domingo, 15 de novembro de 2009

Fernando Pinto Monteiro a mais


No dia 28 de Outubro foi dado um passo no sentido da regeneração de um Estado associado à alta corrupção.

Dezoito dias depois das primeiras buscas da operação "Face Oculta", Fernando Pinto Monteiro passou a ser parte do problema.

Desde logo, começa a ser pouco compreensível que o procurador-geral da República tenha metido na gaveta – mais uma vez! – um caso de Estado da maior sensibilidade: as conversas de Armando Vara com José Sócrates.

Fernando Pinto Monteiro continua a revelar incapacidade para lidar com as investigações que envolvem governantes e poderosos.

Basta atentar que após as declarações politicamente destemperadas do chefe do governo – em relação a um caso em que o plano pessoal mais uma vez se confundiu com o plano de Estado – Fernando Pinto Monteiro só precisou de 24 horas para fazer o que não tinha conseguido fazer durante meses: um esclarecimento rigoroso.

Mais incómodo ainda é que o esclarecimento, participado minutos antes do jogo de Portugal com a Bósnia, só surgiu depois da manchete do "Correio da Manhã": «Sócrates suspeito de crime grave – Atentado contra o Estado de Direito – Conclusão do Ministério Público de Aveiro aponta para crime que prevê pena de prisão até oito anos de prisão. Em causa, segundo magistrados, está a manipulação da comunicação social».

Agora, ao prometer uma decisão «até ao fim da próxima semana», fica a sensação que o procurador-geral da República está a preparar a opinião pública para a eventual destruição das escutas, não conseguindo evitar a percepção de que anda a reboque das exigências do primeiro-ministro e das manchetes dos jornais, qual subordinado reverente e atormentado.

Como se não fosse suficiente, Fernando Pinto Monteiro ainda não reagiu ao ataque de um "aparatchik" de segunda linha do PS, que caracterizou uma investigação criminal da maior relevância para o país como «espionagem política».

Fernando Pinto Monteiro está a mais. E já deixou de ser uma parte da solução para o imbróglio que ajudou a alimentar na opinião pública.

domingo, 8 de novembro de 2009

Corrupção: moral ou justiça social?

Os indícios de corrupção alargada ao mais alto nível do Estado estão aí para quem os quiser ver e escrutinar.

Nos últimos trinta anos de Democracia, governos de esquerda e de direita estiveram sob a mira criminal e debaixo do escrutínio dos media.

Depois dos sucessivos casos que saltaram para a ribalta pública, bem como dos sinais de alarme escarrapachados nos relatórios de organizações internacionais, o poder político continua impune e indiferente, apesar das constantes palavras vãs e mansas.

A realidade é o que é, mas ninguém pode ficar indiferente à tentativa de desvalorização da investigação criminal que continua a fazer, lentamente, um caminho infame.

Em vez de responsabilizar os sucessivos governos que têm o poder de legislar e de exigir responsabilidades, aqui e ali, sobretudo quando os escândalos chegam à opinião pública, surgem imediatamente os ataques aos investigadores criminais e magistrados.

Normalmente, e apesar de existirem alguns fundamentos para esta avaliação, a verdade é que quem tão selectivamente aponta o dedo a quem combate a corrupção na primeira linha não tem o mesmo critério na exigência ao governo de leis claras e atribuição de meios adequados para responder à sofisticação do crime de 'colarinho branco'.

Com o desenvolvimento da operação "Face Oculta", a actualidade revelou um novo e surpreendente patamar de debate, que passa por reduzir o combate à corrupção a uma mera questão de moralização do sistema, supostamente levada a cabo por heróis imbuídos de um espírito messiânico.

Ora, o combate à corrupção não é uma questão de moralidade e de coragem, é um caso de justiça social, de perseguir quem rouba o dinheiro do bolso dos outros.

