídos de um espírito messiânico.

Ora, o combate à corrupção não é uma questão de moralidade e de coragem, é um caso de justiça social, de perseguir quem rouba o dinheiro do bolso dos outros.

Que não haja qualquer confusão: há uma diferença abissal entre pugnar por mais justiça social, com mais solidariedade e menos corrupção, e pactuar, quiçá promover a gritante promiscuidade e tráfico de influências que estão na origem da corrupção.

É uma questão de cultura e de civilização.

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

O risco de instabilidade

Imediatamente a seguir à tomada de posse do XVIII governo constitucional, liderado por José Sócrates, o regime desceu ao nível do lixo e da sucata.

Novamente, a corrupção, o tráfico de influências e o nepotismo surgiram em todo o esplendor, com a revelação dos primeiros detalhes da operação policial – "Face Oculta".

Ainda antes de enterrar os escândalos financeiros dos últimos anos, que alimentaram todas as suspeições ao mais alto nível do Estado, o novo ciclo político ficou desde já marcado por novas suspeições, tão sujas quanto a matéria prima que alimentou as negociatas e as luvas pagas à custa dos contribuintes.

Tal como aconteceu com o 'cavaquismo', o "Estado Rosa" de José Sócrates apodrece, lentamente, à medida que chegam ao conhecimento público os indícios de enriquecimento ilícito de alguns dos seus mais ilustres e proeminentes pares.

Depois de um ciclo eleitoral extenuante, em que os portugueses foram chamados a eleger os eurodeputados, o governo e os autarcas, chegou a hora de perguntar: ainda há esperança na mudança?

A resposta colectiva não se forma de um dia para o outro, nem ninguém se pode arrogar o direito de a avançar antes do tempo.

Todavia, começa a ser evidente que o futuro do segundo governo de José Sócrates vai depender mais da capacidade de regeneração do Estado do que da implementação desta ou daquela política governamental.

E que não haja ilusões: Com a oposição parlamentar demasiado comprometida com o sistema e com Aníbal Cavaco Silva ferido de morte, é cada vez mais evidente que a mudança a curto prazo só pode passar por um saneamento do poder, pois a crise económica e financeira estão instaladas e para durar por um bom par de anos.

Como nunca no passado, o risco de instabilidade governativa depende da crescente tomada de consciência do estado a que chegou a República.

sábado, 3 de outubro de 2009

Rio de sonho



Os 'cariocas' vão organizar as olimpíadas de 2016.

À primeira vista, não há ninguém no mundo que possa ficar triste com tal vitória, nem mesmo os responsáveis das candidaturas derrotadas de Chicago, Londres e Madrid.

Os que já puseram o pé na cidade mais bonita do mundo, que ainda poderia ser mais maravilhosa não fora a vergonha festiva das 'favelas', exortaram com o feito de monta.

Além da imediata festa em Copacabana, após o anúncio da escolha do comité olímpico, e a sete anos de distância, importa perguntar: quem vai ganhar com a realização do evento planetário?

Os 'cariocas'? Os brasileiros? O espírito olímpico? A paz entre os povos?

Não!

Os ganhadores serão os bancos, os construtores, as sociedades de advogados e as teias da corrupção que fazem do sétimo país mais rico do mundo uma das sociedades mais pobres e desiguais da América do Sul.

A fabulosa máquina criada para promover este tipo de mega eventos não tem qualquer preocupação com os princípios desportivos e universais. Aliás, não será de estranhar que um dia destes se fale de corrupção e de 'luvas' pagas aos responsáveis pela escolha do Rio de Janeiro, a exemplo do que sucedeu em casos anteriores.

Mais do que a mensagem universalista, de paz e convívio entre nações, a realização dos Jogos Olímpicos há muito que se transformou numa gigantesca máquina de promoção de negócios e regimes, democráticos ou ditatoriais, como a China.

No frenesi da globalização selvagem, os povos vão sucumbindo à ilusão 'patrioteira', magnificamente montada pelas máquinas da propaganda oficial, cada vez mais refinadas nos apelos aos argumentos serôdios.

Infelizmente, o preço a pagar é uma factura para mais tarde recordar, certamente com ignorância, analfabetismo e samba à mistura.

Aliás, basta perguntar aos portugueses qual foi o real benefício da realização da Expo'98 e do Euro 2004, cuja factura ainda está a ser paga pelos contribuintes, hoje, sem que tenha havido apuramento de responsabilidades em todas as trapalhadas e vigarices promovidas à sombra do Estado.

É caso para dizer: o dilema continua a ser sempre o mesmo, de um lado e do outro do Atlântico, seja ao ritmo do fado ou do samba.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Quem tem medo das 'secretas'?

Os serviços de informações passaram a ser uma presença regular nos media, sempre pelas piores razões.

Desde a revolução silenciosa que o governo levou a cabo, a partir de 12 de Março de 2005, nunca tal se tinha visto no Portugal democrático.

