O "cowboy" e o "self-made man" ainda continuam a fazer maioritariamente parte do ADN norte-americano?
As eleições presidenciais nos Estados Unidos da América são muito mais do que uma opção entre Donald Trump e Joe Biden.
É um momento de teste à alma americana que se traduz na escolha entre dois caminhos: a continuação da ruptura com o paradigma falhado ou o regresso do status quo em todo o esplendor.
Trump representa a continuação da luta contra os cânones de Washington, diabolizando a chamada imprensa de referência; Biden será a reedição de um modelo de governação em que o multilateralismo é temperado pelo marketing político e influência dos serviços secretos na política.
Depois de Obama ganhar com a força de "We Can", partilhando o Mundo com as outras superpotências, Trump quer renovar o sonho de hegemonia do "Make America Great Again" que continua a embalar os norte-americanos, enquanto Biden promete o moralismo de um aliado "Of the light, not the darkness".
E, goste-se ou não, deste lado do continente europeu, o errático Trump personifica melhor a imagem do "American way of life" que fez dos Estados Unidos da América a maior potência do mundo.
Mas esta eleição é também a renovação da "eterna" questão da emigração: por um lado, o fecho de fronteiras cruel; por outro lado, a alternativa de abertura para a exploração selvagem da mão-de-obra barata.
Também a questão racial pode, finalmente, fazer a diferença, numa realidade pós-Floyd, se ultrapassado o tradicional voto de abstenção ou em branco dos negros.
Para perceber o que está em jogo neste acto eleitoral, em que os latinos também podem sonhar, é preciso não esquecer a realidade de mais de 40 milhões de pobres, bem como de mais 140 milhões de cidadãos que admitem ter um rendimento insuficiente para pagar suas contas.
A vitória de Trump ou de Biden é ainda muito mais: de um lado, a arrogância da aposta na economia e no individualismo; do outro, a moderação que dá atenção à pandemia e ao colectivo.
Salvaguardas as devidas diferenças, a divisão brutal instalada não é assim tão diferente daquela que começa a emergir na Europa, decorrido quase um ano da descoberta da Covid.
No contexto de crise económica, os próximos actos eleitorais europeus também serão marcados por fracturas que ultrapassam a razão, a ideologia e a humanidade.
No país do consumismo, em que também se joga mais isolacionismo ou mais globalização, após muitos milhões de dólares gastos na publicidade de ambos os candidatos, fica para a História uma campanha de ódios, com "facts checks" para todos os gostos, ambições e carteiras.
O 46º presidente dos Estados Unidos da América tem uma herança: um país em que prevaleceram a força das instituições democráticas, o primado da Lei e a contribuição para a paz mundial.