Que não haja qualquer confusão: há uma diferença abissal entre pugnar por mais justiça social, com mais solidariedade e menos corrupção, e pactuar, quiçá promover a gritante promiscuidade e tráfico de influências que estão na origem da corrupção.

É uma questão de cultura e de civilização.

sexta-feira, 30 de outubro de 2009

O risco de instabilidade

Imediatamente a seguir à tomada de posse do XVIII governo constitucional, liderado por José Sócrates, o regime desceu ao nível do lixo e da sucata.

Novamente, a corrupção, o tráfico de influências e o nepotismo surgiram em todo o esplendor, com a revelação dos primeiros detalhes da operação policial – "Face Oculta".

Ainda antes de enterrar os escândalos financeiros dos últimos anos, que alimentaram todas as suspeições ao mais alto nível do Estado, o novo ciclo político ficou desde já marcado por novas suspeições, tão sujas quanto a matéria prima que alimentou as negociatas e as luvas pagas à custa dos contribuintes.

Tal como aconteceu com o 'cavaquismo', o "Estado Rosa" de José Sócrates apodrece, lentamente, à medida que chegam ao conhecimento público os indícios de enriquecimento ilícito de alguns dos seus mais ilustres e proeminentes pares.

Depois de um ciclo eleitoral extenuante, em que os portugueses foram chamados a eleger os eurodeputados, o governo e os autarcas, chegou a hora de perguntar: ainda há esperança na mudança?

A resposta colectiva não se forma de um dia para o outro, nem ninguém se pode arrogar o direito de a avançar antes do tempo.

Todavia, começa a ser evidente que o futuro do segundo governo de José Sócrates vai depender mais da capacidade de regeneração do Estado do que da implementação desta ou daquela política governamental.

E que não haja ilusões: Com a oposição parlamentar demasiado comprometida com o sistema e com Aníbal Cavaco Silva ferido de morte, é cada vez mais evidente que a mudança a curto prazo só pode passar por um saneamento do poder, pois a crise económica e financeira estão instaladas e para durar por um bom par de anos.

Como nunca no passado, o risco de instabilidade governativa depende da crescente tomada de consciência do estado a que chegou a República.

sábado, 3 de outubro de 2009

Rio de sonho



Os 'cariocas' vão organizar as olimpíadas de 2016.

À primeira vista, não há ninguém no mundo que possa ficar triste com tal vitória, nem mesmo os responsáveis das candidaturas derrotadas de Chicago, Londres e Madrid.

Os que já puseram o pé na cidade mais bonita do mundo, que ainda poderia ser mais maravilhosa não fora a vergonha festiva das 'favelas', exortaram com o feito de monta.

Além da imediata festa em Copacabana, após o anúncio da escolha do comité olímpico, e a sete anos de distância, importa perguntar: quem vai ganhar com a realização do evento planetário?

Os 'cariocas'? Os brasileiros? O espírito olímpico? A paz entre os povos?

Não!

Os ganhadores serão os bancos, os construtores, as sociedades de advogados e as teias da corrupção que fazem do sétimo país mais rico do mundo uma das sociedades mais pobres e desiguais da América do Sul.

A fabulosa máquina criada para promover este tipo de mega eventos não tem qualquer preocupação com os princípios desportivos e universais. Aliás, não será de estranhar que um dia destes se fale de corrupção e de 'luvas' pagas aos responsáveis pela escolha do Rio de Janeiro, a exemplo do que sucedeu em casos anteriores.

Mais do que a mensagem universalista, de paz e convívio entre nações, a realização dos Jogos Olímpicos há muito que se transformou numa gigantesca máquina de promoção de negócios e regimes, democráticos ou ditatoriais, como a China.

No frenesi da globalização selvagem, os povos vão sucumbindo à ilusão 'patrioteira', magnificamente montada pelas máquinas da propaganda oficial, cada vez mais refinadas nos apelos aos argumentos serôdios.

Infelizmente, o preço a pagar é uma factura para mais tarde recordar, certamente com ignorância, analfabetismo e samba à mistura.