As suspeitas de escutas ilegais na Presidência da República aí estão, em todo o seu esplendor, entre muitas outras, para atestar a gravidade da crise que se abateu sobre o regime.

Num dia triste para o jornalismo, em que fontes de informação são estampadas na manchete, as palavras de Aníbal Cavaco Silva, em Cascais, são a prova de que todas as dúvidas são verosímeis, apesar da própria declaração ser quase tão intolerável como o fundamento que a motivou.

E varrer uma situação tão complexa para debaixo do tapete enquanto o país vai a votos é a todos os títulos inacreditável.

Aliás, o sistemático adiamento de um apuramento cabal do que se está a passar nesta matéria apenas tem contribuído para o apodrecimento da Democracia.

A situação não é de hoje, nem de ontem.

Em 2 de Fevereiro de 2006, assinei um artigo, intitulado “A secreta oculta de Sócrates”, que o tempo tem vindo corroborar.

Passados mais de três anos, o que mudou?

Nada!

Os serviços de informações viram reforçados os seus meios e instrumentos de acção, sem o equivalente reforço do efectivo controlo democrático.

Para ser rigoroso apenas uma coisa mudou: o discurso de Francisco Louçã.

A mudança é surpreendente, pelo que impõe uma questão: O que sabe o líder do Bloco de Esquerda para fazer tais afirmações tão categóricas, que contrariam os indícios de vigilâncias e de escutas selvagens que têm vindo a ser denunciadas por jornalistas e até por magistrados?

O silêncio de uns e as piruetas de outros revelam até que ponto o regime está refém de um calculismo sem limites, em que os princípios parecem cair por terra ao sabor das expectativas.

No dia 27 de Setembro de 2009, é caso para perguntar: quem tem medo das 'secretas'?

sábado, 29 de agosto de 2009

PGR está acima da Lei?


Com mais ou menos humor e bandeira hasteada pela calada da noite, Portugal é uma República que pretende viver num Estado de direito.

Não há dúvidas em relação ao regime democrático, apesar das suas imperfeições, mas há incertezas quanto à força da Lei.

O Ministério Público não tem rei. E o procurador-geral da República não se pode comportar com tal.

Fernando Pinto Monteiro nem é monarca, nem é a Lei. Deve obediência à Lei.

Ao recusar, imperialmente, investigar a denúncia da Ana Jorge, ministra da Saúde, sobre os casos de contágio doloso da gripe A, Fernando Pinto Monteiro cavou ainda mais fundo o descrédito.

Mais de que um precedente grave, em que um responsável máximo se arrogou o direito de se substituir à Lei, é o atestado de um padrão de actuação, tristemente confirmado na delonga do anúncio da abertura de um inquérito no dia do acidente na Praia Maria Luísa ou nos ouvidos moucos às suspeitas públicas de escutas e vigilância aos assessores do Presidente da República.

Tal como no passado, o temor da hierarquia do Ministério Público em assumir inequivocamente o seu dever, em investigar implacavelmente os detentores do poder Executivo e os altos quadros da Administração, designadamente quando estão em funções, continua a ser um dos cancros da justiça.

O caso Freeport é, aliás, um dos mais escandalosos exemplos dessa atitude reverencial.

O rol de atrasos, hesitações, incúrias e trapalhadas só contribuem para arrasar ainda mais a credibilidade da justiça.

Salvo raríssimas excepções, como no inquérito ao caso de Santa Maria, nem a opinião unânime sobre o falhanço do sistema deu origem a uma mudança de atitude do topo da hierarquia do Ministério Público.

Não, o povo não é estúpido, quando alguns políticos a contas com a justiça são legitimados pelo voto popular.

É o sinal da desconfiança em relação à Justiça.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

A força do voto

A jornalista São José Almeida assina a manchete do matutino "Público" – «Presidência da República teme estar a ser vigiada».

A notícia caracteriza na perfeição o actual clima institucional, político e social.

Na origem das suspeitas de membros da Casa Civil do Presidente da República estão umas afirmações avulsas de dois destacados militantes socialistas sobre a eventual colaboração de assessores presidenciais na elaboração do programa do PSD.

A denúncia não pode ser desligada da disciplina férrea que tem vigorado em relação a fugas de informação a partir de Belém e até deve de ser entendida no actual quadro de suspeição generalizada.

A crescente tensão entre Belém e São Bento, e o facto do primeiro ministro, José Sócrates, ser o responsável máximo dos serviços de informações, com poder para nomear o secretário-geral do Sistema de Informações da República Portuguesa, ainda torna a situação mais grave.

Infelizmente, não existe razão para a notícia ser uma verdadeira surpresa. Nos últimos quatro anos, a imprensa e os opinion makers têm dado conta do mal-estar crescente em relação ao funcionamento das 'secretas', o que lhes tem permitido escrutinar e duvidar da sua legalidade.

Não sei se José Sócrates e se o seu patrão das 'secretas', Júlio Pereira, se vão sentir ofendidos ou se vão avançar com uma queixa-crime. Ou até se vão exigir provas.

