segunda-feira, 17 de agosto de 2020

BELÉM DE "CENAS" ARRISCADAS


Bravura, coincidência ou encenação políticas?

Da opacidade ao branqueamento só faltava mesmo um número do presidente nadador salvador, de duas jovens (muito sorridentes), apanhadas pela objectiva de uma televisão.

Qual será a próxima "cena"? 

Um presidente, com uma pá na mão, a extinguir um incêndio, enquanto corre, com as câmaras de televisão atrás, para apanhar o incendiário?

O cenário da praia do Alvor é um corolário perfeito, com cada vez mais portugueses a sentirem que é difícil engolir tanto oportunismo político.

Aliás, depois de Tancos, entre outros momentos graves, que mais tarde ou mais cedo serão esclarecidos, eram muitos aqueles que acreditavam que o putativo candidato não teria o atrevimento político de tentar renovar o mandato eleitoral.

Infelizmente, tal é a frenética actividade política em Belém, todos os sinais apontam para a fuga em frente.

Com a pré-campanha a ser feita à custa do erário público, as mais recentes posições institucionais que simulam um distanciamento político in extremis de António Costa são as cerejas que faltavam em cima do actual regime de faz-de-conta para os holofotes.

Restam poucos meses para destapar o véu que envolve o actual mandato presidencial, a começar pelo que realmente se passou no momento da declaração do Estado de Emergência por causa da pandemia Covid.

É um ponto de partida possível, durante a próxima campanha eleitoral das presidenciais, para esclarecer o padrão de muitas outras situações de opacidade.

Começa a ser patriótico a apresentação de novas candidaturas presidenciais, à Esquerda ou à Direita, para salvar o país deste bailete que tudo tem virado numa vacuidade nunca vista e perigosa.

Com os tempos difíceis que se avizinham, o país precisa de uma Presidência da República com força e credibilidade institucionais para travar qualquer arbítrio de um autoritarismo que espreita ao virar de cada esquina.

Com todos estes truques e rábulas, Portugal corre o risco de assistir, em Janeiro de 2021, a uma taxa de abstenção recorde e a uma expressiva votação nos extremos, uns porque consideram que está decidido, outros porque já não suportam mais do mesmo.

O estilo imposto por Marcelo Rebelo de Sousa até pode gerar uma sensação de transparência e de aproximação do poder aos cidadãos, mas as mistificações têm sempre um preço demasiado elevado.


segunda-feira, 10 de agosto de 2020

ESTRANHA ACALMIA ESTIVAL


Paira no ar a sensação de que a Covid já era ainda que continue a ser.

Apesar dos números aterradores que estão a chegar – infectados, mortes, desemprego, défice, dívida pública – o nosso tempo de Verão quente e tranquilo tem evitado o pensamento do frio Inverno cheio de ameaças que está a chegar.

A chuva de milhões da Europa eliminou os temores de perder a nossa vidinha cheia de chuto na bola, de passeios no shopping e de total alheamento e indiferença ao que se passa à nossa volta.

Como se o modesto essencial do dia-a-dia, infelizmente longe da mais elementar dignidade, fosse suficiente para viver, apenas sobrevivendo.

Entre tantas e tantas imagens brutais, a explosão em Beirute interrompeu por momentos a nossa sonolência colectiva.

A terrível luta de um país, cuja população tem sido massacrada pelos senhores da guerra e pela corrupção selvagem, é um alerta, mas apenas mais um.

A revolta tardia pode não ser suficiente para inverter o curso da História, porque se perdeu o músculo do escrutínio, da reivindicação e do exercício da cidadania ao longo de uma guerra civil de 15 anos (1975-1990), entre outras guerras.

Não é fácil enfrentar os abutres que levaram o Líbano para o ciclo infernal de viver e morrer às mãos do dinheiro fácil da guerra.

Tão-pouco é fácil afastar os outros abutres, hoje em versão de pombas da paz, que prometem ajuda para manter tudo na mesma.

Ainda assim, o pânico e a revolta, que a pandemia e o caos de Beirute fizeram despertar, estão a ser substituídos por uma estranha acalmia estival. 

Talvez fosse prudente reflectir também na nossa "guerra", quando estamos a perder a preciosa auto-estima às mãos de um regime político corrupto e anestesiante que já nem se dá ao trabalho de disfarçar as suas próprias contradições e iniquidades.

