Grassa
a indignação com o clientelismo que gira à volta do Estado e dos partidos
políticos, mas é preciso reafirmar que ele não é um atributo exclusivo da
esfera governativa, política, administrativa, judicial e pública, muito pelo
contrário, é uma realidade que perpassa por todos os outros sectores privados.
A
mordaça que nos tem transformado em NIB's obrigados e venerandos tem aberto um
enorme pasto para todos aqueles que, tão cândida como hipocritamente, continuam
a tentar branquear o lamaçal que se instalou entre o Estado, os corredores do
poder político e os principais agentes económicos e financeiros.
O
paradigma instalado é infernal: quem critica a direita é de esquerda e
vice-versa; quem zurze na cor do poder é da oposição; quem critica os partidos
políticos é populista; quem está farto de ser esbulhado por um Estado com laivos
mafiosos, então é um liberal malvado e insensível; quem está farto de ser
explorado por empresários, com mais ou menos escrúpulos, só poder ser um
perigoso revolucionário; em síntese, quem tenta romper este manto de clientelismo
arrisca ser escorraçado e vilipendiado.
Os
investigadores das ciências sociais já reflectiram sobre o verdadeiro fermento da
pequena e da grande corrupção. E os diversos organismos nacionais e internacionais
também já multiplicaram estudos, barómetros e rankings sobre as consequências devastadores para a economia dos
cidadãos, das empresas e dos Estados.
Nada
tem sido suficiente para despertar as consciências e mobilizar os cidadãos
contra esta praga, da qual a sociedade não se consegue livrar.
Os portugueses merecem os políticos que têm, o Estado que lhes cobra o dinheiro dos impostos e ainda os abandona e maltrata e também a espécie de liberdade formal que lhes permite viver a vidinha e aconchegar a resignação.
As
fortunas censuráveis, por enquanto, continuam a ser apenas aquelas que estão
ligadas aos tráficos de droga e seres humanos. As outras, aquelas que a economia
global também acalenta, certamente mais adequadas ao colarinho branco do trois pièces, que geram também fabulosas
comissões, sempre acobertadas por uma qualquer offshore, ainda são toleradas pela sociedade, numa espécie de
masoquismo indulgente em relação a verdadeiros meliantes, quiçá por também criarem
postos de trabalho.
Basta
dar uma olhadela para algumas indústrias e sectores, da banca ao mercado de
capitais, do armamento à farmacêutica, da aeronáutica ao imobiliário, do
petróleo aos diamantes para perceber que estamos rodeados de gangsters com semblante polido e verniz modernaço,
sempre protegidos e com direito de antena, dos grandes fóruns aos Media, sempre em nome de um qualquer
interesse nacional.
Já
bem cientes que a grande diferença entre a direita e a esquerda se resume à
retórica, os portugueses tardam em interiorizar as consequências das únicas
ideologias que ainda resistem: o esverdeado do dólar e o azulado do euro.
Como
em Espanha, nós também "Podemos", mas só com olhos bem abertos, sem
nunca esquecer Blair e Obama, porque sabemos bem como acabaram as suas
promessas de mudança.
Mesmo
em Portugal, em que o Estado está há muito tempo capturado por interesses dominantes,
a mudança é possível, é sempre possível, nem que seja através da escolha de uma
nova ilusão que, afinal, poderá ser apenas e tão-somente, mais uma vez, aquilo
que nos parece o mal menor.
E
se assim for, então será um novo passo em frente.
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