Aliás, basta perguntar aos portugueses qual foi o real benefício da realização da Expo'98 e do Euro 2004, cuja factura ainda está a ser paga pelos contribuintes, hoje, sem que tenha havido apuramento de responsabilidades em todas as trapalhadas e vigarices promovidas à sombra do Estado.

É caso para dizer: o dilema continua a ser sempre o mesmo, de um lado e do outro do Atlântico, seja ao ritmo do fado ou do samba.

sexta-feira, 18 de setembro de 2009

Quem tem medo das 'secretas'?

Os serviços de informações passaram a ser uma presença regular nos media, sempre pelas piores razões.

Desde a revolução silenciosa que o governo levou a cabo, a partir de 12 de Março de 2005, nunca tal se tinha visto no Portugal democrático.

As suspeitas de escutas ilegais na Presidência da República aí estão, em todo o seu esplendor, entre muitas outras, para atestar a gravidade da crise que se abateu sobre o regime.

Num dia triste para o jornalismo, em que fontes de informação são estampadas na manchete, as palavras de Aníbal Cavaco Silva, em Cascais, são a prova de que todas as dúvidas são verosímeis, apesar da própria declaração ser quase tão intolerável como o fundamento que a motivou.

E varrer uma situação tão complexa para debaixo do tapete enquanto o país vai a votos é a todos os títulos inacreditável.

Aliás, o sistemático adiamento de um apuramento cabal do que se está a passar nesta matéria apenas tem contribuído para o apodrecimento da Democracia.

A situação não é de hoje, nem de ontem.

Em 2 de Fevereiro de 2006, assinei um artigo, intitulado “A secreta oculta de Sócrates”, que o tempo tem vindo corroborar.

Passados mais de três anos, o que mudou?

Nada!

Os serviços de informações viram reforçados os seus meios e instrumentos de acção, sem o equivalente reforço do efectivo controlo democrático.

Para ser rigoroso apenas uma coisa mudou: o discurso de Francisco Louçã.

A mudança é surpreendente, pelo que impõe uma questão: O que sabe o líder do Bloco de Esquerda para fazer tais afirmações tão categóricas, que contrariam os indícios de vigilâncias e de escutas selvagens que têm vindo a ser denunciadas por jornalistas e até por magistrados?

O silêncio de uns e as piruetas de outros revelam até que ponto o regime está refém de um calculismo sem limites, em que os princípios parecem cair por terra ao sabor das expectativas.

No dia 27 de Setembro de 2009, é caso para perguntar: quem tem medo das 'secretas'?

sábado, 29 de agosto de 2009

PGR está acima da Lei?


Com mais ou menos humor e bandeira hasteada pela calada da noite, Portugal é uma República que pretende viver num Estado de direito.

Não há dúvidas em relação ao regime democrático, apesar das suas imperfeições, mas há incertezas quanto à força da Lei.

O Ministério Público não tem rei. E o procurador-geral da República não se pode comportar com tal.

Fernando Pinto Monteiro nem é monarca, nem é a Lei. Deve obediência à Lei.

Ao recusar, imperialmente, investigar a denúncia da Ana Jorge, ministra da Saúde, sobre os casos de contágio doloso da gripe A, Fernando Pinto Monteiro cavou ainda mais fundo o descrédito.

Mais de que um precedente grave, em que um responsável máximo se arrogou o direito de se substituir à Lei, é o atestado de um padrão de actuação, tristemente confirmado na delonga do anúncio da abertura de um inquérito no dia do acidente na Praia Maria Luísa ou nos ouvidos moucos às suspeitas públicas de escutas e vigilância aos assessores do Presidente da República.

Tal como no passado, o temor da hierarquia do Ministério Público em assumir inequivocamente o seu dever, em investigar implacavelmente os detentores do poder Executivo e os altos quadros da Administração, designadamente quando estão em funções, continua a ser um dos cancros da justiça.