A vida não pode voltar ao normal da anormalidade a que já nos habituámos.

segunda-feira, 3 de agosto de 2020

PORTUGUESES ABANDONADOS À SUA SORTE


Uma boutade saloia da ministra da Cultura bastou para colocar o país mediático em polvorosa, questionando insistentemente Graça Fonseca se tinha condições para continuar no cargo.

Uns dias depois, ocorre o acidente com o Alfa Pendular em Soure que provocou duas mortes e dezenas de feridos.

E ninguém confrontou Pedro Nuno Santos com as suas responsabilidades.

O ministro das Infraestruturas e da Habitação continua em funções, abrigado pelo apoio do presidente da República, pelo silêncio cúmplice do primeiro-ministro e pela falta de independência da imprensa.

Tão ou mais grave ainda é que Marcelo Rebelo de Sousa faltou à verdade aos portugueses por mero calculismo político.

As conclusões preliminares revelam que a instalação de um sistema de segurança, recomendado em 2018, não foi implementado por «falta de cabimento orçamental», deixando em evidência a falta de segurança na ferrovia portuguesa.
 
Mais uma vez, o branqueamento presidencial é chocante, politica e institucionalmente.

E, infelizmente, o mais alto magistrado da Nação está mais preocupado com o seu futuro político do que em defender os portugueses da incúria governativa.

É mais uma cedência aos interesses eleitorais do putativo recandidato Marcelo Rebelo de Sousa que tudo tem feito para agradar ao PS, em detrimento da segurança dos portugueses e da exigível responsabilização política e até criminal.

O silêncio de António Costa não destoa nesta miserável farsa política em que o país está mergulhado.

Também pelas mesmas razões de mercearia eleitoral, António Costa, cada vez mais desgastado, sabendo o que tem pela frente, não quis comprometer o futuro político de um dos supostos sucessores à liderança dos socialistas.

O acidente do Alfa Pendular é mais um aviso trágico – entre tantos e tantos outros, por exemplo no SNS –, que passa sem escrutínio mediático, da Justiça e, agora, até político, com a oposição mergulhada na mais vistosa apatia.

Não há dinheiro para instalar um simples sistema de segurança na ferrovia, que poderia ter evitado o acidente de Soure, mas há dinheiro para enterrar no Novo Banco, na TAP e até avançar com toda a "gasosa" para outros negócios da China.

Vivemos tempos de um pântano de conivências e conveniências pueris, deixando os portugueses abandonados à sua sorte.

segunda-feira, 27 de julho de 2020

PANDEMIA: "BOMBAS" AO RETARDADOR



Continuamos a sorrir ainda que sabendo que em todo o mundo morreram 52 milhões de pessoas de fome ou de doenças causadas pela fome em 2019.

Hoje, ninguém se atreverá a adiantar como acabaremos em 2020 e nos anos seguintes.

Certeza só há uma: para mantermos o way of life, os governantes não podem continuar cinicamente a fazer de conta que não conhecem as condições de vida dos mais pobres e dos trabalhadores imigrantes.

É que a propagação, já de si exponencial, é ainda mais agravada entre todos aqueles que vivem em condições infra-humanas, económicas e sociais.

Já não basta viver num país rico ou num condomínio fechado, tentando esconder uma realidade que, afinal, todos conhecem e ignoram.

A existência de barracas, de exploração desumana e de exclusão associados a um sistema de saúde obsoleto e a transportes públicos medíocres deixaram de ser admissíveis porque não fazem parte de uma equação de futuro com esta ou uma qualquer outra pandemia.

Os governantes, sempre ao serviço de clientelas e dos mais poderosos, obviamente com um sorriso estampado e o discurso pio com os mais desvalidos, têm de passar a olhar para as desigualdades com olhos de ver.

Afinal, regalar os olhos com as luzes de Hollywood, estender a toalha na praia de Copacabana ou fazer de conta que Portugal é o litoral do turismo já não é mais possível e seguro, pois os surtos explodem em todas as latitudes onde impera a miséria.

Os 70 milhões de americanos a viver em condições de pobreza, os 11,4 milhões de brasileiros distribuídos por 6.329 favelas e ainda o facto de os imigrantes serem as principais vítimas (23,4% dos imigrantes infectados na região de Lisboa) exigem respostas prontas e eficazes.