O que sei é que existe na Casa Civil de Aníbal Cavaco Silva quem coloca seriamente a possibilidade do Estado estar a vigiar ilegalmente o Estado para obter informações e vantagens políticas.

Muito mais grave do que a situação orçamental, a crise económica e o desemprego é esta permanente suspeita de que o Estado não garante as liberdades individuais, não respeita a cidadania activa e não castiga os abusos de poder.

Há razões de sobra para ponderar redobradamente o que se está a passar em Portugal, e agir em conformidade no momento de votar no dia 27 de Setembro de 2009.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Erros com perdão

Mário Soares, num artigo de opinião, no Diário de Notícias, aponta baterias a Manuela Ferreira Leite, a propósito da polémica sobre as listas de deputados que vai levar a votos.

O raciocínio do ex-presidente da República é irrepreensível, mas peca por duas leviandades: a primeira, e mais óbvia, é a duplicidade de critérios; a segunda, é a de considerar um erro como irreparável.

Mário Soares não deveria apontar o dedo assim tão facilmente. O seu estatuto de Senador da República não nos apagou a memória.

Se há período da Democracia em que se consolidaram algumas das piores práticas ditas 'democráticas', sem qualquer dúvida que temos de regressar aos períodos em que liderou o governo e se instalou vigilante no Palácio de Belém.

De igual forma, e ainda que sem mácula apontada pela Justiça, o que dizer do seu erro chamado Rui Mateus, cujo livro «Contos Proibidos – Memórias de um PS desconhecido» está agora à beira de um clique na Internet?

Mário Soares ao escrever deve ter confundido o desejo com a realidade.

É verdade que numa democracia consolidada Manuela Ferreira Leite teria perdido as eleições no momento em que apresentou as listas do PSD. Tal e qual como José Sócrates não teria ganho as de 2005 e, com toda a certeza, não se atreveria a ir a votos em 2009.

Em Portugal, não há erros irreparáveis. Ainda não chegamos a tal apuro democrático e civilizacional de que, aliás, o fundador do PS é um exemplo vivo.

Hoje, o estado a que chegou a Justiça, a Educação e a Saúde, a falta de renovação na política e os casos de corrupção de "colarinho branco" são a melhor prova de que há erros que compensaram, e continuam a compensar.

quinta-feira, 30 de julho de 2009

Fuga em frente

O primeiro-ministro de Portugal está de cabeça completamente perdida.

Depois da derrota eleitoral nas eleições europeias, o chefe do governo desatou a disparar em todos os sentidos e a prometer tudo a todos, tentando esquecer um passado de quatro anos em que foi incapaz de cumprir as promessas eleitorais feitas em 2005.

Incapaz de digerir a derrota, e até de se remeter a um silêncio que lhe permitisse uma reflexão sobre os falhanços do governo, José Sócrates, na pele de chefe do governo e de secretário-geral do PS, entrou numa vertigem de iniciativas públicas dignas de uma verdadeira campanha eleitoral.

Sem tempo para pensar, os socialistas estão cada vez mais agarrados a um líder que quer garantir o poder a qualquer custo, dando uma imagem de pânico em relação a uma eventual nova derrota em 27 de Setembro.

Nesta deriva, imposta por uma enorme falta de sentido de Estado e por assessores e consultores incapazes de o aconselharem, quiçá mais interessados em garantir o futuro, José Sócrates foi novamente envolvido num caso, mais um caso – convite a Joana Amaral Dias para entrar nas lista dos PS a troco de lugares de Estado.

Depois do ataque certeiro de Francisco Louçã, que o acusou de tráfico de influências, José Sócrates e os seus ajudantes vieram a terreno desmentir, desmentir e desmentir.

Hoje, Paulo Campos, secretário de Estado adjunto das Obras Públicas e Comunicações, veio confirmar o convite, mas garantindo que «não deu conhecimento destes contactos pessoais e privados à direcção do PS, ao secretário-geral ou à federação distrital do PS de Coimbra, nem estava mandatado por eles para formalizar qualquer convite».

Já ninguém se admira com este tipo de fuga em frente, com este tipo de gente que governa o país.

O espanto, o que mais impressiona, é que ainda julgam que é possível voltar a enganar politicamente os portugueses.




terça-feira, 7 de julho de 2009

Responsabilizar

Em Novembro de 2008, antecipei o arquivamento do processo aberto para investigar os voos da CIA e o transporte de sequestrados por território português.

Fi-lo em plena consciência, na página 117 do livro «Voos 'Secretos' CIA – Nos Bastidores da Vergonha», decorridos mais de vinte meses após a abertura do Inquérito criminal.

Foi a minha maneira de alertar para a falta de rigor de um inquérito que se limitava ao ritual habitual com fim anunciado, sem mesmo garantir o respeito de atempadamente cumprir as exigências formais de uma investigação.

Não me enganei, como demonstrou o despacho de arquivamento, com data de 29 de Maio de 2009. E depois remeti-me ao silêncio, seguro que o tempo se encarregará de apurar a mentira e a ignominia.

