segunda-feira, 24 de junho de 2024

CASO SANTA MARIA: DE APAGÃO EM APAGÃO



O caso do Hospital Santa Maria é muito mais do que duas crianças gémeas que precisaram de ser tratadas.

A audição parlamentar de Daniela Martins incomodou sobretudo aqueles que convivem harmoniosamente com a ficção imposta pelo poder político e mediático.

É a realidade dantesca, é a teia de influências silenciosa e subterrânea que tem minado o país.

É a evidência que corrobora o abuso e a prevaricação, tanto mais que nenhum dos intervenientes admite que se conhece.

Ora, se tivesse sido apenas um simples acto humanitário, desinteressado e legal, o normal era que todos tivessem falado com todos, e que o admitissem.

Sandra Felgueiras percebeu, desde o início, a farsa alimentada pela presidencial cautela de plástico.

Não falta, posteriormente, quem o tenha denunciado, inclusivamente no sítio certo, como a juíza Gabriela Assunção, afirmando que os comportamentos de Marcelo Rebelo de Sousa não foram neutros.

Através da procuradora Helena Almeida – a mesma que arquivou o “apagão fiscal” denunciado por Fernando Rocha Andrade –, Marcelo Rebelo de Sousa escapou, por ora, a uma investigação criminal.

Ironia das ironias: na semana em que choveram acusações sobre Lucília Gago nem uma única crítica sobre esta decisão do Ministério Público relativamente ao caso do Hospital Santa Maria.

A calamidade é de tal monta que é José Sócrates que vem a terreiro falar de miséria moral, para classificar o tratamento concedido às violações do segredo de justiça em relação às operações Marquês e Influencer.

Com se todo este desnorte não fora suficiente, as urgências hospitalares continuam a fechar.

Luís Montenegro, pela mão de Rita Júdice, ministra da Justiça, anunciou mais um plano anti-corrupção virtual.

Nem as promessas eleitorais contam, o que importa é anunciar mais um plano.

No poder ninguém cora de vergonha, quais faladores, fazedores e estadistas de pacotilha, mais ou menos 60 dias depois, de apagão em apagão, sempre com Bruxelas à vista.



segunda-feira, 17 de junho de 2024

ANTÓNIO COSTA MERECE MAIS


O ambiente não deixa dúvidas: a corrupção está instalada, e continua a minar o país e as gerações futuras.

Ana Paula Rosa, juíza que presidiu ao colectivo que condenou Manuel Pinho e Ricardo Salgado, no caso EDP, não teve qualquer pudor em falar de «corrupção desenfreada».

Neste cenário, não surpreendeu a notícia de troca de favores, contratos e dinheiro que envolveram Domingos Andrade, jornalista, e Eduardo Vítor Rodrigues, autarca socialista de Gaia.

Nem as relações entre informação, política e negócios escapam, e a procissão ainda não saiu do adro.

É neste quadro que o Bloco Central avançou, a todo o hidrogénio, com a campanha para a escolha de António Costa para a liderança do Conselho Europeu.

Nem o facto de o ex-primeiro-ministro ter apresentado a demissão, imediatamente, por suspeita de prevaricação, parece atrapalhar, cá dentro, companheiros e adversários políticos.

O mais extraordinário, a par das múltiplas profissões de fé, é não haver uma única palavra sobre a eventual violação do segredo de justiça.

Nada, é como se a Justiça estivesse ao serviço, como se o Ministério Público não existisse, aliás até já é alarve e politicamente abonado que a questão está arrumada.

É como se os procuradores João Paulo Centeno, Hugo Neto e Ricardo Correia Lamas (DCIAP) e José Duarte Silva (STJ), entre outros, já tivessem passado à condição de capachos dos políticos.

Não vai ser preciso muito tempo para saber se Lucília Gago se colocou ao serviço de alguns partidos políticos e do Estado ou se cumpre, até ao fim do mandato, a tutela do princípio da legalidade.