A acefalia e o egoísmo generalizados, nutridos por uma globalização selvagem assente num consumismo desenfreado, têm os dias contados, pois ninguém admite viver durante muito tempo com máscara e medo.

E se a resposta tem de partir de cada país, também é verdade que a actual globalização não pode conviver com esta franja de potenciais "bombas" ao retardador.

Num contexto de pandemia, a "maioria", a tal que da Esquerda à Direita vive confortavelmente, não pode continuar a manter o seu status de vida com a actual realidade da "minoria" de pobres e imigrantes.

Num país que há séculos insiste em construir a casa pelo telhado, a chuva de milhões e milhões que vem da Europa é uma oportunidade única para reconstruir Portugal sobre pilares sólidos, a partir das infraestruturas básicas, da saúde, da educação e do combate à exclusão.

Os cenários macroeconómicos e os mega projectos já não são suficientes para manter um mundo de ilusões.

segunda-feira, 20 de julho de 2020

PERDIDOS NO LABIRINTO DE CONTRADIÇÕES


É cada vez mais evidente a geometria variável da governação.

O que é hoje verdade, amanhã é mentira, correndo o risco de voltar a ser verdade no dia a seguir e assim sucessivamente.

É tão assim em relação à pandemia, como aos princípios que orientam o regime democrático.

O discurso "pragmático" de António Costa em relação a Viktor Orbán até pode fazer sorrir alguns, mas envergonha um país inteiro.

E, para selar o impasse, só faltava mesmo o próprio líder do maior partido de oposição também estar de acordo que os tempos não são para exigência e respeito pelo Estado de Direito.

A "confissão" do primeiro-ministro revela um padrão de governação que nos tem atirado para um beco sem saída, pontualmente resolvido pelo Norte de uma União Europeia farta da pedinchice, corrupção e impunidade que têm minado os países do Sul.

Afinal, tudo se resume à flexibilidade da coluna vertebral, enfim, à geometria variável.

Vitória! – gritam eles –, quando chover mais um pouco de dinheiro.

Para trás, a governação e o discurso político erráticos que só podem dar origem a comportamentos diversos, casuísticos e oportunistas.

Aliás, não é por acaso que Marcelo Rebelo de Sousa ocupa a cadeira de Belém...

Não admira, portanto, que António Costa se aproxime do discurso de Bolsonaro e Trump  – temos mais casos Covid porque fazemos mais testes ou ainda a economia não pode parar.

Não há problema: fazemos de conta também que o Estado zela melhor pela nossa Saúde do que nós próprios.

Entretanto, existem milhares de portugueses sem opção nem protecção, pois têm de trabalhar para poder comer, correndo o risco de contrair o vírus apenas porque têm de utilizar os transportes públicos.

Mas há sempre uma solução criativa à medida: arregimentar um qualquer cientista ao serviço para demonstrar, com um estudo mal amanhado, que não há prova científica da relação propagação/transportes apinhados.

Também é assim em relação a tudo o resto, desde a Saúde ao SNS, desde a Justiça aos tribunais, desde a Educação às escolas, desde a Economia aos grandes projectos...

O recurso à geometria variável, com a Constituição na gaveta e tocando a bola em frente, é apenas o déjà vu, mais do mesmo.

Assim, de fait divers em "narrativa", lá vamos ignorando eleições e propostas, desconfiando dos políticos e regime democrático, empobrecendo cada vez mais, rumo a mais e mais miséria.

Perante a maior crise de sempre, a solução está sempre na geometria variável, sempre nas mãos dos outros.

O país e os portugueses continuam perdidos no seu próprio labirinto de contradições.


segunda-feira, 13 de julho de 2020

VALHA-NOS A EUROPA


A semana começa com o credo na boca.

Os olhos e os corações estão concentrados nas negociações europeias para a aprovação do Fundo de Recuperação.

A cimeira europeia dos próximos dias 17 e 18 de Julho vai decidir o nosso futuro.

Sim, dependemos totalmente da solidariedade europeia para comer e tentar respirar nos próximos anos.

Mais uma vez, Portugal, com os socialistas na liderança do governo, é apanhado com as calças na mão, desta vez por causa da pandemia.

Ninguém, mas mesmo ninguém, se atreve a colocar a hipótese de não haver um acordo que faça chover mais dinheiro.

