segunda-feira, 29 de julho de 2024

WATERGATE EM PORTUGAL



Após a “reeleição” de Maduro é útil recordar que os dois mandatos de Marcelo Rebelo de Sousa têm sido pautados por escândalos públicos (institucionais, políticos e pessoais) como nenhum antes anteriormente dos seus seis antecessores.

Interferência institucional abusiva, a reinterpretação constitucional à la carte e agora a suspeita generalizada de favorecimento fazem parte de um rol de atropelos.

Do servilismo a Angola (Manuel Vicente), ao roubo em Tancos, duas humilhações públicas respectivamente de magistrados e de militares, está instalada a percepção que a actuação presidencial roça a arbitrariedade.

Mais grave ainda: no caso do Hospital Santa Maria tudo se tem passado à vista de todos, na CPI das gémeas, fora das negociatas de bastidores.

Ainda assim, por razões de guerrilha partidária tudo tem sido mais ou menos contido por aqueles que lutam pela sobrevivência de favor.

Na audição de Maria João Ruela, assessora de Belém, todos os limites foram ultrapassados.

«O mail está aqui!», garantiu, para corrigir no minuto a seguir, depois de um extraordinário ofício-relâmpago de Belém: «É porque não existe, porque entretanto foi apagado, em cinco anos».

Face às contradições, a imprensa desvaloriza, não investiga, qual atitude de Estado, confortada por aqueles que as rotulam como coincidências, intendências ou questões administrativas sem importância.

Afinal, qualquer comissão parlamentar de inquérito é ameaça ao bafiento status quo que tem levado os Media à pré-falência financeira, fruto do distanciamento dos cidadãos e de menos leitores, ouvintes e telespectadores.

O “Watergate” seria possível em Portugal?

Dificilmente, com esta imprensa domesticada, salvo honrosas excepções, pois não faltaria quem garantisse a priori que o assalto era culpa dos vigilantes ou por(ventura) da obra do diabo.

segunda-feira, 22 de julho de 2024

MUNDO À BEIRA DO IRREVERSÍVEL

 

A disputa eleitoral nos Estados Unidos da América está a fazer luz sobre o maior paradoxo dos nossos tempos.

Além da argumentação dos fanáticos importa distinguir entre a realidade e a propaganda: o próximo presidente da maior super-potência vai continuar a implementar a agenda do “New American Century”?

A questão é da maior pertinência, pois a esquerda norte-americana (Clinton, Obama e Biden) tem executado acefalamente o projecto de liderança mundial dos “neocon”, delineado a partir de 1997, pelos herdeiros de George H. Bush.

A afirmação do Papa Francisco – «A palavra negociar é uma palavra corajosa» –, proferida em Fevereiro passado, não conseguiu romper as certezas e os fundamentalismos.

Não é preciso recordar a entrevista de Jeffrey Sachs para constatar o que os Media e o mainstream têm desvalorizado e até omitido.

A visão do economista, que conduziu a abertura económica de alguns países de Leste, após o fim da URSS, ignora a soberania, o povo e os ditadores sanguinários, mas questiona a paz no mundo à luz dos expansionismos e da força das secretas.

Se nada justifica qualquer branqueamento de Vladimir Putin, então chegou a hora de também admitir que este é o mundo à beira do irreversível, da adesão da Ucrânia à NATO e da III guerra mundial.

Compreende-se melhor a tirada de Donald Trump sobre acabar com a invasão da Ucrânia em 24 horas, se atentarmos à neutralidade do país liderado por Zelensky.

Joe Biden nunca foi a solução, como comprova o double standard em relação ao genocídio em Gaza.

Esta esquerda do século XXI não é confiável, nem cá nem nos states, porque o dogmatismo ideológico associado ao pragmatismo oportunista é tão ou mais incerto que um qualquer aventureiro no poder.

Enquanto a Europa afunda na irrelevância, Donald Trump ou Kamala Harris têm de enfrentar o pesadelo das armas.

segunda-feira, 15 de julho de 2024

FIGHT! FIGHT! FIGHT!


Num mundo em que se mata e manda matar impunemente, às ordens dos Estados ou de um qualquer radicalismo doentio, o atentado contra Donald Trump corre o risco de ser apenas mais uma notícia condenada ao esquecimento.

Tratando-se de um lamentável e isolado acto selvático, ou de uma conspiração, a verdade sobre o que aconteceu na Pensilvânia está longe de poder ser garantida.

Os cidadãos estão cada vez mais vulneráveis em relação à loucura de quem manda, democraticamente ou não.

O noticiário diário da selvajaria tolerada, seja na Ucrânia, Gaza ou noutras latitudes, revela até que ponto a violência feroz e gratuita nos está a atingir.

Para já, apenas uma única certeza: a grosseria do erro dos serviços de informações norte-americanos, voluntária ou involuntária, está à vista.