O caso Freeport é, aliás, um dos mais escandalosos exemplos dessa atitude reverencial.

O rol de atrasos, hesitações, incúrias e trapalhadas só contribuem para arrasar ainda mais a credibilidade da justiça.

Salvo raríssimas excepções, como no inquérito ao caso de Santa Maria, nem a opinião unânime sobre o falhanço do sistema deu origem a uma mudança de atitude do topo da hierarquia do Ministério Público.

Não, o povo não é estúpido, quando alguns políticos a contas com a justiça são legitimados pelo voto popular.

É o sinal da desconfiança em relação à Justiça.

terça-feira, 18 de agosto de 2009

A força do voto

A jornalista São José Almeida assina a manchete do matutino "Público" – «Presidência da República teme estar a ser vigiada».

A notícia caracteriza na perfeição o actual clima institucional, político e social.

Na origem das suspeitas de membros da Casa Civil do Presidente da República estão umas afirmações avulsas de dois destacados militantes socialistas sobre a eventual colaboração de assessores presidenciais na elaboração do programa do PSD.

A denúncia não pode ser desligada da disciplina férrea que tem vigorado em relação a fugas de informação a partir de Belém e até deve de ser entendida no actual quadro de suspeição generalizada.

A crescente tensão entre Belém e São Bento, e o facto do primeiro ministro, José Sócrates, ser o responsável máximo dos serviços de informações, com poder para nomear o secretário-geral do Sistema de Informações da República Portuguesa, ainda torna a situação mais grave.

Infelizmente, não existe razão para a notícia ser uma verdadeira surpresa. Nos últimos quatro anos, a imprensa e os opinion makers têm dado conta do mal-estar crescente em relação ao funcionamento das 'secretas', o que lhes tem permitido escrutinar e duvidar da sua legalidade.

Não sei se José Sócrates e se o seu patrão das 'secretas', Júlio Pereira, se vão sentir ofendidos ou se vão avançar com uma queixa-crime. Ou até se vão exigir provas.

O que sei é que existe na Casa Civil de Aníbal Cavaco Silva quem coloca seriamente a possibilidade do Estado estar a vigiar ilegalmente o Estado para obter informações e vantagens políticas.

Muito mais grave do que a situação orçamental, a crise económica e o desemprego é esta permanente suspeita de que o Estado não garante as liberdades individuais, não respeita a cidadania activa e não castiga os abusos de poder.

Há razões de sobra para ponderar redobradamente o que se está a passar em Portugal, e agir em conformidade no momento de votar no dia 27 de Setembro de 2009.

quinta-feira, 13 de agosto de 2009

Erros com perdão

Mário Soares, num artigo de opinião, no Diário de Notícias, aponta baterias a Manuela Ferreira Leite, a propósito da polémica sobre as listas de deputados que vai levar a votos.

O raciocínio do ex-presidente da República é irrepreensível, mas peca por duas leviandades: a primeira, e mais óbvia, é a duplicidade de critérios; a segunda, é a de considerar um erro como irreparável.

Mário Soares não deveria apontar o dedo assim tão facilmente. O seu estatuto de Senador da República não nos apagou a memória.

Se há período da Democracia em que se consolidaram algumas das piores práticas ditas 'democráticas', sem qualquer dúvida que temos de regressar aos períodos em que liderou o governo e se instalou vigilante no Palácio de Belém.

De igual forma, e ainda que sem mácula apontada pela Justiça, o que dizer do seu erro chamado Rui Mateus, cujo livro «Contos Proibidos – Memórias de um PS desconhecido» está agora à beira de um clique na Internet?

Mário Soares ao escrever deve ter confundido o desejo com a realidade.

É verdade que numa democracia consolidada Manuela Ferreira Leite teria perdido as eleições no momento em que apresentou as listas do PSD. Tal e qual como José Sócrates não teria ganho as de 2005 e, com toda a certeza, não se atreveria a ir a votos em 2009.

