É fundamental avaliar, no momento próprio, a motivação que
presidiu às buscas a casa e ao escritório de um dos maiores críticos do sistema
judicial.
A competência de Medina Carreira, por um lado, e a envergadura de
Carlos Alexandre, super juiz de instrução, e de Rosário Teixeira, magistrado do
Ministério Público, por outro, exigem uma clarificação total.
Não bastam razões jurídicas técnicas e formais. É preciso mais. É
preciso saber se os indícios eram suficientemente credíveis para avançar com as
buscas.
Quando o processo for público, demore o tempo que demorar, esta
questão terá de ser esclarecida em nome da defesa da liberdade individual e do
Estado de Direito.
A questão coloca-se com toda a veemência pelo facto de estarmos
perante magistrados de primeira linha e um comentador muito incómodo para o poder judicial.
É aceitável que um indício vago seja suficiente para determinar
buscas policiais a um cidadão, seja ele figura pública ou não?
A resposta é não.
Não é admissível que a investigação criminal avance no terreno sem
aferir o mínimo de autenticidade dos indícios recolhidos. Aliás, no passado, existiram
várias situações que confirmaram a prudência dos magistrados quando
confrontados com denúncias pouco fundamentadas, por mais convincente ou canalha
que tenha sido a fabricação de conjecturas.
No dia em que Medina Carreira foi transformado em alvo, a voz
popular não teve qualquer dúvida em associar estas diligências a uma
perseguição pessoal: «quem os ataca, está sujeito a estas coisas».
Vale a pena reflectir sobre este estado de espírito. À partida, os
portugueses admitiram, imediatamente, estarmos perante uma represália sobre
quem tem a coragem de criticar o governo e a justiça.
O processo "Monte Branco", que detectou fugas ao fisco
e branqueamento de capitais, é demasiado sério e importante para ficar manchado
por qualquer tipo de suspeita de reacção corporativa contra um opinion maker que duvida da organização
da justiça portuguesa.
O facto do comentador da TVI ser uma figura pública não lhe dá
quaisquer direitos acrescidos; contudo, o facto de ser protagonista de um
programa televisivo popular, de assumir frontalmente críticas fundamentadas e
contundentes, não o pode expor a qualquer tipo de humilhação pública com base
numa espécie de exibição gratuita de força, venha ela de onde vier.
A credibilidade da justiça não é atestada pelo facto de ser capaz
de escrutinar os mais ou menos poderosos, mas sim quando age da mesma forma, e
com a mesma determinação, em relação a uns e a outros.
Os últimos 25 anos são a melhor prova que é preciso dar um salto
qualitativo. Os casos exemplares não funcionam, nunca funcionaram, e,
sobretudo, não colhem quando os tiros são falhados. É preciso dizer basta a uma
investigação criminal que faz buscas para suportar indícios sem sustentação, que
investiga depois de acusar, que se serve do tempo para condenar os cidadãos
antes do veredicto dos tribunais.
Medina Carreira é demasiado credível para ser derrubado por pistas
que, até ao momento, e com base na informação disponível, se revelaram totalmente
insuficientes. Aliás, as opiniões do ex-ministro das Finanças representam uma
das últimas oportunidades para a regeneração do sistema judicial português. Não
o perceber é muito mais do que ser injusto.
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