Depois da tentativa de recolha acéfala de reacções ao conteúdo de 27 volumes, dos quais 24 relativos a apensos, o silêncio abateu-se sobre o processo.

A única pedrada no charco ocorreu ontem, durante a declaração da Eurodeputada Ana Gomes, que tomou posição sobre o despacho de arquivamento.

Ao optar por reclamar a reabertura do inquérito, apontando erros grosseiros e omissões inimagináveis, a Eurodeputada decidiu responsabilizar o Ministério Público. E, como referiu, das duas uma: ou houve incompetência na investigação do Ministério Público ou vontade política de enterrar o caso.

Certamente, muitos ficaram desiludidos por Ana Gomes não ter pedido a abertura de Instrução, pois ficaram impedidos de glosarem a partida para a 'guerra' em nome de mais uma causa, ao jeito de uma cruzada moderna.

Ana Gomes tomou a atitude certa e honrou um trabalho notável de dedicação e competência.

O Estado de Direito e os valores da Democracia não dependem só do empenho deste ou daquele cidadão. Por vezes, a melhor maneira de os defender é confrontar as instituições e os seus principais responsáveis com as suas decisões, por acção ou omissão, por mais toscas e descaradas que possam ter sido.

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Portugal merecia mais

Conhecidos os resultados eleitorais de 7 de Junho passado, defendi que o primeiro-ministro deveria apresentar a sua demissão ao Presidente da República.

Ainda que a legitimidade formal para governar não tenha sido beliscada, a derrota nas urnas diminuiu a legitimidade política do governo para assumir em toda a plenitude a recta final do mandato que lhe foi conferido em 2005.

Além dos argumentos constitucionais e políticos, a devolução da palavra ao povo é sempre a melhor forma de clarificação em Democracia.

Manuela Ferreira Leite e Aníbal Cavaco Silva são cúmplices e responsáveis pela actual situação de impasse. Nem a líder do maior partido da Oposição, nem o presidente da República, quiçá por razões estratégicas, levantaram a voz contra mais um adiamento de Portugal.

Afastado o cenário da antecipação das eleições, o que se está a passar?

O país já caiu numa campanha eleitoral que vai durar mais de três meses.

Num momento em que são necessárias medidas de excepção para responder a uma crise interna e global também de excepção, a crescente paralisia governamental é evidente.

Os sucessivos anúncios de adiamentos das obras públicas e de reformas consideradas estruturantes são a prova cabal que o governo já está em gestão corrente.

E a infantilidade política de quem julga que a melhor forma de ultrapassar o desaire eleitoral é aliviar aqui e ali alguns traços de estilo e imagem revela que estamos á beira do pântano.

Pouco importa se a estratégia do primeiro-ministro lhe é política e pessoalmente favorável ou desfavorável. O que realmente importa é a forma desesperada como se está a agarrar ao poder, o que prejudica a governação e o futuro do país.

terça-feira, 9 de junho de 2009

Agarrado ao poder

De um momento para o outro, o país acordou para uma derrota estrondosa dos socialistas.

A vitória folgada ao PSD, apesar das sondagens indicarem o contrário, não é o facto mais relevante do resultado das eleições europeias.

O verdadeiramente relevante é a derrota da gigantesca máquina de propaganda da maioria.

Aliás, a decepção manifestada por José Sócrates na noite eleitoral é a prova que as principais vítimas da 'encenação' foram os seus próprios autores e mentores.

A cerca de três meses de um novo escrutínio, que vai decidir muito mais do que a governação para os próximos quatro anos, Portugal entrou numa espécie de twighlight zone em que a maioria no poder não corresponde ao sentimento do país real.

A única forma de sair desta situação passava por uma atitude de Estado de José Sócrates, isto é, pela apresentação da sua demissão na noite eleitoral, o que permitiria a convocação de eleições antecipadas.

Infelizmente, o actual primeiro-ministro não tem o estofo de estadista de António Guterres.

Incapaz de perceber o sentido do voto popular, José Sócrates agarrou-se ao poder com todas as forças.

A Democracia sai penalizada com este exemplo – mais um! – de falta de responsabilidade política e ética republicana.

O prejuízo para o país é evidente, pois vamos assistir a decisões governamentais, cujos efeitos ultrapassam o ciclo eleitoral, ao mesmo tempo que a Oposição clama por falta de legitimidade.

Num momento de crise excepcional, a nível interno e global, o país não pode perder tempo com um governo diminuído e com mais querelas partidárias. Nem tão pouco com o arrastamento de uma situação de paz podre que apenas vai permitir a triste exibição da máquina do poder em todo o seu esplendor.

sexta-feira, 5 de junho de 2009

Povo soberano, mas...

As sondagens têm dado um empate técnico aos dois maiores partidos parlamentares, ora dando a vitória a um ou ao outro.

Uma vitória de Pirro, seguramente, já que a abstenção deverá ser a grande vencedora da noite de 7 de Junho de 2009.