Em Portugal, não há erros irreparáveis. Ainda não chegamos a tal apuro democrático e civilizacional de que, aliás, o fundador do PS é um exemplo vivo.

Hoje, o estado a que chegou a Justiça, a Educação e a Saúde, a falta de renovação na política e os casos de corrupção de "colarinho branco" são a melhor prova de que há erros que compensaram, e continuam a compensar.

quinta-feira, 30 de julho de 2009

Fuga em frente

O primeiro-ministro de Portugal está de cabeça completamente perdida.

Depois da derrota eleitoral nas eleições europeias, o chefe do governo desatou a disparar em todos os sentidos e a prometer tudo a todos, tentando esquecer um passado de quatro anos em que foi incapaz de cumprir as promessas eleitorais feitas em 2005.

Incapaz de digerir a derrota, e até de se remeter a um silêncio que lhe permitisse uma reflexão sobre os falhanços do governo, José Sócrates, na pele de chefe do governo e de secretário-geral do PS, entrou numa vertigem de iniciativas públicas dignas de uma verdadeira campanha eleitoral.

Sem tempo para pensar, os socialistas estão cada vez mais agarrados a um líder que quer garantir o poder a qualquer custo, dando uma imagem de pânico em relação a uma eventual nova derrota em 27 de Setembro.

Nesta deriva, imposta por uma enorme falta de sentido de Estado e por assessores e consultores incapazes de o aconselharem, quiçá mais interessados em garantir o futuro, José Sócrates foi novamente envolvido num caso, mais um caso – convite a Joana Amaral Dias para entrar nas lista dos PS a troco de lugares de Estado.

Depois do ataque certeiro de Francisco Louçã, que o acusou de tráfico de influências, José Sócrates e os seus ajudantes vieram a terreno desmentir, desmentir e desmentir.

Hoje, Paulo Campos, secretário de Estado adjunto das Obras Públicas e Comunicações, veio confirmar o convite, mas garantindo que «não deu conhecimento destes contactos pessoais e privados à direcção do PS, ao secretário-geral ou à federação distrital do PS de Coimbra, nem estava mandatado por eles para formalizar qualquer convite».

Já ninguém se admira com este tipo de fuga em frente, com este tipo de gente que governa o país.

O espanto, o que mais impressiona, é que ainda julgam que é possível voltar a enganar politicamente os portugueses.




terça-feira, 7 de julho de 2009

Responsabilizar

Em Novembro de 2008, antecipei o arquivamento do processo aberto para investigar os voos da CIA e o transporte de sequestrados por território português.

Fi-lo em plena consciência, na página 117 do livro «Voos 'Secretos' CIA – Nos Bastidores da Vergonha», decorridos mais de vinte meses após a abertura do Inquérito criminal.

Foi a minha maneira de alertar para a falta de rigor de um inquérito que se limitava ao ritual habitual com fim anunciado, sem mesmo garantir o respeito de atempadamente cumprir as exigências formais de uma investigação.

Não me enganei, como demonstrou o despacho de arquivamento, com data de 29 de Maio de 2009. E depois remeti-me ao silêncio, seguro que o tempo se encarregará de apurar a mentira e a ignominia.

Depois da tentativa de recolha acéfala de reacções ao conteúdo de 27 volumes, dos quais 24 relativos a apensos, o silêncio abateu-se sobre o processo.

A única pedrada no charco ocorreu ontem, durante a declaração da Eurodeputada Ana Gomes, que tomou posição sobre o despacho de arquivamento.

Ao optar por reclamar a reabertura do inquérito, apontando erros grosseiros e omissões inimagináveis, a Eurodeputada decidiu responsabilizar o Ministério Público. E, como referiu, das duas uma: ou houve incompetência na investigação do Ministério Público ou vontade política de enterrar o caso.

Certamente, muitos ficaram desiludidos por Ana Gomes não ter pedido a abertura de Instrução, pois ficaram impedidos de glosarem a partida para a 'guerra' em nome de mais uma causa, ao jeito de uma cruzada moderna.

