Mostrar mensagens com a etiqueta Gouveia e Melo. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Gouveia e Melo. Mostrar todas as mensagens

domingo, 3 de outubro de 2021

NOVA GERAÇÃO DESEMPOEIRADA


É sempre útil conhecer a forma como os outros nos vêem.

O artigo assinado por Marc Santora e Raphael Minder, no The New York Times, sobre a pandemia e a vacinação em Portugal, tem ainda o mérito de sublinhar o conflito de gerações.

De um lado, Henrique Gouveia e Melo e Leonor Beleza, ambos representando uma geração mais velha e ainda marcada pelos tiques do autoritarismo do passado.

Do outro, Manuela Ivone da Cunha e Laura Sanches que representam uma nova geração urbana e escrupulosa das liberdades individuais.

Para os primeiros, o sucesso do plano de vacinação deveu-se à eficácia da linguagem militar, de guerra e até de disciplina, aliás, ancoradas num discurso bafiento contra os políticos.

Para as duas últimas, um registo totalmente diferente.

Manuela Ivone da Cunha, antropóloga, que lecciona na Universidade do Minho, constata o carácter ultra-minoritário dos "anti-vaxxers" portugueses, ao contrário de outros países europeus.

Laura Sanches, psicóloga-clínica, admite a falta de cultura de questionar as autoridades e o medo como os principais instrumentos para convencer os portugueses.

O artigo intitulado "In Portugal, There Is Virtually No One Left to Vaccinate" conseguiu tocar num ponto essencial: a mudança de ciclo.

À custa do contraditório inteligente, os jornalistas conseguiram retratar a saudável tensão existente na sociedade portuguesa.

E dar conta do debate interno em curso, entre protagonistas em fim de carreira e em ascensão.

É caso para dizer que há uma nova geração desempoeirada, no lugar certo, com capacidade de fortalecer uma perspectiva mais lúcida e exigente.

Num país que se sente cada vez mais confortavelmente europeu, os jovens estão mais interessados em ciência, transparência e informação credível do que na apologia e exibição dos camuflados.

A nova geração está a criar hábitos de questionar, não se deixando iludir pelos slogans castrenses ou pelas atitudes do Estado a roçar o autoritarismo.

Não abdicando de usar a própria cabeça para fazer perguntas, tantas e tantas vezes sem respostas, e de protestar, com argumentos válidos e pertinentes.

Santora e Minder conseguiram o que tanta falta tem feito à Comunicação Social portuguesa: observar, analisar, identificar e traduzir as questões e as partes, ter um olhar próprio e escapar à propaganda.


segunda-feira, 5 de julho de 2021

SNS DE CASERNA


A gratuidade e a universalidade do Serviço Nacional de Saúde têm gerado um gigantesco equívoco nas últimas décadas.

Como não implica pagamento imediato, mais taxa menos taxa, o cidadão tem tolerado abusos, desorganização, corrupção e até gritante falta de qualidade.

Como sempre sofre quem é mais pobre e tem menos influência e capacidade de reivindicação.

Em pandemia, a situação agravou-se ainda mais com milhões de consultas e milhares de cirurgias adiadas.

Mas o que era um facto só negado pela propaganda oficial passou a ser uma política de Estado assumida.

Gouveia e Melo, vestindo a pele do bafiento saudosismo militarista, anunciou o reforço do plano de vacinação à custa da qualidade da prestação do serviço.

O SNS de caserna está em passo de marcha.

Em boa verdade, não é a franqueza do vice-almirante que choca, mas sim o silêncio do presidente, do primeiro-ministro, dos deputados, em suma, da esmagadora maioria dos cidadãos.

Não podemos ir a um centro comercial, a um restaurante, a um bar, e até circular fora de horas, mas podemos ir para uma fila com centenas de pessoas, sujeitos a torrar ao sol, para sermos vacinados.

E, de notar, dizem que o plano de vacinação está a correr bem, ainda que sem divulgação de informação oficial que permita um escrutínio sério e rigoroso.

Agora, por um instante, imaginem se estivesse a correr mal…

A falta respeito pelos cidadãos, no SNS como noutros serviços públicos, é apenas mais um sinal da degradação do regime.

A constatação faz parte de todos os relatórios independentes, mas é preciso recordar que o SNS não é borla nem oferecido pelo Estado liderado pela Esquerda, é pago com os impostos dos portugueses.

O pior que nos podia acontecer, como tem acontecido com ou sem pandemia, é a confirmação de um SNS para os pobrezinhos agradecidos que comem, calam e lá vão cantando, rindo e morrendo.

Também vamos ter militares, com camuflados, de armas em punho, à porta dos centros de vacinação?