As sondagens valem o que valem, sobretudo em Portugal, mas como é possível depois da governação de José Sócrates admitir que o PS pode ganhar umas eleições?

A resposta está na dificuldade dos pequenos partidos e movimentos conseguirem passar a sua mensagem.

Por um lado, a generalidade dos Media barram as formações políticas emergentes em nome de interesses comerciais ou do 'não interessa nada'; por outro, a RTP varre para debaixo do tapete uma das suas funções mais nobres: o serviço público.

Ambas as atitudes são incompreensíveis, mas seguramente ninguém discordará que a da RTP é escandalosamente impune.
Não é por acaso que a RTP ora é 'laranja', ora é 'cor de rosa'.

O 'jogo' a que a Direcção de Informação da RTP se presta está ao nível da Informação que pratica, agora como no passado.

A Democracia é a alternância dos partidos do poder. Não deveria ser a alternância da cor política da Direcção de Informação da RTP.

sábado, 16 de maio de 2009

Alegre: mais do mesmo

Depois de alimentar meses a fio a especulação sobre a criação de um novo partido político, Manuel Alegre veio a terreiro, finalmente, anunciar o seu futuro político.

Sem qualquer surpresa, o 'barão' socialista anunciou que não integrará as listas do PS para as próximas eleições legislativas. E, também sem qualquer surpresa, confirmou que se mantém no partido em que sempre militou.

A opção de Manuel Alegre é digna. Até pode ser encarada como um exemplo para os que continuam agarrados aos 'cadeirões' partidários e do poder, seja por não saberem fazer mais nada, seja para garantir uma qualquer imunidade preventiva.

Assim, por que razão a decisão de Manuel Alegre é uma fraude política?

Em primeiro lugar, por ser mais do mesmo.
Manuel Alegre há anos que promete uma ruptura com os PS, que fica sempre na gaveta depois de umas conversas com o líder, seja ele qual for.

Em segundo lugar, por colocar os interesses do PS à frente dos interesses do país.
Manuel Alegre sempre o fez, por esta ou aquela razão, por esta ou aquela fidelidade, deixando transparecer que está disponível para engolir um qualquer 'Sócrates' quando o partido está confortavelmente instalado no poder, em nome de uma fidelidade cega.

Ora, um homem livre não se pode dar ao luxo de confundir carreirismo e desprendimento, lealdade e probidade, táctica e estratégia.

Para quem criou tanta expectativa em relação a uma abertura do espectro partidário, ancilosado num Bloco Central de interesses asfixiante e a roçar o criminoso, Manuel Alegre esgotou qualquer capital de credibilidade política na reedificação do regime democrático.

De igual modo, a expectativa de ganhar espaço e apoio político para uma candidatura presidencial deixou de fazer qualquer sentido.

Haverá algum português, de esquerda ou de direita, que vote num candidato presidencial que seja capaz de sacrificar os interesses do país a um qualquer interesse partidário?

domingo, 19 de abril de 2009

O truque (im)possível

A aproximação dos três actos eleitorais – europeias, legislativas e autárquicas –, está a fazer renascer o 'fantasma' da Democracia: o conflito entre São Bento e Belém.

Em vez de aceitar uma tensão institucional, consagrada constitucionalmente, os governos fracos, e em dificuldades pré-eleitorais, recorrem ao argumento da instabilidade quando se abeiram do veredicto popular.

Hoje, em 2009, o 'filme' encaminha-se para o epílogo conhecido, como se de um déjà vu se tratasse.

Cada vez mais alarmado com o veredicto popular, o primeiro-ministro (ainda) em exercício tem feito tudo para fazer deflagrar um conflito com o Presidente da República.

Os pretextos são variados, desde o estatuto dos Açores, aos vetos políticos, acabando, agora, num remoque público inqualificável a um discurso importante de Aníbal Cavaco Silva.

A coabitação entre o chefe do governo e a presidência da República deveria merecer mais respeito político.

De facto, a introdução de uma crise institucional não serve os propósitos do país, apenas pode servir a quem está desesperado, inseguro de uma governação marcada por erros grosseiros cometidos nos últimos quatro anos.

Não é por acaso que, aqui e ali, se começa a falar em eleições antecipadas. Pasme-se! Eleições antecipadas num ano em que os portugueses são chamados a votar por três vezes...

Os estrategas, conselheiros e consultores do governo – aqueles que permanecem fiéis e ainda restam à volta do líder –, não ignoram que a hipótese é um truque impossível.

Então, por que razão insistem no braço-de-ferro?

Por acreditarem que a basta a ideia se consolidar para se tornar num truque possível.

O objectivo é levantar a dúvida em relação aos entraves à governação para justificar os falhanços clamorosos que se advinham nas reformas estruturais e nos objectivos macroeconómicos que se 'venderam' aos portugueses de uma forma obscena.

José Sócrates tem os dias contados. Já nem pode antecipar, nem adiar as dificuldades que vai ter de enfrentar.