Esta conjugação de factores deveria levar a uma séria reflexão sobre as condições que estão na origem de tanta aventura imperialista e expansionista, de tanta fúria social, de tanto extremismo no discurso e combate político.

Certamente, pouco ou nada vai mudar na ordem internacional, nas condições de vida dos indivíduos e na lei da selva que impera entre governantes e políticos, mantendo-se a impunidade dos mais fortes.

A tentativa de assassinato de Donald Trump não difere muito dos atentados planeados para Alexei Navalny ou Julian Assange, entre outros, porque os serviços de informações continuarão a ser à prova de qualquer escrutínio, um poder acima do Estado.

Depois do folclore habitual, de teorias e mais teorias, da condenação das redes sociais, de votos pios e apelos à moderação da parte dos incendiários, de um lado e do outro, resta a memória do grito: Fight! Fight! Fight!

segunda-feira, 8 de julho de 2024

PODER POLÍTICO SEM SOLUÇÕES


A derrota estrondosa de Marine Le Pen não pode desvalorizar a duplicação de mandatos, o que explica que tenha afirmado que a «maré está a subir».

Qual ingenuidade, para escapar a um extremo dá-se a vitória ao outro extremo, à esquerda, com Jean-Luc Mélenchon a puxar pelos galões da representatividade.

Não há qualquer dúvida: os últimos 20 anos foram um tempo perdido.

Voltámos ao início do século, em que o princípio do suposto mal-menor continua a baralhar os cidadãos – António Guterres/ Durão Barroso, Santana Lopes/ José Sócrates, António Costa/ Rui Rio ou Luís Montenegro/ Pedro Nuno Santos.

O voto já não é por razão, convicção e futuro, mas uma mera reacção às alternativas artificiais e de circunstância em cima da mesa.

Será esta a solução democrática do século XXI?

Do mal, o menos, assim vai a vida nas democracias ocidentais, afundadas na falta de racionalidade, na geometria variável, na exclusão social crescente e na exploração da imigração ao nível dos tempos das cavernas.

Eis a forma de perpetuar o poder que vive na sombra, porque lhe permite manter a força, os interesses e os objectivos, sejam quais forem os vencedores e os vencidos.

O paradoxo está à vista, sem um vislumbre de estadistas.

Menos mau, as ditaduras são ainda piores.

À mercê das grandes corporações, os líderes políticos obedecem, ajoelhando, limitando-se servilmente a garantir mais e mais mecanismos de controlo dos cidadãos.

O status quo, cada vez mais precário, fomenta o impasse, cujo expoente é a onda brutal de guerra e mais guerra.

O pragmatismo, a globalização selvagem e a corrupção continuam a ser a tripla do poder político sem soluções para sociedades que se contentam com a miragem da liberdade, igualdade e fraternidade.

segunda-feira, 1 de julho de 2024

CAVACO SILVA: NINGUÉM O CALA

 

Os resultados das eleições francesas comprovam que a liberdade, a justiça social e a política de imigração são muito mais do que slogans estafados, nalguns casos de um cinismo político ultrajante.

A direita mais à direita está a conquistar o que resta da velha Europa, país a país, por mais que se grite aos sete ventos que o cataclismo está ao virar da esquina.

O que se segue?

O rasgar das vestes, mas sempre a afagar a mesma política velha, deixando os mais desvalidos na pobreza envergonhada ou nas ruas.

O folclore institucional é repetido, falhanço após falhanço dos "estadistas", dos "moderados", daqueles que andam há décadas a mentir descaradamente, e agora apontam o dedo a quem está à beira do poder.

Sempre com a propagada dos papões e os perigos na boca, com ou sem uma "grande união", certamente doce, são os que mais parecem palhaços acossados ainda a mandar.

As pessoas estão fartas, querem soluções, não querem mais acordos secretos, mais palavras de ordem e promessas vãs, mais planos para consumo do jornalismo cada vez mais falido.

A bola e a selecção lá servem para desviarem as atenções e animarem as hostes, rivalizando com a triste rábula de António Costa no Conselho Europeu, uma "proeza" que os líderes europeus lá deixaram passar.

Fica a vergonha alheia de quem assiste a mais este "milagre" tolerado por um poder instalado na União Europeia que engorda ao ritmo da crescente crise e descredibilização.

Tudo pela Ucrânia, faz-de-conta que a Palestina não existe.

Acudam, o populismo radical venceu em França – gritam os hipócritas do costume instalados à mesa do poder.

Passados 90 dias da tomada de posse de Luís Montenegro cresce a percepção que nada vai mudar, nem mesmo no caos que reina nos serviços públicos, antecipando a confirmação de um crescimento anémico e mais uma crise.

Se importa olhar lá para fora, porque há quem não enxergue o cancro instalado em Belém, mais importa ainda sublinhar que Aníbal Cavaco Silva percebeu atempadamente que é fundamental não deixar morrer a esperança.

Ninguém o cala.