Mas nem tudo são rosas.

A eleição do novo presidente do Eurogrupo, um desastre diplomático para Portugal, não é um bom augúrio.

Apesar do apoio alemão a Nadia Calviño – candidata apoiada por António Costa – foi o irlandês Paschal Donohoe que venceu.

Em tempos de pandemia, e com a Alemanha cada vez menos disponível para pagar os interesses de cada um dos países, algo está a mudar entre os 27 países membros da União Europeia.

E o inicio desta mudança surge precisamente no momento em que Portugal ultrapassou os 260 mil milhões de euros de dívida pública, o valor mais elevado de sempre.

Não estamos tão mal como a Itália, mas também não temos a força da economia italiana, nem poderemos contar com a ajuda da afundada economia espanhola liderada por um governo PSOE/Unidas Podemos.

E o sacrossanto binómio exportações/turismo está em reparação.

É neste contexto que o país tomou conhecimento do "plano" de António Costa e Silva, um documento vago e sempre ao serviço, que nos faz regressar ao passado da discussão do TGV, com um toque de "La Seda" da nova fronteira de produção de hidrogénio.

Já não temos desculpa, porque já vimos e pagámos este filme de terror demasiadas vezes.

E nem mesmo o anunciado plano estratégico para a década, desta vez do PSD, serve para sossegar os mais realistas.

E vai ser, novamente – temos de ter Fé! –, um valha-nos a Europa.

segunda-feira, 6 de julho de 2020

A "NOVA" VERSÃO DE TANCOS


O ambiente de medo e o cheiro nauseabundo das trapalhadas e das negociatas fazem lembrar o fim de mandato de Aníbal Cavaco Silva e José Sócrates.

E na última semana tudo se passou como se nada de extraordinário e grave tivesse ocorrido.

Estranho?

Não!

A presidência está transformada no bailete do Vira, o governo age sem responsabilidade ou receio de ser responsabilizado, o PSD liquida o principal instrumento institucional da oposição, grassa a subserviência, impera o fundamentalismo e falta o escrutínio.

O falhanço no combate à pandemia, a nacionalização da EFACEC e o reforço da posição do Estado na TAP, derrotas monumentais do governo de António Costa, são apenas mais três exemplos do padrão em que mergulhámos há muito tempo.

COVID-19: O aumento dos casos na área metropolitana de Lisboa, a escandalosa falácia de membros do governo sobre os transportes públicos, os desmentidos dos números oficiais de infectados e o "chumbo" do Reino Unido seriam suficientes para causar um terramoto político.

EFACEC: Depois de ignorar avisos, livros e até a queixa de Ana Gomes em Bruxelas, sobre a compra da empresa à luz da legislação europeia anti-branqueamento de capitais, António Costa anunciou a nacionalização (só faltou a imperial), expondo o Estado a mais um contencioso.

TAP: O falhanço da reversão da reprivatização e a assumpção de gigantescas dívidas quatro anos depois demonstram como o governo age sem responsabilidade política e não teme qualquer responsabilização da parte do PR, da oposição e demais entidades judiciais e de controlo.

Apesar de inquinarem o presente e representarem uma enorme ameaça tudo continua como se ninguém fosse responsável, nem mesmo pelas vergonhosas cláusulas secretas agora descobertas.

O desastre, a mentira, a incúria e o fundamentalismo ideológico passam entre os pingos da chuva de um país que começa a arder na indiferença até do anúncio oficial do regresso da censura.

Também fica a constatação de termos chegado, novamente, ao lodaçal que já experimentámos no passado com custos e consequências tão trágicas.

É caso para perguntar com toda a legitimidade: será que todos andam a enganar António Costa e Marcelo Rebelo de Sousa ou será que ambos andam a mentir ao país há demasiado tempo?

Até parece que voltamos a viver ao ritmo da saga de Tancos...





segunda-feira, 29 de junho de 2020

PATRIOTEIROS E FINGIDOS


O último governador de Macau, do alto da sua impunidade institucional, considerava maus portugueses aqueles que criticavam a administração portuguesa, numa espécie de versão cavaquista do então "deixem-nos trabalhar".

Não tarda nada, a propósito da Covid-19, ainda vamos assistir à mesma rábula tão típica de uma concepção do mundo paroquial em que, aliás, o secretismo e os apelos à união são tão-só uma tentativa infame de alijar responsabilidades.