Com mais ou menos orgulho, não há truque (im)possível que lhe valha.



sábado, 28 de março de 2009

Teste à Democracia

Os casos Freeport e BPN estão a abalar o normal funcionamento do regime.

Enquanto a corte do costume vai esperneando à medida que a investigação jornalística avança, todos os olhares se viram para o que anda a fazer a Justiça em relação a estes dois processos e para o que vai fazer o Presidente da República.

Apesar de estar fragilizada por uma legislação manhosa e insuficiente, por um caos organizacional e por insucessos estrondosos, há uma crescente expectativa em relação às respectivas investigações criminais em curso.

Já sabemos que a Justiça é capaz de perseguir os cidadãos anónimos, os presidentes de Câmara e até os dirigentes de futebol. Agora vamos ficar a saber, pela primeira vez, se a Justiça é capaz de enfrentar um primeiro-ministro e um Conselheiro de Estado, ambos em exercício de funções.

O Presidente Richard Nixon, nos Estados Unidos, e o primeiro-ministro Ehud Olmert, em Israel, entre muitos outros exemplos, foram investigados e tiveram que abandonar as suas funções por força da acção da Justiça.

Na verdade, tal só aconteceu também por força da acção da Comunicação Social e da opinião pública, que se colocaram ao lado dos agentes da Justiça.

Em Portugal, os sinais de desconforto da sociedade civil são evidentes. A imprensa está a fazer o que lhe compete. Só falta a Justiça fazer o seu trabalho.

Apesar dos deputados da Assembleia da República estarem a desenvolver um trabalho meritório em relação ao caso BPN, enquanto optaram por um silêncio envergonhado em relação ao caso Freeport, sejamos claros: José Sócrates e Manuel Dias Loureiro têm o direito à presunção de inocência, mas já deveriam ter tido a dignidade política de se demitirem há muito tempo.

José Sócrates e Manuel Dias Loureiro passaram a ser um fardo demasiado pesado para um país que já tem às costas uma das crises mais graves de sempre.

O Presidente da República, Aníbal Cavaco Silva, não pode fugir às suas responsabilidades constitucionais.

domingo, 1 de março de 2009

Os 'negócios' socialistas

O XVI congresso do Partido Socialista fica para a história.

A reunião que elegeu, novamente, José Sócrates, decorreu com toda a normalidade no meio da maior anormalidade de que há memória desde o 25 de Abril.

Nunca como hoje, o líder e o partido do poder estiveram sob os holofotes de tanta suspeição de corrupção, tráfico de influências e nepotismo.

A lista de negociatas, que atingiu directa ou indirectamente José Sócrates, o partido e o governo, não pára de crescer.

A sucessão de casos impressiona os portugueses e a comunicação social que (ainda) se espantam com as novidades sobre os processos da Cova da Beira, Heron Castilho, Freeport, BCP, BPN, BPP, aviões Airbus, compra de acções a Manuel Fino, entre outras 'operações' cujos contornos estão longe de estar esclarecidos.

Face a este interminável manto que cobre o regime e alguns dos seus principais actores, e face a uma Justiça atolada na falta de credibilidade, o XVI congresso do PS permitiu uma clarificação.

Por um lado, José Sócrates, cada vez mais ferido e acossado, limitou-se a gerir a distribuição de lugares e a responsabilizar os poderes ocultos e a comunicação social por uma eventual campanha negra em curso; por outro, Ana Gomes pediu legislação para punir, clara e inequivocamente, o enriquecimento ilícito.

Face a um ambiente podre, a eurodeputada socialista ainda deixou uma frase certeira: «Os portugueses sabem que as pessoas sérias não têm dificuldade em fazer prova de onde vem o seu dinheiro».

O apelo à transparência pode ter sido isolado, mas ficou registado que ainda há um entendimento limpo da política e da governação.

Os governantes têm de estar acima de qualquer suspeita. É a disponibilidade para prestar contas e para aceitar o escrutínio dos cidadãos e dos jornalistas que lhes confere uma respeitabilidade ímpar.

O XVI congresso do PS fica para a história pela consagração da inversão do principal paradigma democrático, sem qualquer sinal de sobressalto cívico da generalidade dos seus militantes.

quarta-feira, 18 de fevereiro de 2009

Isso não interessa nada?

Aníbal Cavaco Silva anda preocupado com os escândalos que marcaram a agenda mediática no último mês.

Mais que uma vez, o presidente da República exortou os portugueses a concentrarem-se no essencial, leia-se a crise e o desemprego.

O presidente tem razão?

Não.

O estado a que chegou o regime deve-se, precisamente, a este tipo de discursos, que apenas servem para esconder a podridão dos fundamentos do regime e a impunidade dos poderosos e influentes.

Em relação ao período em que liderou o Executivo, Aníbal Cavaco Silva revela coerência ao fazer, hoje, tais afirmações, mas o país sai beneficiado?

Não.

O discurso do tipo 'isso não interessa nada' apenas tem servido para abafar escândalos incomensuráveis, entre os quais se destaca o processo de privatizações da banca nacionalizada.