Ana Gomes tomou a atitude certa e honrou um trabalho notável de dedicação e competência.

O Estado de Direito e os valores da Democracia não dependem só do empenho deste ou daquele cidadão. Por vezes, a melhor maneira de os defender é confrontar as instituições e os seus principais responsáveis com as suas decisões, por acção ou omissão, por mais toscas e descaradas que possam ter sido.

segunda-feira, 22 de junho de 2009

Portugal merecia mais

Conhecidos os resultados eleitorais de 7 de Junho passado, defendi que o primeiro-ministro deveria apresentar a sua demissão ao Presidente da República.

Ainda que a legitimidade formal para governar não tenha sido beliscada, a derrota nas urnas diminuiu a legitimidade política do governo para assumir em toda a plenitude a recta final do mandato que lhe foi conferido em 2005.

Além dos argumentos constitucionais e políticos, a devolução da palavra ao povo é sempre a melhor forma de clarificação em Democracia.

Manuela Ferreira Leite e Aníbal Cavaco Silva são cúmplices e responsáveis pela actual situação de impasse. Nem a líder do maior partido da Oposição, nem o presidente da República, quiçá por razões estratégicas, levantaram a voz contra mais um adiamento de Portugal.

Afastado o cenário da antecipação das eleições, o que se está a passar?

O país já caiu numa campanha eleitoral que vai durar mais de três meses.

Num momento em que são necessárias medidas de excepção para responder a uma crise interna e global também de excepção, a crescente paralisia governamental é evidente.

Os sucessivos anúncios de adiamentos das obras públicas e de reformas consideradas estruturantes são a prova cabal que o governo já está em gestão corrente.

E a infantilidade política de quem julga que a melhor forma de ultrapassar o desaire eleitoral é aliviar aqui e ali alguns traços de estilo e imagem revela que estamos á beira do pântano.

Pouco importa se a estratégia do primeiro-ministro lhe é política e pessoalmente favorável ou desfavorável. O que realmente importa é a forma desesperada como se está a agarrar ao poder, o que prejudica a governação e o futuro do país.

terça-feira, 9 de junho de 2009

Agarrado ao poder

De um momento para o outro, o país acordou para uma derrota estrondosa dos socialistas.

A vitória folgada ao PSD, apesar das sondagens indicarem o contrário, não é o facto mais relevante do resultado das eleições europeias.

O verdadeiramente relevante é a derrota da gigantesca máquina de propaganda da maioria.

Aliás, a decepção manifestada por José Sócrates na noite eleitoral é a prova que as principais vítimas da 'encenação' foram os seus próprios autores e mentores.

A cerca de três meses de um novo escrutínio, que vai decidir muito mais do que a governação para os próximos quatro anos, Portugal entrou numa espécie de twighlight zone em que a maioria no poder não corresponde ao sentimento do país real.

A única forma de sair desta situação passava por uma atitude de Estado de José Sócrates, isto é, pela apresentação da sua demissão na noite eleitoral, o que permitiria a convocação de eleições antecipadas.

Infelizmente, o actual primeiro-ministro não tem o estofo de estadista de António Guterres.

Incapaz de perceber o sentido do voto popular, José Sócrates agarrou-se ao poder com todas as forças.

A Democracia sai penalizada com este exemplo – mais um! – de falta de responsabilidade política e ética republicana.

O prejuízo para o país é evidente, pois vamos assistir a decisões governamentais, cujos efeitos ultrapassam o ciclo eleitoral, ao mesmo tempo que a Oposição clama por falta de legitimidade.

Num momento de crise excepcional, a nível interno e global, o país não pode perder tempo com um governo diminuído e com mais querelas partidárias. Nem tão pouco com o arrastamento de uma situação de paz podre que apenas vai permitir a triste exibição da máquina do poder em todo o seu esplendor.