Apontar os erros clamorosos, para não dizer criminosos, ao falhanço no combate à pandemia continua a ser, na lógica dos patrioteiros de algibeira, uma espécie de ataque ao interesse nacional.

Não importa a verdade, a realidade e o sofrimento de quem vive um dia-a-dia cada vez mais infernal com serviços de hospitais fechados e transportes públicos que mais não são do que uma via verde para ficar doente.

Apenas interessa a boa imagem de Portugal, como se fosse possível garanti-la, na era da informação global, com truques canhestros  e um "milagre" mal-amanhado.

E, assim, lá se vai inventando um bode-expiatório – ontem eram os mais velhos e hoje são os jovens , deixando cair até, preventivamente, o aviso de que não há espaço para uma crise política, tanto mais que a culpa é sempre dos outros.

Infelizmente, os patrioteiros e fingidos continuam impunes, apesar de comprometerem o futuro do país, fazendo gato-sapato de quem tem de enfrentar o vírus e recusa ser tratado como carne para Champions.

O resultado está à vista: debaixo dos discursos oficiais e da capa do Estado estão os números crescentes e assustadores de infectados em Portugal.

Aliás, o desnorte é tal que só faltava mesmo desvalorizar a interdição da entrada de portugueses em diversos países europeus, entre os quais alguns dos principais aliados.

Não valeu a pena tanta ficção, tanta lamechice, tanta opacidade, tanta sabujice política e tanta desonestidade intelectual.

A estratégia de passar verniz por cima dos problemas  a que despudoradamente já se chamou a extraordinária capacidade de improviso dos portugueses , revela até que ponto atravessamos momentos dramáticos e ameaçadores.

O presidente da República e o primeiro-ministro deviam meter a mão na consciência, reflectindo seriamente enquanto é tempo, pois o que o país precisa é de mais acção e menos palavreado, mais prevenção e menos bazófia e mais competência e menos incúria.

É que o nosso futuro não pode depender de patrioteiros e de fingidos.















segunda-feira, 22 de junho de 2020

JOVENS ACORDAM


Faço parte daqueles que acreditam que os mais novos são sempre uma esperança.

E nunca aceitei a tese simplista que os jovens vivem alheados da realidade social e política.

Por canais informais, e segundo os seus interesses, a juventude é atenta ao que se passa à sua volta, tanto mais que tem de lutar e aproveitar todas as oportunidades para ter um emprego condigno e aspirar a uma vida.

A verdade é outra: Há várias gerações de jovens que têm sido massacradas pelos desmandos do poder político e pelas sucessivas crises.

E, agora, subitamente, com a pandemia, passaram a alvo do poder institucional por assumirem simplesmente um comportamento em linha com os exemplos e as mensagens do poder.

É caso para perguntar: Será que as festas e os ajuntamentos dos jovens nos últimos dias são uma forma de dizerem ao poder presidencial, executivo e político que basta de tanto arbítrio e hipocrisia?

Ou melhor, estaremos face a uma espécie de statement de protesto?

Vale a pena esperar, ver e reflectir!

É que não é possível apagar as últimas "brincadeiras" de Estado, como as manifestações, as comemorações e os espectáculos com a "afável" cobertura do regime.

Aliás, os ajuntamentos em Braga e no Porto, a festa na praia de Carcavelos e o aniversário em Lagos não são suficientes para explicar o "milagre" de casos e mais casos na área metropolitana de Lisboa.

E as últimas ameaças do primeiro-ministro e do presidente da República dirigidas aos jovens, brandindo a intervenção das forças policiais para quem não se resigna com a ausência escandalosa de critérios, é a prova do desnorte que graça ao mais alto nível.

Aliás, veja-se só o último exemplo que deve deixar qualquer jovem (ou menos jovem) confundido: o espectáculo que foi brindado com a presença de Marcelo Rebelo de Sousa e António Costa no Campo Pequeno acaba de ser proibido no Porto.

Os mais jovens parecem não aceitar mais esta etapa do bailete, pelo que fazem questão de reunir desafiando a autoridade de quem tem vindo a perder toda a credibilidade. 

Mesmo sabendo que as "brincadeiras", sejam elas de quem forem, têm consequências, quando descobertas e expostas.