Não é por isso de estranhar que os casos Champalimaud e Totta tenham sido seguidos dez anos depois pelos escândalos do BCP, BPN e BPP.

Não é por acaso que o caos na Justiça chegou ao absurdo, para não dizer mais, de começar a ouvir suspeitos (que não eram suspeitos há um par de semanas) sete anos depois do licenciamento do Freeport.

Também não é por acaso que Manuel Dias Loureiro mente numa Comissão Parlamentar de Inquérito e nada acontece, a não ser uma série de lamúrias que insultam a inteligência de cada um dos portugueses.

O presidente da República é soberano para fazer os apelos que entender.

Os portugueses também são soberanos para responsabilizar Aníbal Cavaco Silva pelo estado a que chegámos.

Seguramente, não é o único responsável, pois muitos dos outros governantes, desde o 25 de Abril, alguns deles até condecorados pela República, merecem partilhar este (triste) pódio.

Pior do que esconder a realidade, só mesmo contribuir, por acção ou omissão, para que a corrupção, o tráfico de influências e o nepotismo floresçam, condenando os portugueses ao subdesenvolvimento crónico.

A História fará Justiça.

terça-feira, 10 de fevereiro de 2009

Freeport: os erros da imprensa

A investigação jornalística não está liquidada, mas está cada vez mais à mercê de incompetentes receosos de incomodar o poder.

Foi preciso sentir a crise, que enfraqueceu o primeiro-ministro, pelo menos nas ruas, para as páginas dos jornais se encherem, subitamente, de notícias e artigos de opinião sobre um caso típico de corrupção que envolve o nome de José Sócrates.

Uns explicam a coincidência com a acção dos «poderes ocultos», – esses lá sabem do que falam» .

Outros explicam o sucedido com os desenvolvimentos da entrevista de Júlio Monteiro, ao semanário «Sol», e com os dados da carta rogatória das autoridades inglesas.

A última explicação é verdadeira, mas é tíbia e pouco rigorosa.

Céleres a acusar os poderes político e judicial a propósito do arrastamento das investigações, a generalidade da Imprensa ainda não fez o seu mea culpa: nos últimos anos, o que fizeram os principais órgãos de comunicação social para apurar o que se passou no 'Caso Freeport'?

Nada ou quase nada.

À excepção de investigações que foram barradas à partida, a generalidade das chefias editoriais não tiveram capacidade para mobilizar esforços para escrutinar um primeiro-ministro com uma maioria absoluta.

O calculismo até pode recompensar, mas não serve o jornalismo.

As direcções editoriais, as administrações e os 'patrões' da comunicação social, entre os quais se encontram os 'boys' do costume, têm de assumir as suas responsabilidades em relação ao tratamento noticioso do 'Caso Freeport'.

E têm a obrigação de explicar por que razão, aparentemente, geriram o timing de investigações do mais relevante interesse público.

Nestes momentos, mais do que a qualidade do jornalismo, fica a amarga sensação de que a imprensa não cumpriu, cabalmente, o papel de escrutínio que lhe compete e que sempre foi premiado pelos leitores quando é frontal, sério e limpo.

Face a este silêncio envergonhado de quem já perdeu a noção da autocrítica, ganham força as estratégias de vitimização e as teses oportunistas, entre outras manobras e idiotices.

Eis um exemplo, mais um, que deveria fazer pensar quem trabalha e está com uma comunicação social livre e responsável.

sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Freeport: a declaração que falta

O primeiro-ministro de Portugal pode não ser suspeito para a Justiça portuguesa, mas já não escapa à suspeição da opinião pública.

Desde o momento em que o Freeport regressou aos jornais, rádios e televisões – em que se encontram alguns que o tentaram abafar noutros momentos –, José Sócrates desatou a reagir precipitadamente, valorizando mediaticamente o que ele próprio veio agora afirmar como uma obra de «poderes ocultos».

Os principais 'patrões' da Comunicação Social agradecem, com as vendas a subir. Mas tal estratégia, que mais parece um pingue-pongue entre indícios e factos suspeitos e declarações de fé, beneficia José Sócrates?

Creio que não.

O direito inalienável à indignação e à presunção de inocência não se compaginam com múltiplas declarações emocionadas que relevam, inevitavelmente, omissões e contradições que reforçam todas as suspeições.

O primeiro-ministro de Portugal está refém de formalismos processuais. O mais grave é que tem usado o seu poder institucional para tentar minimizar os estragos, o que lhe valeu uma severa repreensão pública da parte de António Cluny, que chamou à atenção para as subtis interferências sobre a investigação.

Aos olhos da opinião pública, a estratégia de defesa escolhida é mais a de um culpado do que a de um inocente.

Bastaria uma singela declaração para esvaziar todas as suspeitas: permitir a investigação das suas contas bancárias e apelar à família para disponibilizar a informação sobre o património amealhado nos últimos anos.

Assim, sim. Estaríamos perante a defesa de um inocente que age em consequência.