António Costa merece mais, não pode ficar associado ao tratamento especial da Justiça, à celeridade que não está ao alcance dos seus concidadãos ou à capitulação da Procuradoria-Geral da República.


segunda-feira, 10 de junho de 2024

GENTE NOVA QUE FAZ POLÍTICA VELHA



O PS conseguiu vencer a nova aliança de direita que lidera o país, mesmo com rostos que saíram do anterior governo por indecente e má figura.

A Iniciativa Liberal é o segundo grande vencedor, por força da mobilização da irreverência, reconhecida por todos, emprestada por uma equipa que faz verdadeiramente jus a ser jovem.

João Cotrim Figueiredo ganhou dois eurodeputados, mesmo num país em que a maioria continua a acreditar que o Estado é o Pai Natal.

A aposta da AD na juventude, que serviu de mote para um enlatado à pressa para cabeça-de-lista, uma parada de casino, não chegou para evitar a derrota por pouco, politicamente tão significativa como o voto das legislativas.

O resultado eleitoral permitiu ainda descortinar um cartão amarelo ao Chega, proporcionando-lhe o primeiro grande tombo, quiçá a factura da caminhada de André Ventura ao lado de Pedro Nuno Santos no Parlamento.

Entre os outros derrotados, o Bloco de Esquerda e o PCP conseguiram escapar à humilhação política, elegendo um eurodeputado cada, muito por força da experiência de Catarina Martins e João Oliveira.

Quanto ao Livre, o falhanço pesa.

Passados mais de 60 dias do Executivo em funções ficou claro que os portugueses ainda confiam no PS para gerir os interesses do Bloco Central.

Por sua vez, Luís Montenegro ficou a saber que é preciso muito mais do que um novo rosto e uns toques ali e acolá, tanto em Portugal como para a Europa.

Feitas as contas, internamente, a mensagem é cristalina: não chega gente nova que faz política velha.

Em suma, em termos do novo Parlamento Europeu: as tradicionais famílias políticas (centro-direita e socialistas) garantiram as rédeas do poder, com Verdes e Liberais em perda, mas a alternativa da extrema-direita deu um novo passo em frente.



segunda-feira, 3 de junho de 2024

IMIGRANTES ABANDONADOS


Em cinco décadas, os imigrantes em França passaram de 6,5% (1968) para 10%.

São mais de 50 anos de debates marcados pela bandeira das liberdades, enquanto o crescimento dos “bidonvilles” e a insegurança associada à imigração faziam caminho.

O paradigma liderado pelo PS francês só foi alterado em 2023, com uma lei restritiva aprovada com o apoio do bloco de Emmanuel Macron, do principal partido de direita “Les Républicains” e da extrema-direita do “Rassemblement National”.

Os exemplos de Portugal e França não são únicos, mas traduzem o mesmo padrão: o laxismo de uma certa esquerda, conivente com a exploração e a degradação das condições de vida dos imigrantes, enquanto enche a boca com os direitos humanos.

As terríveis experiências dos emigrantes portugueses não nos serviram de lição, nem evitaram a repetição dos mesmos erros dantescos de outros países de uma Europa cada vez mais velha, corrupta e cínica.

Fazer face ao envelhecimento e satisfazer a gula desenfreada por mão-de-obra barata justificaram os populismos internos descaradamente desumanos, aliás só possíveis com a crise da imprensa e Marcelo Rebelo de Sousa em Belém.

Na véspera de eleições europeias, o debate sobre a imigração está instalado, com o número de imigrantes a atingir o patamar dos dois dígitos em Portugal, no quadro do crescimento da extrema-direita.

As centenas de milhares de imigrantes sem resposta da AIMA são apenas a ponta do iceberg de um problema gigantesco, em que se destacam a escravatura laboral e os sem-abrigo.

A legislação do governo liderado por Luís Montenegro, designadamente a imposição de um visto de trabalho para os novos imigrantes, é a primeira tentativa de travar a permissividade politicamente criminosa que deixou os imigrantes abandonados.

A actual irrelevância política do PS francês é um sério aviso ao PS português e demais esquerda portuguesa.