É preciso parar e ponderar, adoptando uma abordagem verdadeira, transparente, responsável, coerente e pedagógica, em vez de apresentar as últimas festarolas da juventude como reuniões de hordas de macacos.

À luz do comportamento dos principais órgãos de soberania, agentes do Estado e demais afins sempre disponíveis para tudo justificar seria possível esperar outro comportamento da parte dos jovens?

Não!

A pressão que está a ser feita sobre os jovens é injusta e descabida, porque o seu comportamento é apenas o resultado de um frenesi das autoridades apostadas numa espécie de campeonato da propaganda e do disparate.

Como sublinhou Miguel Poiares Maduro, «não somos os melhores do Mundo. Mas deveríamos querer ser! Para isso, temos de trabalhar a partir da realidade».

Os recados desesperados, as ameaças veladas e as perseguições cobardes são sempre a marca dos medíocres e dos fracos, incapazes de assumirem os seus erros e de estar à altura de um período crítico.

Há quem ainda não tenha aprendido que os tiques arbitrários e autoritários, bem como os truques e a opacidade, com mais ou menos descaramento, impunidade e corrupção à mistura,  mais tarde ou mais cedo acabam mal.

Os últimos que se julgaram donos-disto-tudo já bateram com os costados na cadeia ou ainda andam às voltas com a Justiça.

Ou como diria o outro: às vezes, com o tempo, o(s) macaco(s) empoleirado(s) na grande árvore dana(m)-se!



segunda-feira, 15 de junho de 2020

SNS: O BARATO SAI CARO


Enquanto não é concluído o mais que necessário Livro Branco sobre a COVID-19, chegou a hora de começar a fazer contas.

A sério!

Sem demagogias.

E sem olhar ao ruído da máquina da propaganda principescamente oleada com os euros sacados dos nossos bolsos.

Actualmente, sabemos que a crise da pandemia terá custado mais de 15 mil milhões de euros.

Também sabemos que mais de cinco mil mortos ocorreram em Portugal por causa do vírus, bem como devido à suspensão e cancelamento de consultas e cirurgias.

E mais: fomos amavelmente informados que os hospitais da Grande Lisboa voltaram a suspender consultas e cirurgias para acorrerem ao aumento de casos em curso que, extraordinariamente, não preocupam o governo desnorteado e a DGS cada vez mais descredibilizada.

A questão é simples: não teria ficado mais barato ter um Serviço Nacional de Saúde (SNS) capaz, bem apetrechado, com médicos, enfermeiros e assistentes em número suficiente?

Esta é a pergunta que governantes e governados deveriam estar a fazer, reflectindo para melhor poder responder no futuro a qualquer eventualidade.

Aliás, esta matéria até poderia e deveria já ter sido estudada pelos organismos da Saúde, incluindo a politicamente amestrada Escola Nacional de Saúde Pública, entre outros.

Mas, para já, apenas o vazio do silêncio.

Mais do mesmo!

Do governo e dos partidos da oposição parlamentar.

Com um SNS de excelência, o primeiro embate da pandemia poderia ter sido absorvido, dando tempo a uma preparação extraordinária para qualquer agravamento e a um confinamento ponderado e com critérios objectivos.

As contas públicas agradeceriam esta tão simples racionalidade e boa governação.

Porventura não estaríamos na actual situação de aflição, com consequências devastadoras que começarão a ser sentidas a partir de Setembro, nem totalmente dependentes das ajudas europeias.

Neste debate essencial, o que tem feito a imprensa?

Salvo raras excepções, pouco mais do que debitar teses e números oficiais e apanhar a boleia da especulação, do medo e da ignorância, julgando poder tirar dividendos, mais uma vez, sem sucesso, do jornalismo medíocre a que insistem em chamar light.

Ninguém aprende com os erros?

Não!

Tudo é possível, enquanto existir o chapéu caridoso da União Europeia, a dívida poder aumentar desenfreadamente, a máquina fiscal continuar a extorquir o lucro de pessoas e empresas e continuarem as mortes que poderiam ser evitadas.

Até haver uma verdadeira cidadania.







segunda-feira, 8 de junho de 2020

REGRESSO À (A)NORMALIDADE


A propaganda quer convencer-nos que estamos a regressar ao tempo em que não existia a pandemia.