José Sócrates estaria a fazer uma favor a si próprio, à Democracia e, sobretudo, à Justiça, que se está a afundar no pântano, no tal pântano que António Guterres invocou há sete anos para se demitir.

O processo Freeport já 'matou' politicamente José Sócrates. A culpa não é da comunicação social. É do próprio José Sócrates que tudo está a fazer para consumar um suicídio político.

quarta-feira, 21 de janeiro de 2009

A primeira medida: Guantánamo




O quadragésimo quarto Presidente dos Estados Unidos da América tem o mundo a seus pés. Não pela força do medo e das armas, mas pela força das ideias e da esperança.

Barack Obama é mais do que uma realidade confirmada. É a prova que as Democracias continuam a ter a vitalidade para assumir os vectores da civilização e a capacidade para gerar movimentos capazes de combater a arrogância, a ganância e o arbítrio.

O discurso de tomada de posse não deixou quaisquer dúvidas, mesmo para quem, precipitadamente, começou a duvidar muito cedo de um político que já marcou o século XXI.

As palavras simples, sublinhadas por uma grande simbolismo histórico, que apelaram aos valores, à transparência e à responsabilidade, demonstraram a coerência de quem fez uma campanha eleitoral virada para o cidadão, o mundo e o futuro.

Nem as questões protocolares impediram as críticas subtis, mas veementes, em relação à anterior Administração, deixando a marca da diferença em relação a uma pseudo governação em que os interesses pessoais e empresariais muitas vezes se confundiram com pretensos desígnios nacionais.

Barack Obama é diferente.

A assunção da diferença ficou patente na primeira medida da sua Administração: a suspensão dos processos judiciais por terrorismo em Guantánamo.

O espírito da nova Administração não poderia ter sido honrado de melhor forma.

Quanto maior for a diferença entre a actual Administração e a anterior, que deixou o mundo à beira do caos, com oito anos de governação desastrosa, para não dizer criminosa, em alguns casos, mais Barack Obama merecerá o apoio dos seus concidadãos e o respeito dos povos de todo o mundo.

Quem se propõe vencer pela força das ideias, não pode vacilar. Pode errar, mas nunca pode ceder perante interesses difusos.

O primeiro sinal está dado. A prioridade assumida merece aplauso e respeito. Todavia, não se julgue que vai ser fácil vencer esta batalha pela dignidade humana e Direitos Humanos.

A empreitada ainda está longe de ser cumprida. Seguramente, só teremos a certeza de que Barack Obama está no bom caminho quando aqueles que deram cobertura e tentaram abafar os voos da CIA e as prisões de Guantánamo e Abu Ghraib começarem a acreditar que a América mudou.

segunda-feira, 5 de janeiro de 2009

As guerras não iludem

A pouco menos de um ano das eleições Legislativas, o governo de maioria socialista regressou à táctica do início do mandato.

Em pleno período recessivo, que não foi capaz de antecipar e prevenir, mas vai ter que assumir, José Sócrates regressou à derrapagem do défice, ao crescimento anormal da dívida pública e ao pretenso combate a sectores e classes profissionais.

Entretanto, os banqueiros e alguns grandes empresários receberam as garantias necessárias para disfarçar uma gestão ruinosa, e até, por vezes, criminosa.

Pacificada a super estrutura, o chefe do governo ganhou espaço para tentar consolidar uma imagem de credibilidade e autoridade.

A consagração de uma determinada estratégia de afrontamento, em que o interesse geral tem sucumbido a uma táctica marcada por insondáveis interesses partidários, recebeu uma lufada de ar fresco, a propósito do estatuto dos Açores.

Por muita habilidosa que ainda possa vir a ser a performance de José Sócrates, nomeadamente em relação ao conflito institucional com Cavaco Silva, a receita está comprovadamente gasta: o pretenso exercício de combate a determinadas corporações (juízes, procuradores, advogados, jornalistas, professores, médicos, associações e sindicatos) não resultou em nenhuma reforma ou melhoria substancial.

Os evidentes sinais de desgaste da maioria obrigaram a avançar com mais medidas, nomeadamente o esbanjamento de recursos e de apoios avulsos (dádivas folclóricas aos funcionários públicos), que, sinceramente, mais parecem medidas eleitoralistas desesperadas.

No próximo dia 11 de Outubro de 2009 (o meu palpite para a data das Legislativas), está em causa muito mais do que o futuro político de José Sócrates.

Um governo que confunde a maioria absoluta com o autoritarismo, que usa e abusa da propaganda, com um descaramento político nunca visto, para apregoar o crescimento ou para cavalgar a crise, só pode merecer uma forte sanção eleitoral.

A atribuição de responsabilidades ao Executivo no agravamento da situação económica, financeira e social já anda na rua, de boca em boca, tendo ultrapassado a própria opinião publicada.

Seja qual for a dimensão da 'máquina' que José Sócrates criou nos últimos anos, os portugueses não vão cair no logro político. Nem que a cabeça da Oposição lhes apareça, graciosa e repetidamente, servida numa qualquer bandeja de prata.