Mas será, entre os sobressaltos na Grande Lisboa,  que estamos a falar de continuar a aceitar a (a)normalidade de 2019 em que morreram mais de 50 milhões de pessoas em todo o mundo por fome e pobreza?

De facto, pouco ou nada tende a mudar estruturalmente.

A Democracia continua a deixar para trás os mesmos de sempre: os mais pobres e aqueles que mais precisam de auxílio.

E, agora, também tem sido assim com as "ajudas" estatais tendencialmente dirigidas, com a Saúde cada vez mais desigual, com a Educação de faz-de-conta que liquida o elevador social e até com a indiferença quando a Justiça parou.

Os critérios opacos e de geometria variável são a sustentação desta "filosofia" da (a)normalidade que acalenta os amigos e os poderosos do costume ao mesmo tempo que propala uma mensagem de solidariedade para enganar os tolos.

E para credibilizar a léria, até garantem que serão precisos anos para regressar à tal (a)normalidade, ou seja o sacrifício de mais uma geração e atirar os pobres para o Banco Alimentar com direito ao afago da caridosa Jonet.

Face a esta realidade, o que faz o presidente da República?

Alimenta o bailete com umas tiradas tão mistificadoras quanto infantis e lá vai tomando umas banhocas com direito a directos televisivos e ao primetime.

E o primeiro-ministro?

Escolhe um gestor à socapa, garantindo-lhe mais de um mês de "liberdade de movimentos", para apontar o nosso futuro no espaço de uma década.

Dá que muito que pensar...

Com pandemia ou não, os tempos são sempre o espelho de atitude ou apatia, de escolha ou indiferença, de resiliência ou desistência.


segunda-feira, 1 de junho de 2020

ANTÓNIO COSTA E SILVA E O "PLANO"


Com a missão específica de coordenar a recuperação económica, com o dinheiro de Bruxelas que ainda não chegou e com a crise da COVID-19 ainda por debelar, o curriculum vitae e as primeiras declarações de António Costa e Silva são inquietantes.

O mais recente espécimen da nova casta que gravita à volta do primeiro-ministro, apesar de imediatamente endeusado pela maioria da imprensa, é uma escolha mais do que duvidosa.

Mesmo sendo pro bono!

Ser CEO da Partex, a petrolífera que foi controlada pela Fundação Calouste Gulbenkian, depois de passar pela Sonangol, não é o melhor cartão de visita para tão espinhosa missão de salvar Portugal do anémico crescimento de décadas e das garras da maior crise de que há memória.

A  opacidade e até secretismo do negócio do petróleo e a transacção com os tailandeses da PTTEP, sem esquecer a extraordinária "aventura" socialista da La Seda, também não devem deixar ninguém tranquilo.

De igual forma, ter o atrevimento de anunciar que fez um plano para dez anos em dois dias também não é a mais credibilizadora mensagem aos olhos dos cidadãos.

A lista de prioridades anunciadas também não: estradas, portos, energia e PME's.

Mais do mesmo...

O mais grave ainda é que, com o "milagre" anunciado pelo presidente da República a desmoronar, António Costa e Silva declarou que também quer um «investimento emblemático» no Serviço Nacional de Saúde.

Emblemático?

Mas, afinal, o que pretende o novo "conselheiro" de António Costa?

Uma pintura da fachada do "edifício" do SNS?

A sucessão de banalidades impressiona, mas a mais perigosa é defender a falsidade política que «esta crise mostrou que o papel do Estado tem de ser revalorizado».

A crise ainda está aqui, presente e avassaladora, estando longe de ter ficado demonstrado que a intervenção do Estado resolveu ou foi suficiente para o que quer que seja.

Fica a doutrinação gasta, aliás desmentida pelos anos e anos de desvario estratégico que nos conduziram a um subdesenvolvimento crónico e a uma dívida gigantesca que condiciona o futuro das próximas gerações.

Só faltava mesmo o ramalhete de quem também acredita que é no mercado e nas empresas que está o «cerne da resposta».

No meio de tempos tão conturbados, cujas consequências ainda só agora começam a ser ligeiramente visíveis, este "arranque" em direcção ao futuro impressiona pela vacuidade e sinais contraditórios.

Bem fez o líder do PAN, o primeiro a dar uma nota dissonante nesta "curta" fantástica, ao anunciar que não tem nada a falar com o "homem do petronegócio".